26 de novembro de 2010

Personas urbanas (1)

Por Clênio Sierra de Alcântara

"A cidade está tão fora
E você se ocupa dessas coisas
Vive me mandando embora
Pensando que eu sou outra pessoa
O meu beijo é diferente
Acho que você não sente
Mas posso facilitar tudo
Você querendo mesmo eu me mudo
Saio de cabeça ao pé
Deixo tudo como é
Se você não consegue ver a possibilidade de outro
Azar de você".

                                             A Cidade de Outro. Klébi Nori


                                                                                          A Josenildo Ferreira




Dignidade. Quando digo que o meu círculo de amizades não engloba mais do que uma dúzia de indivíduos, não estou utilizando uma imagem. O transcorrer dos anos não me tornou uma pessoa seletiva na escolha de amigos. O que de verdade ocorreu foi que fui naturalmente me afastando das pessoas sem me dar conta disso. É claro que eu sinto por vezes a falta de algumas delas - e elas de mim -; e, por isso, nos comunicamos via telefone. Constantemente algumas me pedem para participar de uma dessas redes sociais da internet; mas eu não tenho interesse nenhum nisso. Nenhum. O máximo que me permito é trocar um ou outro e-mail. E só. Felizmente eu não me tornei um refém da internet.

Embora não pareça - porque pelo que foi dito até aqui parece que sou uma daquelas criaturas sombrias e antissociais; de fato eu sou uma pessoa triste, como já disse noutro lugar; mas sou alguém em permanente busca da alegria, o que é muito bom, não é? - eu gosto de ver e de estar no meio de gente. Gosto de viajar, de ir a museus, a cinemas, a exposições de arte, a conferências, enfim, eu gosto desse contato humano. Eu gosto, sobretudo, de estar em lugares anonimamente. É isso: talvez seja por esse gosto que eu tenha desaprendido a manejar e cultivar amizades.

É um fato, também, que eu tenho verdadeira ojeriza a relações de dependência. Detesto aquele tipo de pessoa que me cobra atenção; que fica cabisbaixa porque não lhe telefonei no dia do seu aniversário; que se sente desprezada porque eu contei algo primeiro a outrem e não a ela... É muito chato isso, para dizer o mínimo. Ah, tudo bem, eu li O pequeno príncipe, do Antoine de Saint-Exupéry, mas eu não consigo me sentir eternamente responsável por aquilo que porventura eu tenha cativado.

Não compreendo, por exemplo, como a maioria das pessoas - bem, eu creio que seja a maioria - associa o sexo ao amor, a um sentimento sublime. Para mim essa vinculação é bastante descabida. Para mim o sexo é algo inteiramente desprovido de qualquer beleza; e tão animalesco; e tão breve. Não consigo romantizar a prática sexual.

Talvez muito mais do que o sexo, aquilo de que mais gosto é de estar apaixonado. Ah, quanta loucura eu já fiz por estar apaixonado! Embora eu não sofra tanto quando me apaixono por alguém que não me corresponde, eu compreendo a ideia  dos que dizem que ser desprezado pela pessoa pela qual se sente esse sentimento incontrolável é uma das piores dores da existência.

Contudo, minhas loucuras passionais nunca me impuseram a lei da submissão. Não consigo me manter ligado a alguém que despreza meu sentimento e a atenção que lhe oferto. Longe de mim aceitar a possibilidade de me ver como que mendigando a aproximação dessa pessoa, num estar-se preso por vontade a um pensamento mágico de que, mais cedo ou mais tarde, a criatura vai me redimir. Ora, se alguém sabe que você a deseja ardentemente e, no entanto, não lhe dá a mínima, ou, então, se aproxima apenas com interesses outros que não o sentimental - ou mesmo apenas buscando sexo, porque, às vezes, a atração ardente não passa de um forte desejo sexual -, das duas uma: ou você é um grande masoquista do tipo que permite que brinquem com seus sentimentos; ou você tem um problema muito sério de autoestima.

Assim como o poeta Waly Salomão, "eu pertenço à raça da pedra dura". Deve ser por isso que por vezes eu me sinta só, mesmo quando estou com a melhor das companhias.

Um comentário:

  1. Há, adorável Sierra!
    Sempre correto nas suas afirmações, te conheci vagando por entre às ignorâncias, rodeado por mentes vazias e mesmo assim parecendo estar convicto de suas razões sociais ou pela imposta condição social.
    Tu és irresistivelmente singular.
    Nem eu mesmo te entendo e seria leviano pois tu és esfinge.
    Uma deliciosa malícia! Único. Um átomo vagando! Indecifrável!
    Lembras algumas brincadeiras infantes?
    As saborosas e torturantes brincadeiras infantis, quase masoquistas ou seriam sadomasoquistas?
    Acho que foi aí, que me perdi, na minha infância! Imploro perdão ao que não fui! Arrasto-me por um lamaçal chamado: desejo e paixão!
    Absolva-me amigo!
    E se caso isso não ocorra, nesse tribunal virtual, por favor faça-me mais um favor, o último: não pare de escrever, pois suas palavras são como perder a razão diante de um copo de cachaça, primeiro o desejo, depois o torpor e ao final uma ressaca.
    Sim, uma ressaca e seca!
    Seca como a verdade... e os motivos, talvez estejam escondidos no passado.
    Ironicamente, tenho motivos para escrever de novo!

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