21 de agosto de 2012

Operação padrão


Por Clênio Sierra de Alcântara


Alguém já disse que o Brasil é o país do absurdo. Também já se disse que é o país do futebol, do jeitinho, da malandragem, da jabuticaba, da saúva e até o país do futuro, imaginem. Continuo a pensar que este é o país do passado.  Do atraso. Do retrocesso. E não pensem que se trata de ranço pessimista de minha parte. A questão é que as coisas retrógradas, as coisas ruins do passado deste país permanecem tão vivamente vigorosas no presente que em mim embaçam a espetaculosa projeção de futuro que ultimamente alguns têm buscado difundir com relação a ele de maneira por vezes tão falaciosa, para não dizer desonesta.

Não compartilho desse pensamentozinho ingênuo, dessa irracionalidade coletiva que quer a todos fazer crer que o Brasil entrou finalmente nos eixos e que “agora a coisa vai”. “Ah, mas agora os brasileiros estão comprando carros como nunca”. Sim, mas para rodarem em estradas esburacadas, para abarrotarem as ruas de cidades desordenadas? “Ah, mas agora os brasileiros estão tendo acesso fácil ao crédito”. Sim, mas para contraírem dívidas que não conseguem saldar, para financiarem compras que não conseguem quitar? “Ah, mas agora os brasileirinhos estão quase todos nas escolas”. Sim, mas em escolas sucateadas onde pouco aprendem e das quais muitos saem analfabetos funcionais?

Há alguns meses o país Brasil foi tomado por um tsunami de greves de funcionários federais, que puseram suas pautas de reivindicações na mesa do Palácio do Planalto e foram olimpicamente ignorados. É curioso, para dizer o mínimo, como um partido, o PT, que nasceu nos movimentos grevistas consegue ser tão intransigente para com sua matéria formadora. Concordo que algumas categorias querem demais, mas, é correto ignorar completamente suas demandas?

Este texto está parecendo um samba do crioulo doido, não está? Vamos ver se doravante ele se endireita.

Como se tomassem a todos nós como seres desprovidos de raciocínio, algumas categorias do tsunami grevista resolveram protestar com um contra-senso, o que me fez encontrar – perdoem a minha pretensão – a raiz do atraso deste país. Fiquei a imaginar um líder sindical empunhando um microfone e dizendo, em alto e bom som, para os seus companheiros de lutas: “Não cruzemos os braços. Vamos fazer o que nunca fazemos, que é trabalhar seguindo todas as normas, todos os protocolos de segurança, todas as diretrizes exigidas”. Imaginei esse mesmo líder carismático sendo aplaudido com o maior dos entusiasmos. E ei-los prontos para a  luta. E eis que foi instituída a denominada “operação padrão”.

Só mesmo num país onde as normas não são seguidas em sua inteireza, onde os mais recomendados procedimentos para o alcance de efetiva produtividade são deixados de lado, pode-se protestar seguindo o que deveria ser sempre seguido. Ora, quando um sujeito diz que, a partir de hoje, ele vai examinar, ele vai inspecionar, ele vai investigar, ele vai exigir, ele vai conferir, ele vai aferir “seguindo as normas”, eu só posso pensar que, em dias comuns, quando assim é que deveria ser, ele não examina bem, ele não inspeciona corretamente, ele não investiga seriamente, ele não exige de fato, ele não confere de verdade, ele não afere coisa alguma.

A “operação padrão” é um espelho às avessas. A dimensão da falta de compreensão da realidade que tem a maioria dos brasileiros é perturbadora.  Ah, e quanto a nós que pensamos pensar sobre todas essas coisas? Ora, nós que nos brinquemos, como diria Macunaíma, o herói sem nenhum caráter.

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