5 de setembro de 2012

O Rio de Janeiro como vitrine e como polo irradiador do progresso do Brasil


Por Clênio Sierra de Alcântara








Alguns anos antes da proclamação da República, ocorrida em 1889, o governo imperial constituiu – precisamente em 1874 – uma Comissão de Melhoramentos da Cidade, que elaborou um projeto de reformas com vistas a modernizar o Rio de Janeiro, a capital política, econômica e cultural do país. Duas diretrizes de tal projeto nortearam todo o debate sobre a modernização da Capital que se desenrolou até o início do século XX: 1ª) a necessidade de eliminar os inúmeros cortiços existentes na cidade, uma vez que eles eram tidos como focos geradores de epidemias – o que mais se propagandeou até como justificativa para as reformas foi justamente isso, a questão da salubridade -; 2ª) aproveitar a ação reformadora para “aformosear” a cidade, arrancando com picaretas o seu traçado colonial, os seus edifícios démodés: “O Rio de Janeiro, segundo os membros da Comissão, devia não apenas sofrer profundas transformações em sua estrutura urbanística – a fim de que estivesse em condições de suportar as demandas geradas pelo seu acelerado processo de crescimento -, mas também modificar a imagem inestética que ela projetava sobre os que a contemplavam”, conforme a avaliação feita por Sérgio Pechman e Lilian Fritsch (“A reforma urbana e o seu avesso: algumas considerações a propósito da modernização do Distrito Federal na virada do século” in: Revista Brasileira de História. São Paulo: ANPUH/Editora Marco Zero, 1985, vol. 5 nº 8/9, p. 150).















O visitante que chegasse ao Rio de Janeiro nos anos iniciais do século passado encontraria uma cidade como que virada de ponta cabeça tamanha era a movimentação de homens e máquinas que levavam adiante as obras de reforma e modernização verificadas, sobretudo, durante a administração do presidente Rodrigues Alves (1902-1906), que encarregou o engenheiro Francisco Pereira Passos – nomeado prefeito do Distrito Federal - para implementar a reforma urbanística; e o médico sanitarista Oswaldo Cruz para tocar a reforma sanitária. Todo esse período foi um dos mais conturbados da história do Rio de Janeiro, marcado por inúmeras revoltas e protestos advindos principalmente das camadas mais carentes da população que, com muita razão, se sentiam excluídas daquele projeto de modernidade que, como alguém já disse, tinha mesmo muito de cenográfico. “O Rio de Janeiro civiliza-se!”, alardeava o cronista Figueiredo Pimentel dando bem a tônica do pensamento dominante que marcou a belle époque carioca. (Aos que se interessarem por percorrer o Rio de Janeiro desse tempo, eu sugiro a leitura de algumas das obras que considero fundamentais para a compreensão da atmosfera do período: Cidade febril, do Sidney Chalhoub; Os bestializados, do José Murilo de Carvalho – Zé Murilo também assina um esclarecedor artigo no volume acima citado da Revista Brasileira de História, p. 117-138 -; e Literatura como missão, do Nicolau  Sevcenko.)
























Instalado no elegante Ed. Arnaldo Dubeux – a restauração realçou a sua beleza -, no Bairro do Recife, um prédio que abrigou durante décadas o Banco de Londres, e depois, a Bolsa de Valores de Pernambuco e da Paraíba, o Centro Cultural da Caixa Econômica Federal abriu suas portas no dia 15 de maio passado, com uma exposição do artista plástico goiano Siron Franco. Desde o dia 19 de julho – e corram porque o evento só vai até o próximo domingo – esse espaço abriga uma mostra que em parte, faz com que o visitante compreenda com mais abrangência o que foi narrado nos primeiros parágrafos deste artigo. Trata-se de 1908 – Um Brasil em Exposição que, sob a curadoria de Margareth da Silva Pereira – é dela, aliás, o instigante texto do pequeno primor que é o catálogo distribuído gratuitamente aos visitantes -, faz uma retrospectiva da Exposição Nacional de 1908 realizada na Praia Vermelha, bairro da Urca, no Rio de Janeiro, de 11 de agosto a 15 de novembro daquele ano, para comemorar o centenário da Abertura dos Portos às Nações Amigas, uma das primeiras medidas tomadas por Dom João VI quando da transferência da Família Real portuguesa para o Brasil.



 
 


 

De acordo com a curadora da mostra instalada na Caixa Cultural, o evento que teve lugar no Rio de Janeiro foi uma versão nacional das famigeradas exposições universais que foram realizadas em grandes cidades do mundo, cuja primeira edição ocorreu em Londres, em 1851. Diz-nos ela: “O Brasil participou de todas as Exposições Universais realizadas na Europa e depois nos Estados Unidos: de início reunindo seus produtos em algumas vitrines (Londres 1851, 1862; Paris 1855, 1867) e mais tarde construindo jardins e edifícios admiráveis (Paris: 1889, Chicago: 1893; Saint Louis 1904; Nova Iorque 1939)”.

  

 


Dentro do projeto do Governo central de promover o engrandecimento da nação a partir do Rio de Janeiro – havia uma poderosa crença de que o resto do país iria, como que por imitação, repetir em suas plagas não somente as reformas urbanísticas e sanitárias levadas a cabo no Distrito Federal, mas também as propaladas modas e mudanças de costumes -, a Exposição Nacional de 1908 procurou, ainda segundo Margareth da Silva Pereira, responder a um desafio mais ambicioso: “realizar um ‘inventário’ capaz de mostrar para os próprios brasileiros o desenvolvimento do país”.





Num primeiro momento eu não simpatizei com a ambientação e com o que estava em exposição na Caixa Cultural, porque eu esperava que fosse ver também algo sobre as reformas havidas na área central da então Capital Federal. Contudo, as imagens mostradas – principalmente fotografias e reproduções de cartões-postais -, bem como os textos que as acompanham, são bastante elucidativos. Ver os flagrantes fotográficos do magistral Augusto Malta causa realmente um espanto. A monumentalidade dos pavilhões que foram erguidos na Praia Vermelha – poucos estados tiveram seus próprios pavilhões – é impressionante. É difícil acreditar que tudo aquilo foi construído para durar só o tempo da exposição. Seja como for, o fato é que a Exposição Nacional de 1908 atraiu um grande número de visitantes; todos eles certamente ávidos por conhecer um pouco de cada recanto do imenso país que habitavam.



 
 







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