18 de setembro de 2014

Por que você é um idiota? Porque sim!!


Por Clênio Sierra de Alcântara



Imagem da internet



Acredito que não há no mundo quem conteste a máxima que diz que “a propaganda é a alma do negócio”. Anúncios são a forma mais consagrada de fazer com que algo – um produto, um serviço, uma ideia, etc. – se torne conhecido do grande público ou de um público específico. E para atingir o consumidor recorre-se aos mais variados recursos publicitários nos diferentes meios de comunicação.

Algumas peças publicitárias – sobretudo as que são veiculadas pela televisão – apelam para o emocional, outras procuram ser bem-humoradas, umas subestimam a inteligência do telespectador e ainda existem as que descambam para um completo mau gosto, para não dizer, para a ofensa mesmo. Esse exercício de convencimento é acompanhado pelo Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar), que recebe reclamações sobre os anúncios e, depois de avaliar se as queixas têm fundamento, recomendam até que a propaganda pare de ser veiculada.

Propagandas eficientíssimas são aquelas que despertam no público consumidor uma empatia tal que ele passa a levar para a sua vida cotidiana além do que é anunciado, claro, os bordões dos reclames e a denominar um dado produto a partir da marca fantasia. Ainda hoje se diz por aqui: “Pega um bombril na cozinha”, para se referir a uma lã de aço. Ou: “Bota um pouco de omo no tanque”, se referindo a sabão em pó. E houve uma época em que modess era sinônimo de absorvente íntimo feminino. E os de minha geração certamente recordarão de bordões que eram repetidos à exaustão, como estes: “Bonita camisa, Fernandinho!”; e “Quando a gente não quer, qualquer desculpa serve”. Sem esquecer da utilização que se fazia deles no dia a dia: “Cadê fulano?”, alguém perguntava; e se respondia: “Tomou Doril” – uma marca de analgésico -, para dizer que não se sabia onde o fulano estava, uma vez que o slogan da propaganda do medicamento dizia: “Tomou Doril, a dor sumiu”. E ainda tem aquele anúncio maravilhoso que mostrava uma moça usando pela primeira vez um sutiã e ao final o locutor completava: “O primeiro Valisère a gente nunca esquece”. Quantas e quantas vezes não ouvimos “a primeira vez a gente nunca esquece” relacionado a toda e qualquer coisa e/ou situação que fosse uma experiência nova que estivéssemos vivenciando?

De uns tempos para cá a propaganda brasileira, que é uma das mais premiadas do mundo, elegeu também a vulgaridade e o mau gosto como meios de convencimento. Chegamos a ver um siri humanizado que mostrava a bunda para o telespectador num comercial de cerveja; e, mais recentemente, o anúncio de um site de vendas de objetos usados que, fazendo uso de um famigerado e pegajoso bordão que dizia “Sabe de nada, inocente”, punha uma mulher em traje de banho sendo chamada de ordinária e levando o espectador a vê-la como uma esposa que aprontou alguma safadeza com o marido – pelo menos foi essa a leitura que eu fiz -, ao qual o bordão era dirigido. Ocorreu uma grita junto ao Conar e o reclame foi retirado de circulação.

Ainda mais recente é uma série de comerciais de uma cerveja que insiste em tratar o consumidor como um completo idiotão, ao mostrar indivíduos em situações diversas que, quando indagados por que fazem isso e aquilo, respondem com um estúpido “porque sim!”. Ora, caras-pálidas, como dizia o personagem Telekid – interpretado pelo Marcelo Tass -, do excelente Castelo Rá-Tim-Bum, “porque sim não é resposta”. Argumentar, meus caros, dá trabalho, não é?


Sou de um tempo – e me perdoem se aparento ser passadista; de verdade, eu não sou do tipo que pensa que tudo do passado era melhor do que o que existe hoje – em que havia alguma inocência e poesia. Nos dias que correm o apelo maior é para a greia, para o achincalhe, para a licenciosidade, para o pouco ou nenhum pensar. Para mim, tão nocivo quanto enxergar o mal em tudo, é não enxergá-lo em lugar nenhum.


(Artigo publicado também in: O Monitor [Garanhuns], Nº 168, novembro de 2014, Variedades, p. 5.)




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