Por Sierra
Quem acompanha este meu blog se deu conta que eu já falei mais de uma vez da Praça Antônio Vitalino, que fica na área central de Abreu e Lima, cidade que faz parte da Região Metropolitana do Recife. Ao longo dos anos eu tenho acompanhado as mudanças físicas e de uso que vêm sendo destinadas àquela praça, um espaço público do meu chão natal pelo qual eu nutro um sentimento que é um misto de afeição e de apego às suas memórias social e urbana.
Permanecem muito vivas nas minhas lembranças e recordações inúmeras das vezes em que eu me dirigia para aquele lugar seja com consumidor da grande e afamada feira livre que a ocupava inteiramente e do Mercado Público que ficava logo na entrada, seja como feirante - ainda adolescente, eu passei um bom tempo como ajudante de Seu Déda, um negociante de carnes e miúdos de porco que fora o segundo marido de minha avó Maria da Conceição. Eu também frequentava aquela praça em noites de dezembro, quando criança e adolescente, porque desde que eu me entendo por gente, Natal em Abreu e Lima sempre foi sinônimo de parque de diversões com roda gigante, carrossel, pula-pula e maçã do amor. A Prefeitura Municipal de Abreu e Lima removeu de modo definitivo a feira livre, a inesquecível e saudosa feira livre que era montada na Praça Antônio Vitalino e nas ruas que para ela afluem, mas os parques de diversões continuam a ser montados lá na época das festas de fim de ano.
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Carros e motocicletas ocupam quase toda a praça... |
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... e a Municipalidade mandou construir recentemente uns banquinhos para dar ares de praça ao grande pátio de estacionamento. E as árvores, cadê? |
Não posso negar que a minha veia memorialística é imbuída de um indisfarçável saudosismo. E é por isso que eu costumo escrever sobre a Praça Antônio Vitalino sempre carregado de um tom dramático e passional. Dramático pelo fato de a Praça Antônio Vitalino ter perdido a feira livre que eu considero o acontecimento mais marcante e importante de toda a sua história - para uns e outros os fatos mais memoráveis ocorridos ali foram alguns comícios políticos -; e saudosista porque não foram poucas as vezes em que eu fui tão feliz em minha vida como eu fui quando percorria a feira livre que a praça abrigava.
Apesar de atualmente morar na Ilha de Itamaracá, eu continuo frequentando a Praça Antônio Vitalino com alguma assiduidade, porque trabalho em Abreu e Lima e costumo comprar uma coisa e outra nos estabelecimentos que existem nos arredores da praça, de modo que eu não a tenho perdido de vista.
O motivo, o mote para esta narrativa de hoje foram as mudanças mais recentes pelas quais a Praça Antônio Vitalino passou e que, infelizmente - e eu queria tanto que algum prefeito tivesse a coragem de reverter isso - a consolidaram não como uma praça propriamente dita, condição essa que, até onde eu sei, ela nunca de fato gozou - talvez, no tempo em que existia uma TV ali, há mais de quarenta anos, uma TV que era ligada e as pessoa iam chegando para assistir ao que era exibido, porque ter um televisor em casa naquela época era algo muito difícil, uma vez que o aparelho custava muito caro, aquele espaço fosse visto pelo povo como uma praça típica à qual se vai para passear, se sentar, namorar e conversar -, e sim como um pátio destinado a estacionamento de veículos automotivos, fica exatamente definido; um pátio destinado a veículos que eventualmente serve para abrigar eventos. Diga-se de passagem que, no material de divulgação do evento Festival Multicultural de Abreu e Lima, ocorrido dias atrás, foi como "pátio" e não como "praça" que o espaço foi divulgado.
Semanas antes do tal Festival Multicultural acontecer, a Prefeitura Municipal de Abreu e Lima pôs em ação algumas modificações na Praça Antônio Vitalino: nos postes de iluminação pública existentes na área foram afixadas placas com dois diferentes informes: 1) "Atenção. Área para carga e descarga. Permanência máxima de 30 minutos. Sujeito a multa e reboque"; 2) "Atenção. Proibido estacionar caminhões, ônibus e veículos pesados. Sujeito a multa e reboque". Já na entrada do "pátio", querendo, quem sabe, dar ares de "praça" ao local, a Municipalidade fez uma maquiagem, uma cosmetização com calçamento intertravado - o mesmo que está sendo utilizado ao longo dos canteiros centrais e das faixas da BR 101 no trecho batizado de Av. Brasil, que corre paralelo à faixa nomeada de Av. Duque de Caxias - e uns bancos de concreto e zero árvore para fazer uma sombra mínima que seja naquele lugar inteiramente entregue à impiedade do sol.
Desde que da Praça Antônio Vitalino foi subtraída a grande e muito concorrida feira livre que a tomava quase que completamente, os que a frequentavam vêm observando como sucessivas administrações do executivo municipal abreulimense têm procurado apagar por completo parte das memórias urbana e social da cidade. Desapareceu a feira livre. Desapareceu o Mercado Público com todos os pequenos estabelecimentos que o rodeavam. E desapareceram todos os costumes, todas as tradições, todas as conversas, todos os encontros e todas as vivências que faziam da Praça Antônio Vitalino o pedaço de chão mais procurado de Abreu e Lima. E tudo isso desapareceu para abrir vaga de estacionamento de veículos automotivos.
Abreu e Lima é, infelizmente, uma cidade cujo espaço de ocupação urbana mais antigo foi completamente subjugado pelas demandas e exigências da BR 101 e do tráfego de automóveis.
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