Por Clênio Sierra de Alcântara
Fotos: Ernani Neves |
De
um modo geral o patrimônio histórico no Brasil vive constantemente sob a ameaça
de desaparecer do mapa devido a uma série de razões; eis as principais: 1ª) as
políticas de proteção esbarram na escassez tanto de recursos financeiros como
de pessoal capacitado para fiscalizar o acervo – lembre-se que, em âmbito
federal, o órgão responsável pela sua salvaguarda, o Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional (Iphan), não possui nem oitenta anos de
existência -; 2ª) não existe comprometimento por parte da imensa maioria da
população para com a proteção do patrimônio, efeito certamente da ausência de
educação patrimonial na grade curricular das escolas, o que resulta em
indiferença e até em depredação de edifícios e monumentos e furto de peças de
valor histórico; 3ª) relação promíscua de funcionários públicos desonestos com
empresas privadas interessadas na desocupação de terrenos muito cobiçados; 4ª)
falta de empenho de órgãos estaduais e municipais de proteção do patrimônio,
uma vez que nem tudo é de competência e/ou de interesse do Iphan proteger e
preservar.
O
embate ferrenho entre o patrimônio histórico e a sempre voraz especulação
imobiliária está prestes a pôr abaixo o Edifício Caiçara, localizado na Av. Boa
Viagem, no bairro homônimo, na Zona Sul do Recife. A mesma Av. Boa Viagem que
um dia abrigou uma vistosa edificação conhecida como Casa Navio, que eu só vi
através de fotografias. Sim, são perfeitamente discutíveis os critérios que o
Conselho Estadual de Cultura utiliza para dar o seu aval sobre o que deve ou
não ser tombado. E sabemos que, neste caso em particular, o tal Conselho se
posicionou contra o tombamento. Não duvido da competência e muito menos da
honestidade dos seus membros; mas a mim me causa estranheza o fato de que,
meses atrás, esse ilustre Conselho aprovou o tombamento de uma chaminé que
pertencia a uma fábrica de tecidos no centro da cidade do Paulista, que será
mantida num complexo que abrigará um shopping center e unidades residenciais.
Por que uma chaminé é importante e um prédio residencial não? Por tamanho
empenho preservacionista os membros do Conselho foram homenageados pela Câmara
de Vereadores paulistense. E onde é que a Fundação do Patrimônio Histórico e
Artístico de Pernambuco (Fundarpe) entra nisso?
Mesmo
com o posicionamento do Conselho Estadual de Cultura – e sabe-se que a decisão
final quanto ao tombamento ou não do Edifício Caiçara cabe ao governador -,
havia uma determinação da Prefeitura do Recife revogando a liberação de
demolição do prédio que ela mesma havia autorizado. Mas, como é próprio dos
poderosos grupos financeiros, que se pretendem acima das leis e capazes de
sempre influenciar decisões judiciais em benefício deles, a Construtora Rio Ave
iniciou o bota-abaixo do Edifício Caiçara na última sexta-feira.
Na
manhã do domingo passado eu compareci ao Edifício Caiçara ou ao que sobrou
dele. Como que o velando havia um pequeno grupo composto por curiosos e
indivíduos inconformados com mais esse episódio de descaso para com a
preservação do patrimônio que se verifica no Recife. A montanha de entulhos
poderia ser vista como uma metáfora da incapacidade do Estado de defender para
valer o que lhe cabe proteger. A imagem desoladora de um prédio mutilado
espremido entre robustos edifícios esmagou a minha pretensão de racionalizar
com maior apuro o que os meus olhos viam. Percorri os cômodos que restaram da
edificação imaginando as histórias ali vivenciadas; e atravessei os escombros
sentindo o ruflar das asas do Angelus Novus de Paul Klee.
Os
defensores da permanência e conservação do patrimônio histórico e artístico são
constantemente tachados de passadistas e inimigos do Progresso por grande parte
da população deste país. Em tempos de obsolescência programada, a busca do novo
é o propulsor dos devaneios da sociedade. O caso envolvendo o Edifício Caiçara
– fincado justo no endereço onde se encontra o metro quadrado mais caro da
capital pernambucana – expôs novamente a dura realidade que é proteger patrimônio
histórico edificado num cenário em que grandes empresas imobiliárias disputam
de maneira acirrada cada palmo de chão – principalmente do das chamadas áreas
nobres das cidades – a fim de erguer seus prédios suntuosos e caríssimos.
Todos
os povos, todas as sociedades têm o direito de preservar sua história e sua
memória, porque é a manutenção das referências que sinalizam os novos caminhos
que podemos traçar. Progresso não é só destruir e construir outra coisa no
lugar – até porque o novo pode ser nocivo e retrógrado -; Progresso, muitas
vezes, é, também, a capacidade de poder preservar, como defendia Aloísio Magalhães.
Olá, Clênio! Vi esse post sobre o Caiçara e pensei se você poderia me ajudar. Trabalho na Fundação Joaquim Nabuco e preciso de fotos da fachada do Edifício Caiçara antes da demolição, bem como de imagens do interior desse edifício. Elas serão usadas num documentário sobre urbanismo. Você tem fotos assim ou conhece alguém que tenha? Agradeço a atenção.
ResponderExcluirLuiz, infelizmente não tenho. Será que você não encontraria na biblioteca da URB? Ou com o cineasta Kleber Mendonça, que pretendia filmar lá? Quanto à fachada, você já verificou o serviço do Google Street View?
ExcluirOlá, Clênio! Vi esse post sobre o Caiçara e pensei se você poderia me ajudar. Trabalho na Fundação Joaquim Nabuco e preciso de fotos da fachada do Edifício Caiçara antes da demolição, bem como de imagens do interior desse edifício. Elas serão usadas num documentário sobre urbanismo. Você tem fotos assim ou conhece alguém que tenha? Agradeço a atenção.
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