Por Clênio Sierra de Alcântara
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Fotos: Ernani Neves |
Assim que deixamos Alagoa Grande, começamos a subir a Serra da Borborema - vencendo dezenas de curvas de uma estrada que exige bastante perícia e atenção do motorista - para chegarmos à cidade de Areia, que está situada a mais de 600 m de altitude acima do nível do mar; que dista a cerca de 126 km de João Pessoa; e cuja localização nos põe frente a frente com a lógica da ocupação urbana promovida pelos portugueses nas terras americanas.
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O casario bem conservado é um dos atrativos da cidade |
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O trabalho de Cacio Murilo é instigante |
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Aqui estou no aguardo do meu almoço |
Como passava do meio-dia e estávamos morrendo de fome, atravessamos a cidade em busca de um restaurante; e acabamos nos refugiando no agradável e aconchegante Bambu Brasil, que fica numa charmosa e convidativa pousada - a Pousada Villa Real. Nos corredores podiam ser vistas belas fotografias de uma exposição do Cacio Murilo engenhosamente intitulada "Fauna vegetal". Esse trabalho do Cacio é de uma riqueza de percepção incrível. É realmente obra de um artesão do olhar.
Contemplar a vastidão da paisagem enquanto se saboreia a comida do Bambu Brasil é uma experiência que faz com que agucemos todos os nossos sentidos. Muito gostoso estar ali.
Deixando a pousada começamos de fato a vivenciar a cidade de Areia, percorrendo suas ruas repletas de história.
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Redário da Pousada Villa Real |
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Em Areia o casario histórico tem múltiplos usos: residências, comércio, centros culturais, repartições públicas |
Fiquei fascinado em ver um casario que, ao menos em sua forma exterior, estava muito bem conservado. Areia possui um conjunto arquitetônico que diz muito da pujança econômica que a cidade teve em tempos idos. Para se ter uma ideia da dimensão que teve e tem esse lugar para a história paraibana e brasileira é preciso que se diga que o povoado foi elevado à categoria de vila em 18 de maio de 1815, com o nome de Vila Real do Brejo de Areia; e à de cidade em 18 de maio de 1846, já com o nome que hoje ostenta - em comparação, o Recife foi reconhecido como vila em 1709; e como cidade em 1823.
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Solar de José Rufino |
Muito acertadamente o Iphan reconheceu o conjunto histórico, urbanístico e paisagístico de Areia como Patrimônio Cultural Nacional, em 2005. Além de uma representação do Iphan, a cidade conta ainda com uma denominada Associação dos Amigos de Areia (AMAR), que unem forças para preservar essa verdadeira joia incrustada no brejo paraibano.
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Teatro Minerva |
Não entramos, porque os encontramos fechados, mas passamos pelo Teatro Minerva - o primeiro erguido na Paraíba, em 1859 -, pela Igreja de Nossa Senhora da Conceição, pela Igreja do Rosário dos Homens Pretos e pela vistosa Escola Ministro José Américo.
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Igreja do Rosário dos Homens Pretos |
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Pátio interno do Solar de José Rufino |
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O coreto em forma quadrada |
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Igreja de Nossa Senhora da Conceição |
Areia é a terra natal do escritor José Américo de Almeida, autor de
A bagaceira, que, além de ministro, foi também governador da Paraíba; do historiador Horácio de Almeida; e de ninguém menos do que o talentosíssimo pintor Pedro Américo, autor do quadro "Independência ou morte" (1888), que povoa o imaginário nacional uma vez que ilustra praticamente todos os livros didáticos de História do Brasil com sua visão idealizada do local e dos personagens que participaram do episódio do famoso "grito do Ipiranga" protagonizado por Dom Pedro I, conforme a análise da professora Cecíclia Helena de Salles Oliveira no artigo "A invenção do grito" (
Revista de História da Biblioteca Nacional, ano 1, nº 5, novembro de 2005, p. 67-71).
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Museu Casa de Pedro Américo |
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Parte de trás do Museu Casa de Pedro Américo |
A casa onde nasceu e passou a infância esse ilustre areiense foi restaurada e transformada no Museu Casa de Pedro Américo. Visitamos o local; fomos recebidos pelas simpáticas senhoras Terezinha Pereira e Lindalva de Brito. Ali foi onde adquiri o muito bem escrito e ilustrado livro infanto-juvenil
Cidade de Areia: Patrimônio Cultural, da Edilene Cardoso, que me deu muitas e preciosas informações sobre a história desse lugar incluindo esta: Areia foi a primeira cidade da Paraíba a promover a libertação dos escravos, em 3 de maio de 1888.
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A Célia Raimunda é uma danada. Adorei a surpresa |
Localizado num ponto bem estratégico do centro histórico, do qual se avista um amplo espaço daquela parte da cidade - defronte dele há uma pracinha com um inusitado coreto de forma quadrada; até então eu só conhecia os de formato circular -, o Solar de José Rufino é um edifício majestoso. Tudo nele está bem conservado; e é nele que estão instalados a superintendência do Iphan e o Ponto de Cultura Viva o Museu. Quem nos guiou por todas as suas dependências foi a Célia Raimunda, uma senhora encantadora que tinha nomes, datas e acontecimentos na ponta da língua, uma verdadeira enciclopédia ambulante. Célia nos disse que o Solar funcionou primitivamente como morada de um rico senhor de engenho - ela nos mostrou algo que eu nunca vira até então: senzalas urbanas, que eram como pequenas celas, e estão localizadas na parte do prédio onde existe um pequeno pátio. Ah, amigos leitores, parece que é proposital; parece que a Célia Raimunda guarda aquele instante quase sublime como
le grand finale do passeio pelo interior daquela casa. A certa altura ela nos disse assim - ao mesmo tempo em que abria um imenso portão de madeira -: "Quem morava aqui ainda tinha direito a essa vista". Caros leitores, quando percebemos a imensidão do vale enchendo os nossos olhos a sensação que nos toma - pelo menos foi isso o que aconteceu comigo - é de um prazer indescritível. Ainda hoje aquela imagem e aquela sensação me perseguem provocando em mim vez por outra um pequeno êxtase. Foi maravilhoso aquilo. Eu quase dizia que foi uma epifania.
Não conheci - felizmente! - a cidade de Areia em seu corpo inteiro, o que enseja um convite para que eu para lá retorne. Areia foi uma das melhores coisas que me aconteceram neste ano que eu anunciara que seria para mim um ano de grandes conquistas. Foi estupenda a magia do encontro. Foi por demais vigoroso o prazer da descoberta. Areia é um encantamento dentro de outro.
Tive o prazer e a honra de morar nessa maravilhosa e histórica cidade, no período de Julho de 1976 a Dezembro de 1984, quando voltei a residir em Recife. Mas, quem visita esse paraíso não o esquece já mais e fica sempre se sentindo meio que filho dela. Moacir Cordeiro
ResponderExcluirAgora estou com vontade de conhecer Areias. Por que não postou a paissagem que se vê da Casa de José Rufino. Foi proposital?
ResponderExcluirAnco Márcio Tenório Vieira