Por Sierra
Não é de hoje que o princípio da "arte pela arte" é posto em discussão quando se procura examinar determinados personagens da História da Arte e o legado de suas produções. A interpretação - e o exame - de uma obra de arte, no mais das vezes, costuma ser relacionada com a própria persona do artista. Faz-se uma avaliação não somente da obra em si como também do modo como o seu criador está posto no mundo como artista e como cidadão.
Seria um tanto quanto absurdo e/ou desprovido de um olhar realmente perspicaz e criterioso considerar que existem artistas que não dão à sua arte, ao seu fazer artístico um, digamos, cunho e/ou destino outro que não seja unicamente de produzir algo que ele compreende que é uma expressão artística, mas sem, no entanto, conferir a ela um caráter finalístico? Eu acredito que não, porque eu acredito que existam por aí, aos montes, artistas que fazem arte tão somente como um produto venal, sem adicionar a ela qualquer intenção de cunho, por assim dizer, questionador da sua razão de ser arte. É como se o artista, enquanto tal, não compreendesse sequer o que lhe leva a fazer o que ele faz: não há questionamento, não há proposta de discussão e não há uma intenção de lançar uma indagação e um fazer pensar com a arte que ele produz, como se ela fosse algo destinado a servir só e somente só como um objeto de decoração.
Faz um bom número de anos que, pela primeira vez, eu entrei em contato com trabalhos do Nelson Leirner. E isso aconteceu durante uma exposição havida no Museu de Arte Moderna Aloísio Magalhães (MAMAM), no Recife, E eu recordo que o primeiro impacto e impressão que eu tive, ao meu encontrar frente a frente com uma obra desse renomado artista brasileiro, foi me alegrar e achar divertido e lúdico aquilo, aquela superfície que os meus olhos viam, Sem cabedal algum para mirar a obra com olhos de uma crítico de arte, porque eu era só e somente só alguém que gostava - e que continua gostando - de expressões artísticas e que nutre muito interesse por museus e instituições do gênero, eu olhei para o que estava exposto no MAMAM sem dimensionar e/ou bem compreender - é exatamente esta a palavra: compreender - aquilo.
No último dia 4 de outubro eu fui até a Caixa Cultural, do Recife, prestigiar a exposição "Parque de diversões", o que foi o meu reencontro, digamos assim, com o universo artístico de Nelson Leirner desde aquele meu primeiro contato havido no MAMAM. E se o correr dos anos, desde então, não fez de mim um crítico de arte, me muniu, pelo menos, de algum conhecimento para interpretar, ainda que sem grandes expansões avaliativas, o que os meus olhos agora viam.
Nelson Leirner, como artista, tinha um senso questionador sobre o caráter, o fundamento e o status da arte e do fazer artístico bastante aguçado. O próprio princípio de antiarte que ele mantinha e usava como uma espécie de lema e bandeira de sua condição de artista é, a meu ver, uma marca distintiva dele que deixava deveras claro que, no seu caso, não dava, de jeito nenhum, para se filiar aos que fazem "arte pela arte".
Há no conjunto da obra de Nelson Leirner - e eu digo isso me referindo obviamente não à sua totalidade e sim às obras que eu já vi - uma chama de questionamento e de protesto permanentemente acesa. A meu ver, o cunho daquilo que eu enxergo como lúdico em par com o apelo visual do multicolorido de que muitas obras estão imbuídas, encerram uma militância muito firme, inflexível e docilmente feroz. O lúdico e o multicolorido são como que artimanhas e meios de atrair o espectador para perto a fim de que ele veja com bastante atenção o que está claramente exposto e exibido ali; e, uma vez que o espectador atendeu ao chamado, que ele encare com firmeza todas as conotações possíveis que cada obra daquela possui.
Enquanto eu ia fazendo as minhas interpretações de algumas das obras expostas em "Parque de diversões, cuja curadoria coube a Agnaldo Farias, ao mesmo tempo eu fui me dando conta de que, tanto quanto - ou até mais - de um chamamento para o seu trabalho o que, talvez, efetivamente Nelson Leirner esperava de todo e de cada um apreciador de suas obras era que todos e cada uma deles aderissem, numa espécie de filiação, ao seu mondo de enxergar e de estar no mundo.
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