26 de novembro de 2022

Os ipês-amarelos do Parque Sólon de Lucena: beleza, alegria e maravilhamento

 Por Sierra

 

Fotos: Arquivo do Autor
Dádiva da natureza e um encanto para os olhos, os ipês-amarelos encheram o Parque Sólon de Lucena de uma cor e de um brilho maravilhosos neste mês de novembro


Nada se lerá aqui d’As flores do mal, do Charles Baudelaire, o “lírico no auge do capitalismo”, do qual falava Walter Benjamin. Nada de spleen. Nada de tristeza. Nada de melancolia. Nada de “flores com cheiro de morte”, como as dos Titãs. Nada daquelas flores “do jardim da nossa casa” que “morreram todas de saudades de você”, como avisaram Roberto Carlos e Erasmo Carlos. E por quê? “Porque é primavera”, como nos diz o saudoso paraibano Cassiano. É tempo da florada dos ipês-amarelos. E “amarelo é sentir-se sol’, como canta lindamente a roraimense paraibanizada Érica Maria.



Canta, canta Érica Maria: "Amarelo é sentir-se sol"


Mestre Cartola, o bom Cartola que dizia que o “mundo é um moinho” também anunciava que “as rosas não falam”. Elas falam sim, mestre; e falam tanto que Antoine de Saint-Exupéry pôs uma rosa, uma flor encarnação de sua amada Consuelo Sandoval, falando em O pequeno príncipe. E Escurinho, danado que só ele, proclamou lá no Espaço Cultural José Lins do Rego: “Cadê as flores? Mande as flores pra mim”.




Ah, Escurinho, as flores estão irradiando beleza, alegria e maravilhamento nos vários ipês-amarelos do Parque Sólon de Lucena, que a boa gente da capital paraibana chama carinhosamente apenas de Lagoa. É tempo de florada dos ipês-amarelos. E eles encantam a todos ou a quase todos que passam por aquele recanto bucólico e calmante que é a Lagoa.





Todos os anos vêm a florada. E todos os anos eu miro aqueles ipês-amarelos como se fosse a primeira vez. Olho para todos eles e sinto uma imensa alegria, como se eles estivessem dizendo, falantes como a flor do Exupéry: “Bom dia! Seja bem-vindo”. E eu tomasse isso como uma saudação por demais intensa, verdadeira e íntima que me liga sempre e sempre mais à cidade de João Pessoa, esta cidade de vários nomes, de várias vocações e de alma acolhedora.





De longe, de quem vem vindo da Cidade Alta, os ipês-amarelos demarcam a paisagem do Parque Sólon de Lucena com o contraste de suas flores com a folhagem verde das outras árvores com as quais eles dividem o espaço. Bem faria a Prefeitura Municipal se plantasse mais ipês-amarelos em torno do parque, o que o tornaria ainda mais bonito. O círculo de flores lembraria uma coroa real amarela; amarela com uma beleza muito viva, muito atrativa, muito encantadora e muito inspiradora.






O encanto, os encantos da vida estão espalhados por quase toda a parte. E a natureza diariamente nos revela pequenos e grandes encantos. É o encanto do sol irradiando e enchendo tudo de luz. É o azul do céu. São os animais em harmonia com seus habitats. É, enfim, tudo o que faz de nossa existência algo satisfatório, prazeroso e bom.





Caminhar pelo Parque Sólon de Lucena nesta época de florada dos ipês-amarelos torna esse exercício de existência ainda mais revigorante, mais reenergizante. Deveríamos querer sempre e sempre manter esse contato íntimo e próximo com o ambiente natural. Mais árvores, mais pássaros, mais flores, mais convívio com a natureza num mundo excessivamente eletrônico e ligado a um sem-número de coisas que cabem num smartphone. Um contato, um convívio íntimo e próximo com o natural que está ao nosso redor e com o qual devemos viver em comunhão, porque a degradação do meio ambiente significa a degradação de cada um de nós, porque, sem os recursos naturais, nenhum ser vivo consegue sobreviver.





Não foi difícil encontrar nas manhãs e tardes deste novembro que corre rumo ao fim, uns e outros que paravam para registrar, com a câmera do celular, a beleza radiante dos ipês-amarelos floridos. Não dá para ficar indiferente à tamanha beleza. Aquelas porções gigantes de amarelo intenso, aquelas aparições temporárias de flores tão delicadas e formosas nos tocam com uma força indescritível, como se elas estivessem ali nos chamando, muito vaidosas e cheias de si, para que nós as admirássemos e fôssemos com elas bater um papo, trocar olhares e celebrar a magia da vida numa simbiose perfeita.


Tapete de flores






Muitas e muitas voltas eu dei em torno da lagoa, lagoa ao redor da qual o Parque Sólon de Lucena foi estabelecido e reconfigurado ao longo de várias décadas sem, contudo, perder o seu caráter de lugar de aconchego e de tranquilidade em meio ao barulho e à agitação da selva de pedra tomada por automóveis dentro da qual ele aparece.




Olhe bem de perto: tem uma garça lá em cima, no lado direito da foto


Nada de spleen, nada de tristeza e nada de melancolia, eu disse nas primeiras linhas desta narrativa. Mas há algum lamento. Há um lamento por ter encontrado, depois de alguns meses em que eu estive ausente, um Parque Sólon de Lucena sem o cuidado e sem a afluência que se verificava antes da pandemia e mesmo no começo deste ano, quando por ele eu caminhei diversas vezes. O parque está carecendo de cuidados. A limpeza continua eficiente, mas existem problemas. Banheiros estão funcionando de forma limitada; os bebedouros estão quebrados; vendedores de drogas continuam atuando na área dos jogos de mesa; a iluminação não está adequada em pontos como a Praça dos Ipês; e a ausência dos vigilantes que faziam rondas constantes e advertiam uns e outros que estavam transgredindo normas, como caminhar na pista de ciclismo, talvez, explique a baixa procura pelo local que eu vi nesses dias recentes, o que é deveras lamentável, porque o Parque Sólon de Lucena é um dos encantos da capital paraibana. Felizmente a beleza dos ipês-amarelos se sobrepôs a todas essas coisas ruins.


Fazendo pose para guardar a beleza do amarelo numa fotografia




As flores rapidamente foram caindo ao longo desta semana


Sopra o vento nesta última semana de florada; e as flores dos ipês-amarelos voam, voam como que se despedindo de nós. Voam, voam para cair no chão e formar tapetes como se fossem a estrada dos tijolos amarelos que levam até o mágico de Oz. A vida também “pode ser maravilhosa”, como canta o Ivan Lins. E a curiosidade que mora dentro de cada um de nós chega aos nossos olhos com a força própria daquilo que busca todo o encantamento, todo o prazer, toda a satisfação, toda a compreensão, toda a alegria e toda a poesia que há no mundo.

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