30 de janeiro de 2012

Analfabetismo: ainda uma vergonha nacional

Por Clênio Sierra de Alcântara




Quem convive de perto  com uma pessoa analfabeta, entenderá bem a situação que descreverei aqui. Há anos convivo diariamente com uma avó materna - Maria da Conceição; mais de oitenta anos de vida - que não consegue ler uma palavra sequer. Embora tenha tomado lições em uma turma do MOBRAL (Movimento Brasileiro de Alfabetização, uma iniciativa dos próceres da Ditadura Militar), ela não conseguiu nem ao menos aprender a "desenhar" o próprio nome; fato este que fiz questão de destacar num texto publicado pelo Correio Braziliense, em dezembro de 2005, no qual era evocada a figura do educador Paulo Freire.



Por mais que os órgãos oficiais propagandeiem exaustivamente os "inúmeros progressos" por que passa o país, o fato é que esta nação adentrou no século XXI carregando ainda uma de suas mais vergonhosas chagas: um contingente ainda muito elevado de cidadãos analfabetos.

De acordo com os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), referentes ao ano de 2009, divulgados pelo IBGE, o Brasil abriga em seu "berço esplêndido" 14,1 milhões de pessoas com 15 anos ou mais que não sabem ler e nem escrever, o que equivale a 9,7 % da população; estando a maioria delas - em todas as faixas de idade pesquisadas - nos estados nordestinos, o que por si só diz muito do fato de o Nordeste ser a região mais pobre do país.

Desoladora sob qualquer ângulo que seja examinada, essa elevada taxa de analfabetismo expõe cruamente o paradoxo brutal do tipo de desenvolvimento social que o país atravessa. Levadas a reboque, na roda-viva dos acontecimentos, essas pessoas não conseguem ter plena capacidade de entendimento nem de si e muito menos do pequeno mundo no qual habitam. De certa maneira, quem é incapaz de ler o rótulo de um produto no supermercado ou uma bula de remédio, de identificar o destino num letreiro de um ônibus ou de assinar o próprio nome, vive como que apartado da sociedade, uma vez que não consegue compreender a maioria dos seus signos.
Infelizmente as políticas públicas não têm conseguido fazer com que os índices elevados de analfabetismo das diversas regiões decresçam num ritmo considerável. E se sozinhos esses 14,1 milhões de "cidadãos" já são um espanto, a situação se agrava um pouco quando se tem em conta que um em cada cinco brasileiros é analfabeto funcional. Analfabetos funcionais são aquelas pessoas com 15 ou mais anos de idade e com menos de quatro anos de estudo completo; em geral, elas sabem ler e escrever frases simples, mas não conseguem, por exemplo, interpretar um texto.
Fosse um país realmente sério e comprometido com a formação educacional e o bem-estar de seus cidadãos, o Brasil teria promovido, ainda no século passado, um programa de erradicação do analfabetismo nessas plagas. Um programa que, à maneira do que há anos vem sendo feito com as campanhas de vacinação infantil, fosse realmente abrangente e eficaz; e que, ao modo dessas campanhas envolvesse cada família e a sociedade como um todo visando o bem comum.
Eu às vezes me pego lamentando muito pelo fato de minha avó ser analfabeta, porque fico a imaginar o tanto de autonomia que ela não teve na vida por não saber ler e nem escrever. E isso me angustia bastante porque me aflige a ideia de uma existência - num mundo tão complexo - numa condição como a dela.

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