Eu quero
ser, me deixa ser
O que
mereço
Eu quero
ser quem eu sou
Eu tenho
meu valor
E este
não tem preço.
Apelo de mulher
A nona edição da Marcha Pela
Vida das Mulheres e Pela Agroecologia este ano ocorreu na cidade de São
Sebastião de Lagoa de Roça, que dista a cerca de 107 km da capital paraibana. Acompanhando a
cirandeira Lia de Itamaracá, que por três anos consecutivos tomou parte no evento
e se tornou uma espécie de talismã do movimento, eu fui mais uma vez participar
dessa marcha que, pode-se dizer, já se consolidou – e sou eu que o digo sem ver
nisso qualquer exagero – como um dos grandes acontecimentos que se verificam no
Brasil em celebração ao 8 de março, mundialmente estabelecido como Dia
Internacional da Mulher, muito embora saibamos que, em certos países, o
primitivismo que marca as relações entre homens e mulheres as reduz lamentável
e absurdamente a seres inteiramente submissos, sem gostos e sem vontades.
Local onde foi instalada a feira |
A Marcha Pela Vida das
Mulheres e Pela Agroecologia tem uma pauta de protesto e de reivindicação
bastante ampla e legítima. Quando se destaca o apelo “pela vida das mulheres”
não se está somente fazendo referência aos inúmeros casos de feminicídio que
diariamente pontuam e elevam as estatísticas de assassinato de mulheres por este país afora; está-se,
também, reivindicando melhoria da qualidade de vida como um todo: melhoria essa
que inclui, entre outros, uma rede de proteção contras as violências físicas, morais
e sexuais; e acesso a creches e a unidades de saúde e de ensino para elas e
para seus filhos. E no caso particular das mulheres agricultoras que vivem no
semiárido paraibano e na área que abrange a Serra da Borborema, a ampliação da
promoção da agroecologia visando à produção de alimentos saudáveis. E para
plantar e colher é preciso que se tenha acesso à terra e à água e a
financiamentos. Daí por que neste ano o evento protestou também contra cortes
havidos nos programas de construção de cisternas e do Garantia Safra.
Da esquerda para a direita Marquinho, Telma, Lia e Tom Jaime |
Biu Baracho, Jane e Dulce Baracho |
Quando chegamos ao local da
concentração, já era numerosa a multidão que se encontrava por lá ouvindo o que
era discursado no palco e circulando pela feira onde era comercializada uma
gama variada de produtos – frutas, doces, artesanato, bebidas, plantas – e que
foi montada num inacabado ginásio esportivo.
Conversei com duas senhoras:
Zuleide da Costa, de 77 anos, e Marlene Gomes, de 67 anos; amigas que saíram
juntas de Campina Grande para prestigiar o evento. Com uma fala firme e ao
mesmo tempo serena, Marlene me disse o seguinte quando lhe perguntei com que
propósito ela fora até ali: “A gente vem para homenagear as mulheres e ver que
todas precisam de um encontro, de mais uma pessoa, de mais e mais, pra fazer a
força, não é? E assistir a essas coisas assim pra gente estar por dentro de
tudo, não é? e saber o que se passa com outras mulheres. E até os homens mesmo
têm que dar esse apoio às mulheres porque as mulheres são muito sofridas e
desrespeitadas. Eu acho de grande importância essas marchas e espero que todo
ano aconteçam”.
Não são poucos os homens que
tomam parte na marcha; sinal de que nem tudo está perdido neste mundo, porque,
felizmente, existem homens esclarecidos e conscientes de que devem sim apoiar e
encorajar as mulheres em suas lutas para que a sociedade como um todo cresça baseada
numa firme e harmoniosa igualdade entre os sexos.
No meio da plateia masculina que engrossava o coro da marcha, eu encontrei um muito simpático Paulo Camilo, de 30 anos, que trabalha no Sindicato dos Trabalhadores Rurais da cidade de Remígio. Ele, que há cinco anos vem participando do evento, me falou que tem notado que a cada versão da marcha ela parece agregar e envolver mais pessoas; ele credita isso ao boca a boca que tem disseminado a necessidade de que ocorram movimentos como esse e ao próprio esclarecimento que o pessoal vem tendo a respeito das questões que a marcha põe em debate.
Cruzes para lembrar os assassinatos diários de mulheres por este país afora. Crimes esses que na maioria das vezes são executados pelos companheiros ou ex-companheiros das vítimas |
As amigas Zuleide e Marlene: apoiando a causa |
Pouco depois das 11:00 h a marcha em si teve início. E percorreu algumas ruas da pequena São Sebastião de Lagoa de Roça. Defronte ao cemitério paramos todos para assistir à encenação de um vampiresco e caricato Michel Temer que, tomando um caminhão como palanque, fez um discurso elencando o pacote de maldades que até agora ele pôs em prática.
Eu querendo sair bem numa selfie |
Seguiu a marcha em direção à
Igreja Matriz de São Sebastião antes de retornar ao ponto de partida, onde Lia
de Itamaracá e o seu conjunto embalaram muitos que, suportando a quentura do
sol do meio-dia, se puseram a dançar ciranda. Pense num povo de fibra.
O vampiresco Michel Temer |
Contra o preconceito, contra o desamor, contra o ódio, contra tudo de ruim |
O palanque do vampiro |
Cirandando sob o sol de meio-dia: isso é que é disposição |
Paulo Camilo: a conscientização mobiliza as pessoas |
Paulo Camilo e eu num clique da Eliane Barbosa |
Talvez chegue o dia em que
as mulheres não precisarão mais sair em marcha protestando contra uma coisa e
outra. Mas enquanto esse dia não chega – e muito provavelmente não chegará sem
que haja protesto – é preciso que a marcha continue firme e forte. É preciso
lutar. É preciso protestar. É preciso reivindicar. É preciso denunciar. É preciso
gritar. É preciso, enfim, dizer onde é que dói.
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