O tom catastrófico com que muitos ambientalistas têm descrito o futuro da humanidade, para o caso de nada ser feito para ao menos diminuir o ritmo de degradação por que vem passando todos os ecossistemas do planeta, ganhou contornos ainda mais dramáticos na recente Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, havida no Rio de Janeiro no mês passado. Na programação do evento a grande discussão – um ponto nevrálgico no qual nunca se chega a um acordo que seja efetivamente aceito por todos os países participantes, como bem sabem os que acompanharam os debates e têm conhecimento do que se passou vinte anos atrás, na Eco-92 – girou em torno de como reduzir a emissão de gases do efeito estufa.
Sabendo que à Rio+20 compareceu um certo C40, grupo que reúne os prefeitos de 59 grandes cidades do mundo, que propôs levar adiante iniciativas que possam ser realmente postas em prática no âmbito de seus municípios, ou seja, em escala micro, uma vez que na macro a coisa cisma em não sair do lugar, eu quis trazer para este humilde espaço, que é o meu blog, um olhar que reflete a realidade de cidades que eu conheço e que, claro, estão de fora do C40.
Algo que fica bastante evidente em conferências como a Rio+20 é que os líderes que de fato poderiam promover mudanças significativas no modus operandi de suas economias não o fazem porque não querem abrir mão de recursos e/ou de processos que possam trazer como resultado imediato a queda, a diminuição do PIB de seus países. Por outro lado, julgo ser de um cinismo infame os discursos que pregam rigores desmedidos para os países em desenvolvimento enquanto que os desenvolvidos, que já vêm desfrutando do bom e do melhor que a civilização produziu até aqui, não queiram abdicar de suas posses. É muito sensato apregoar que todos devem utilizar transporte público; mas não é justo que esse discurso parta de uma gente que possui não sei quantos carros na garagem. A grande infâmia da proclamada "moralidade ecológica", ou, se preferirem, "moralidade ecologicamente sustentável", é fazer crer que cabe aos pobres arcar com o ônus do esbanjamento dos ricos.
Trazendo a coisa mais para perto de nós, eu quero dizer que custo a acreditar na redação de grandes medidas preservacionistas quando nem para os problemas mais comezinhos os governantes brasileiros oferecem solução. Como podemos falar em diminuir a emissão de gases poluentes se o discurso preponderante é o do "compre um carro com taxa zero de juro"? Como podemos conscientizar pessoas carentes da necessidade de preservação dos mananciais se as políticas públicas parecem desconsiderar o fato de que a ausência de saneamento básico acarreta também a poluição de lagos, lagoas e rios? Como podemos promover campanhas de reciclagem de lixo se a grande maioria das cidades brasileiras nem sequer dispõe de aterros sanitários?
O conceito de "cidade sustentável" acaba figurando como algo completamente discrepante num contexto social onde milhões de pessoas sobrevivem sob condições por vezes as mais adversas. Ninguém discorda, por exemplo, que os mangues precisam e devem ser preservados; mas, e quanto às famílias que ergueram palafitas nesses lugares? Não aceito discurso de preservação ecológica que tira as pessoas de cena; que não consegue incluir a população como fator das ações de recuperação de ambientes degradados; discursos que afirmam que para salvar o meio ambiente será preciso eliminar o homem.
Sim, eu também aceito a proposta que estabelece ações em escala micro visando a macro. Não podemos esperar que os governantes façam tudo por nós, porque eles nunca farão. O episódio do "apagão energético" ocorrido anos atrás neste país deu bem a medida do quanto os nossos supostos guias estavam/estão preocupados com o nosso bem-estar. Tal episódio deveria ter nos propiciado uma grande lição: a de que é preciso fazer uso consciente dos recursos naturais para que possamos usufruir deles por anos sem fim. Mas, infelizmente, não foi isso o que se deu: passado o temor do colapso da energia elétrica, o consumo voltou a exacerbar-se desenfreadamente.
A constituição de "cidades sustentáveis" não deve figurar como projeto utópico, mas, sim, como meta de um plano de governo que também enxergue o cidadão comum como elemento natural a ser dignamente preservado.
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