8 de junho de 2024

A Praça da Democracia de Abreu e Lima

   Por Sierra

 

 

Fotos: Arquivo do Autor
A agora denominada Praça da Democracia, de Abreu e Lima: espaço público que testemunhou um dos capítulos mais importantes da História recente deste país

 As cidades, todas elas, são compostas por pequenos mundos, por verdadeiros microcosmos detentores de memórias; memórias essas que nem sempre são de conhecimento da maior parte de seus habitantes, porque, no mais das vezes, ocorre que esses pequenos mundos e esses microcosmos nem sempre se comunicam entre si, não se interligam, de modo que, embora as cidades sejam constituídas por várias memórias locais, como uma verdadeira colcha de retalhos de acontecimentos, isso não significa dizer que essa colcha esteja ao alcance de todos os indivíduos que nelas residam.

O conceito de memória que eu estou inserindo aqui diz respeito aos fatos que de alguma forma deixaram vestígios e esses vestígios foram de alguma maneira preservados, quer como documentos textuais, quer como objetos, quer como espaços construídos e/ou apenas delimitados, quer como filmagem e/ou só captação de som, quer, enfim, até mesmo e apenas como uma tradição oral, que foi passando de geração em geração.


Torçamos para que a população cuide bem desse  equipamento urbano recentemente revitalizado







Foi pensando em tal conceito de memória que, na sexta-feira da semana passada, eu fui até a Praça da Bandeira, em Abreu e Lima, cidade da Região Metropolitana do Recife que, na década de 1980, teve um grande naco de seu centro urbano posto abaixo para que mais faixas da BR 101 fossem abertas. É curioso que pouco se trate disso neste país: a situação por que algumas cidades têm de conviver com uma BR passando pelo seu centro urbano, em vez de ser pelas suas franjas, pelos seus terrenos afastados das áreas centrais.

Pois bem. Eu soubera que a tal Praça da Bandeira passara por uma ação revitalizadora; e, como eu estivera lá noutra ocasião e a encontrara em estado de abandono, eu resolvi ir conferir o que fora feito a fim de escrever outro artigo para este blog.

Pouca gente sabe que a Praça da Bandeira, uma pequena praça, na verdade, é considerada como o local onde, pela primeira vez em todo o país, ocorreu uma manifestação pública reivindicando que o povo pudesse voltar a comparecer às urnas e votar para eleger o presidente da República, porque vivia-se sob uma ditadura militar desde 1964. Não existem documentos físicos da época - registros textuais, fotografias, etc. - que sirvam como , digamos, atestados fidedignos de tal fato aconteceu. Mas existem testemunhas oculares; alguns dos cidadãos que tomaram parte no evento como protagonistas ainda estão vivos; e isso também é importante, isso também é um marco. Reginaldo Silva, Severino Farias, Antônio Amaro, José da Silva Brito, vereadores na ocasião, e Aguinaldo Fenelon, suplente de vereador, estiveram naquele lugar em 31 de março de 1983 para fazer História.


Placa informando sobre o acontecimento havido em 1983


Detalhe da escultura de autoria de Demétrio Albuquerque: a meu ver ela ficou com informações demais; e informações que não dizem propriamente respeito ao evento de 1983. Ela ficaria muito bem colocada num museu da cidade ou na sede da Prefeitura Municipal




Como eu lhes disse, eu estivera naquele equipamento urbano noutra ocasião; e encontrando-o abandonado, lamentei muitíssimo que a Prefeitura Municipal de Abreu e Lima deixasse que a Praça da Bandeira amargasse uma situação tão precária independentemente de ela ser ou não um lugar de marco histórico da cidade - vocês podem ler o artigo "A Praça da Bandeira, em Abreu e Lima (PE), como um dos marcos germinais da Campanha pelas Diretas Já!" publicado também neste blog.

Foi preciso o acontecimento de duas efemérides - a lembrança dos 40 anos do início daquela Campanha e dos 60 anos da decretação da Ditadura Militar - para que a Municipalidade abreulimense finalmente se movimentasse para revitalizar a praça, que, conforme a placa instalada no local para assinalar a sua reinauguração, ocorrida no último dia 31 de março, passou a ser denominada de Praça da Democracia.

Claro que a recuperação da outrora Praça da Bandeira deve ser louvada. Contudo, entretanto e todavia um olhar aguçado sobre o que foi feito ali revela que a restauração e/ou revitalização teve alguns erros e acertos, segundo a minha avaliação. 


Nesta e nas duas fotos seguintes detalhes do revestimento da pista de caminhada: está evidente que o material ou foi mal aplicado ou é de baixa qualidade ou ambas as coisas






Que eu me lembre - eu nasci em Abreu e Lima; e estudei numa escola que ladeia o espaço - aquela diminuta praça nunca gozou de grande prestígio. A reforma de agora, que teve o mérito de celebrá-la por causa daquele acontecimento histórico, promoveu algumas modificações em seu desenho: inseriram rampas para cadeirantes; mastros para bandeiras; uma pistazinha de caminhada - ao que parece o material com o qual a revestiram é de qualidade ruim, porque já está se soltando; e eu registrei um trecho coberto com lona plástica preta -; uma escultura autoria do renomado Demétrio Albuquerque - eu, que aprecio muito as esculturas desse artista, avaliei que a que ele fez para a Praça da Democracia ficou com informação demais, tem muita coisa ali; para mim ela não ficou artisticamente interessante para aquele ambiente; a minha opinião é que esculturas que retratassem os indivíduos que estiveram ali em 1983 ficariam adequadas e condizentes com o ocorrido -; uma placa dizendo daquele fato histórico; e um espaço que pode servir como palco para apresentações artísticas e/ou de outra natureza. Gente, outro senão: para que o exagero de vinte lixeiras num espaço tão diminuto? Além de a quantidade de lixeiras postas ali ter ficado esteticamente feio, minha opinião é que nos espaços ocupados por algumas delas deveriam ter plantado flores, isso sim. Ah, gente tem mais um ponto positivo para a Municipalidade: foi posta uma placa na faixa da BR 101 denominada Avenida Duque de Caxias indicando a direção da localização da praça.

Espero que a agora denominada Praça da Democracia, de Abreu e Lima, comece a figurar de alguma maneira na memória de um número maior de moradores da minha cidade natal. 

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