Por Sierra
Imagem:Internet
Algumas transformações pelas quais as cidades passam não são vistas de maneira imediata pelos nossos olhos, porque elas vão se processando de modo quase que invisível
Nem todas as mudanças e transformações que se operam nos espaços urbanos são inteiramente vistas assim, pelos nossos olhos, não são percebidas e notadas de imediato como, por exemplo, são vistas e notadas obras de pavimentação de ruas e a construção de um prédio. Isso se dá porque, no universo citadino, mudanças e transformações se operam não somente no corpo físico da cidade propriamente dita, mas também podem ocorrer no modo como os seus habitantes se comportam e lidam com ela. E isso, esse comportamento não necessariamente chega à nossa visão, como, por exemplo, uma festa que anualmente é realizada em determinado local, o que nos leva a inferir que certos movimentos e transformações que ocorrem nas cidades vão-se processando de maneira silenciosa e imperceptível, em sua inteireza, aos nossos olhos.
Eu fiz essas considerações quando, na semana passada, eu tomei conhecimento de dados estatísticos divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) que revelaram que 13,7 milhões de pessoas estão morando sozinhas no Brasil, o que corresponde a 18,9% dos mais de 72 milhões de residências do país. É um número realmente espantoso quando examinado sob qualquer prisma; e que ensejou, por parte de analistas, algumas possíveis explicações para essa realidade.
O que é que explicaria essa quantidade tão elevada de pessoas morando sozinhas, uma tendência que, até onde eu sei, não é uma exclusividade da sociedade brasileira de então? Bem, segundo algumas matérias que eu li e pelo menos um vídeo que eu vi, analistas apontaram como explicações imediatas para isso o envelhecimento da população e a escolha que muitos indivíduos estão fazendo de não se casar e nem ter filhos.
É claro que tais explicações dizem muito, mas elas não dizem tudo, evidentemente. Muitas pessoas podem estar morando sozinhas porque os filhos cresceram e ganharam vida própria, deixando as casas dos pais ou do pai ou da mãe, porque eles se separaram ou um dos cônjuges faleceu. Pode ser que a opção por uma vida celibatária não seja necessariamente uma postura de quem não acredita na instituição casamento, e sim uma escolha muito racional de quem põe os gastos na ponta do lápis e se certifica de que não tem condições financeiras de sustentar uma vida a dois, e, menos ainda, se o plano do casal for ter um ou mais filhos. Sem falar que existem pessoas que se casam e vivem em casas separadas, sem manter um convívio diário e permanente sob um mesmo teto.
É fato que a viuvez não determina que o viúvo e/ou viúva não pode mais se casar. Ocorre que, muitos são os casos em que, uma vez viúvos, homens e mulheres resolvem não mais se casar e passam a gozar suas vidas de maneira solitária, ao menos no interior de suas residências.
Já quanto à escolha de não ter filhos ela não está necessariamente só ligada aos custos e gastos que uma prole implica. Tanto isso é verdade que não são poucas as pessoas bem-sucedidas financeiramente que não querem ser pais nem mães e pronto. Conheço pessoas que não puseram isso na ponta do lápis; elas dizem que procederam assim porque não se veem colocando no mundo uma criança para enfrentar uma sociedade que, além de ser violenta, preconceituosa, intolerante e cruel, não cuida bem do meio ambiente.
Os números divulgados pelo IBGE revelaram uma faceta, uma entre as tantas que se processam no universo desigual e nada uniforme de nossas cidades. Não sei se tais dados estatísticos fizeram recortes dos níveis socioeconômicos de todas essas pessoas que estão morando sozinhas, porque eu compreendo que isso também é importante como um dado social, sobretudo se nos ativermos às condições em possam estar vivendo idosos solitários a fim de que sejam implementadas políticas públicas de acompanhamento e até amparo a esse grupo da população, visto que fazemos parte de uma sociedade que endeusa a juventude e que abomina e maldiz a velhice.
Os urbanistas, os engenheiros e os arquitetos dispõem de grande capacidade para conceber e planejar todo um traçado urbano e mesmo pensar em suas transformações ao longo do tempo. O que eles não têm como conceber, desenhar e planejar são as interações e os modos de estar, encarar e experienciar as cidades que os seus habitantes vivenciam e invisivelmente transformam.
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