Por Sierra
De acordo com dados
divulgados pela Sociedade Brasileira de Salvamento Aquático (SOBRASA),
dezesseis pessoas morrem afogadas por dia no Brasil. É um dado realmente
espantoso e ao mesmo tempo chocante, principalmente quando se leva em conta que
casos de afogamentos não ocorrem apenas em praias e rios, mas também em lagoas,
açudes, barragens e até em piscinas.
Costuma-se dizer que é
preciso educar para não afogar; e que a prevenção evita o afogamento. E quem é
que nos vem logo à cabeça quando nós pensamos em ações de educação, prevenção e
mesmo de resgate de indivíduos que estão prestes a se afogar? É claro que é o
guarda-vidas; é aquele sujeito que se destaca entre os demais frequentadores de
balneários e parques aquáticos, com suas vestes de cores vibrantes, olhares
atentos e postura firme; é aquele rapaz ou aquela moça que dá orientação ao público em geral para bem conviver com a
água e melhor aproveitar e desfrutar os instantes de lazer e divertimento.
E como foi que começou a atuação desses profissionais no Brasil? E como é que atualmente eles estão presentes por este país afora? Respondendo a essas e a outras perguntas, o antropólogo e escritor Cristiano Galvão construiu uma narrativa esclarecedora no seu mais recente livro Os guarda-vidas: no princípio "eram pretos, robustos e corajosos" - dos banhos de Dom João aos ataques de tubarão (Maringá: Editora Viseu, 2024), que já se encontra à venda na Amazon, no Carrefour e na Estante Virtual; e que será lançado oficialmente no próximo sábado, dia 15 de março, a partir das 16h, no Espaço Vida Marinha, na orla de Piedade, em Jaboatão dos Guararapes.
Como o título da obra deixa ver, Cristiano Galvão, que também é tenente do Corpo de Bombeiros Militar de Pernambuco e atuou como guarda-vidas por um bom tempo, fez um mergulho na História para encontrar e trazer à tona indivíduos anônimos que desempenharam tal função de maneira autônoma e nos mostrar ainda como, com o transcurso do tempo e as transformações sociais e institucionais, os guarda-vidas, civis e militares, passaram a figurar como elementos extremamente necessários em balneários, em geral, e, principalmente, naqueles que atraem grandes públicos.
Além de nos contar como foi se dando esse processo de entendimento, por parte da sociedade, de que era preciso que os banhistas - inicialmente apenas os frequentadores das praias - contassem com a vigilância e a orientação de indivíduos que detinham experiência como nadadores, Cristiano Galvão nos disse como a própria dinâmica da prática de tomar banhos de água doce, em rios, e de água salgada, nas praias, foi mudando ao longo do tempo, passando da recomendação médica e terapêutica até chegar à realidade dos dias atuais.
Outro ponto alto da narrativa de Cristiano Galvão é o seu olhar para a questão racial dentro da esfera social brasileira, relacionando-a, por exemplo, com o fato de que, pelo menos aqui em Pernambuco, estado onde o regime escravocrata fincou bases muito sólidas, os primeiros indivíduos que informalmente atuaram fazendo, digamos, a segurança balneária de quem poderia pagar por seus serviços, foram homens negros, como deixou registrado o escritor Mário Sette, que o autor citou em seu trabalho. Além disso, o antropólogo Cristiano Galvão recorreu também à história oral; e colheu depoimentos de alguns guarda-vidas de um tempo em que o Corpo de Bombeiros ainda não tinha encampado a missão de salvamento aquático e eles trabalhavam nas praias recifenses, atuando como funcionários da Prefeitura Municipal da capital pernambucana.
Quando Cristiano Galvão me convidou e me honrou com a tarefa de prefaciar essa sua obra mais recente, eu falei para ele que, em vez de escrever um prefácio como habitualmente nós vemos por aí, eu escreveria um, digamos, prefácio-ensaio que, no meu entender, não só enriqueceria como complementaria a abordagem do texto dele. E assim foi que eu escrevi um longo relato em que fiz uma interpretação, uma leitura do Praieiro, um boletim que era distribuído pelos postos de salvamento das praias recifenses e que começou a circular, somente nas "temporadas de verão", a partir de setembro de 1945, divulgando técnicas de natação, cuidados com a saúde, prática de esportes, tábuas de marés, arte, literatura, poesia e algo mais, marcando de modo indelével a vida praieira do Recife do seu tempo.
O novo livro de Cristiano Galvão é um desses acontecimentos do mundo literário com os quais vez por outra nós nos deparamos e chegamos a nos perguntar por que, cargas-d'água, uma obra com essa abordagem não tinha aparecido antes em nosso meio, dada a sua relevância temática e a necessidade que nós temos de nos educar e de instruir para prevenir casos de afogamento.
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Foto: Arquivo do Autor |
Bom, vamos aproveitar esse momento de águas calmas para, na companhia de Cristiano Galvão e dos vários indivíduos e personagens que povoam o seu livro, aprendermos a desfrutar dos balneários sem corrermos riscos de afogamento, porque divertimento não deve nunca rimar com sofrimento e lamento.
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