31 de agosto de 2024

À sombra de ruínas

 Por Sierra

Fotos: Arquivo do Autor
Enfeando a paisagem, o prédio abandonado do Hotel Caravela é uma espécie de anticartão-postal da Ilha de Itamaracá; é um símbolo e um retrato da perda de prestígio que essa ilha-cidade hoje goza como destino turístico

Faz pelo menos vinte e cinco anos que a Ilha de Itamaracá, uma ilha-cidade ou uma cidade-ilha que integra a Região Metropolitana do Recife, começou a perder o prestígio e principiou a deixar de ocupar um lugar de grande destaque como um dos principais destinos turísticos de Pernambuco. Como se tivesse sido algo programado, a Ilha de Itamaracá foi deixando de ser um balneário muito badalado e procurado para ser visto quase que somente como uma cidade que cresce de maneira desordenada ao mesmo tempo em que assiste à sua outrora tão propalada vocação turística ser suplantada pelos muitos problemas e deficiências de cunho urbanístico que ela encerra.

Dias atrás, conversando com um nativo da ilha chamado Augusto Cruz, de 51 anos de idade, ouvi dele um rosário de lamentos pela perda de brilho e de prestígio que o lugar vem vivenciando há quase três décadas. Com um semblante triste ele me falou de um tempo em que a ilha fervia de visitantes no verão e de como no entorno do Hotel Caravela, situado na Rua Antônio Morais Cavalcante, no bairro do Pilar, bairro esse onde se encontram a igreja matriz e os órgãos da administração da ilha-cidade e boa parte dos seus estabelecimentos comerciais, a agitação com a presença de turistas animava aquele espaço.



Fui eu que coloquei o assunto Hotel Caravela na conversa com o nativo, dizendo que o prédio abandonado e em ruínas - uma face dele é voltada para aquela rua e outra para o mar - é, talvez, o maior símbolo da decadência da Ilha de Itamaracá como destino turístico. E hoje, quando eu fui fotografar o prédio, um sentimento de passado perdido me chegou; e eu fiquei a me perguntar:  "Por que será que aquelas ruínas continuam ali enfeando a paisagem ao mesmo tempo em que se posta como um retrato do descaso da Municipalidade para com o cenário daquele logradouro e do próprio trecho de praia onde está situada a edificação - não sei se por ironia, próximo ao prédio abandonado existe uma Pousada Ruínas do Pilar -?

Quem mora na Ilha de Itamaracá, como é o meu caso, sabe que vários empreendimentos hoteleiros fecharam suas portas ali os últimos vinte e cinco anos; período esse em que, gradativamente, contando com o impulso e estímulo do Governo do estado, cidades do litoral sul pernambucano, como Tamandaré e Ipojuca, viram suas praias ganharem visibilidade nacional e, na esteira disso, elas começaram a receber também muitos investimentos da iniciativa privada, que ali ergueu hotéis, pousadas, restaurantes e condomínios residenciais e mesmo casas isoladas de alto padrão.






Enquanto o litoral sul pernambucano foi seguindo em escala crescente como balneário muito procurado e valorizado, o oposto foi verificado na Ilha de Itamaracá. Na cidade-ilha, ao longo desses vinte e cinco anos foram vistos pouquíssimos casos de empreendimentos de alto padrão, enquanto, por outro lado, proliferaram as construções desordenadas e as invasões de áreas de mata nativa e de mangues - a ocupação do entorno do Centro de Mamíferos Aquáticos, por exemplo, é uma dessas aberrações que você olha e não acredita e não sabe por que o poder público permite que aquilo permaneça ali.

Ainda hoje, no táxi que eu tomei no Pilar, o seu condutor me disse que a ilha-cidade nunca irá se desenvolver enquanto não chegar a Prefeitura alguém que se esforce para, realmente, transformar para melhor o lugar. E citou as obras abandonadas de uma creche e de uma escola como exemplos, como mais um exemplo, da falta de comprometimento dos últimos prefeitos para promover o desenvolvimento da cidade-ilha. E, enquanto seguíamos, ele apontou aqui e ali construções que foram erguidas por pessoas que invadiram terrenos à vista de todos e de cada um que passam pela chamada Estrada do Forte Orange, ao que eu comentei: "As invasões de terrenos são os negócios que mais crescem aqui. E esse pessoal, além de invadir, não paga nem água e nem luz. E são pessoas que, no geral, possuem casas noutros lugares da ilha e em outras cidades, não são pobres coitadas vítimas da exclusão social".










A imagem do prédio em ruínas do outrora famoso Hotel Caravela está ali, no Pilar, figurando como uma espécie de anticartão-postal, como um retrato carcomido de um passado glorioso, retrato de um tempo em que a Ilha de Itamaracá era tida por muitos como uma espécie de paraíso na terra.

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