18 de novembro de 2016

O vendedor de cafezinho

Por Clênio Sierra de Alcântara




Foto: do autor        Neste recanto da Praça São José, em Abreu e Lima, a falta de civilidade diariamente comparece para deixar seu rastro



Situada entre três faixas da BR 101 Norte, que corta a cidade de Abreu e Lima em sua área central, a Praça São José passou por uma ampla reforma, não faz muito tempo, que lhe conferiu um aspecto mais bucólico em par com o espaço destinado ao brincar das crianças. De maneira correta a Municipalidade procurou eliminar da área a presença incômoda dos veículos automotivos que faziam do terreno contíguo à praça – e que foi incorporado a ela durante a obra de revitalização – um estacionamento.

As praças, quando bem cuidadas, são bastante procuradas pela população de uma cidade, seja como espaço de lazer, seja como um breve descanso para escapar do agitado e quase sempre estressante movimento do centro urbano, seja como um lugar que se busca para encontrar amigos, conhecer pessoas, fazer protestos, celebrar algo e mesmo namorar. De tal maneira as praças marcam a fisionomia e o cotidiano de uma cidade que não é difícil encontrar entre os citadinos quem afirme que a praça representa a sua principal ligação com tudo o que acontece na localidade onde mora, porque é vivenciando nela encontros e conversas que se pode também construir um apego à própria dinâmica cotidiana que impregna o tecido urbano e que nos liga de modo tenaz ao pedacinho de mundo no qual moramos ou passamos a morar. De certa forma é como se as praças fossem quase o resumo da cidade inteira, porque podemos, às vezes, a partir delas, mirar um fragmento que diz muito de todo o resto: aquilo que fica ao alcance dos nossos olhos; e tudo o mais que está guardado em nossa memória, seja ela afetiva ou não.

Cruzando bem cedo a BR 101 a caminho do trabalho – pelo lado em que ela recebe o nome de Av. Brasil; o outro, que é o antigo, chama-se Av. Duque de Caxias – rotineiramente eu comecei a notar a presença de um homem que praticamente todos os dias – pelo menos de segunda à sexta-feira – estaciona sua bicicleta junto a um poste de iluminação pública, na extremidade direita da Praça São José, para vender cafezinho. O que à primeira vista era só mais um flagrante de um olhar curioso começou a me incomodar tremendamente, porque eu comecei a perceber que naquele cenário, próximo a um banco e  a uma parte da área arborizada da praça, os fregueses do vendedor de cafezinho, dando uma bruta demonstração de falta de civilidade e de cidadania, se punham – e ainda se põem – a jogar os copos descartáveis no chão, desprezando não só a preocupação da Municipalidade em manter o lugar limpo, mas também o bem-estar das pessoas que logo cedinho acorrem para aquele recanto da cidade a fim de praticar exercícios e mesmo apenas para se sentar ali e curtir e contemplar a vida à sua maneira.

De dentro do ônibus eu olhava – como ainda olho – para aquela cena e me perguntava se era possível que ninguém da Prefeitura ainda não tinha se deparado com o mau exemplo que aquelas pessoas davam a quem passava por ali e nem as tivesse repreendido. Olhar aquela situação começou mesmo a me revoltar; e todas as vezes que eu passava por ali me punha a resmungar e a maldizer em pensamento aquela gene. “Ora, se os fregueses do vendedor não têm um mínimo de educação doméstica que lhes faça compreender que jogar lixo nos logradouros públicos é um ato de incivilidade, por que o próprio vendedor não trata de recolher a sujeira que é deixada ali?”, é o outro questionamento que eu me faço quando eu vejo o que vem acontecendo naquele recanto da Praça São José.

Logo no início do seu livro A imagem da cidade, o urbanista norte-americano Kevin Lynch nos diz que “Olhar para as cidades pode dar um prazer especial, por mais comum que possa ser o panorama”. Creio que isso se deva pelo fato de que, por vezes, o olhar capta no que vê a presença do próprio observador. Essa percepção, acredito eu, está muito ligada também a uma compreensão que ultrapassa a mera identificação material do que é observado e se aloja no interior de alguma recente ou remota lembrança.

Em mim Abreu e Lima permanece sendo a principal lembrança que me move.


Um comentário:

  1. As praças merecem uma atenção especial do poder publico, haja visto, ser um lugar de encontro, seja pro lazer ou para colocar um bom papo em dias. Entretanto, esse cuidado, deve ser mantido pelas pessoas que moram ou circulam em suas imediações, devendo zelo e atenção. A praça é patrimônio de todos, e por isso, deve ser bem cuidada.

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