10 de janeiro de 2013

A Rua da Roda fica logo ali

Por Clênio Sierra de Alcântara




                                                                                   Para Isabel Oliveira
                                                   e para Ariana Coutinho, que aniversaria hoje




Fotos: Ernani Neves
Concentrado em sua leitura, o poeta Mauro Mota, esculturado pelo artista plástico Demétrio Albuquerque, é presença marcante na fervilhante Rua da Roda



Sou dos que defendem a ideia de que, todo e qualquer guia turístico que se preze, deveria trazer, também, os endereços das livrarias e dos sebos existentes na cidade, porque, creio eu, assim como os monumentos que marcam o território citadino, as livrarias e os sebos podem dizer muito dos lugares que os abrigam.



Em primeiro plano a Av. Guararapes e, ao fundo, já o começo da Rua da Roda


Foi no Recife que eu conheci os primeiros sebos e as primeiras livrarias. Na cidade onde nasci, parece que eles nunca existiram. Muito mais do que de farmácias – o leitor já observou como é crescente e dinâmico o surgimento desses empreendimentos comerciais? Farmácias e drogarias vêm proliferando nas cidades brasileiras numa velocidade que talvez só seja menor do que a da multiplicação de igrejas neopentecostais: naquelas o povo automedica-se; nestas, ele se deixa medicar -, talvez, seja de livrarias, sebos e bibliotecas que as pessoas precisam. O fato de este país possuir um contingente absurdo daquilo que os especialistas classificam como “analfabetos funcionais”, parece confirmar a minha assertiva.







Gosto de livros. Gosto de estar entre livros. Gosto de pensar em livros. Gosto de adquirir livros. Gosto de preparar livros. Gosto de manusear livros. Gosto de desejar livros. Gosto de ganhar livros. Gosto de arrumar livros. Gosto de descobrir livros. Gosto de falar de livros. Gosto, sobretudo, de ler livros.

Desde que fui contaminado pelo vírus da leitura, não há um dia sequer que eu passe sem ler nem que seja um parágrafo, uma linha, uma chamada, uma nota, porque já sofri horrores só por ter ouvido o relato de uma crise de abstinência e não quero vivenciar isso de jeito nenhum. E a inoculação viral me tornou tão completamente dependente dos livros que, por vezes, eu saio a percorrer os sebos e livrarias – até mesmo nos endereços virtuais – de todas as cidades que vou conhecendo em minhas andanças. De tanto ler, dizem alguns dos meus conhecidos, eu vou acabar enlouquecendo. Eu tenho certeza que enlouqueci faz tempo. E eu prefiro mil vezes mil vezes a loucura ilustrada a uma lucidez ignara.














No dia em que se fizer a história da Rua da Roda – aqui vai um excerto da narrativa do livro Recife do Corpo Santo, de Vanildo Bezerra Cavalcanti (Recife: Prefeitura Municipal do Recife, 1977, p. 207-208) sobre ela: “Da Rua Conselheiro Peretti – crisma da primitiva Rua da Roda – ainda resta o seu primeiro trecho com esse antigo nome restaurado, que lhe foi dado por nela está localizado o oitão da Casa dos Expostos e onde funcionava a ‘Roda’, solução estatal daquele tempo para resolver o insolúvel problema social, que continua desafiando, não só a nossa cidade, como o mundo, o do ‘menor abandonado’” -, situada no bairro de Santo Antônio, área central do Recife - para que o leitor curioso que queira ir conhecê-la não encontre dificuldade para encontrá-la, eis uma referência básica: essa rua fica por trás do Banco do Brasil da Av. Guararapes -, irá se contar que ela abriga, além de alguns bares bastante frequentados, o chamado Pátio do Sebo, que reúne, num quase semicírculo, vários boxes que comercializam livros novos e usados, com vendedores que atendem, entre outros, pelo nome de Carlos, Marcelo e Augusto. Dir-se-á, certamente, que, a despeito de receber diariamente uma quantidade enorme de gente – muitíssimo mais nos bares do que nos sebos -, essa artéria recifense encontra-se, nos dias de hoje, esburacada – as pedras portuguesas foram arrancadas aqui e ali -, suja e completamente abandonada pela Municipalidade, a exemplo de inúmeras outras artérias da capital pernambucana.




















O Pátio do Sebo é separado dos bares por uma grade cujos portões são fechados quando os boxes encerram o horário de atendimento. Talvez por conta desse isolamento proporcionado pela estrutura de ferro, o pavimento do pátio não tenha experimentado o grau de degradação que se verifica noutros segmentos da Rua da Roda; é de se crer que a grade igualmente impediu a ação de vândalos no trato com os bancos – ainda assim eles precisam ser recuperados – e com as árvores que ali se encontram.





Sentado num desses bancos, mergulhado numa concentração admirável, Mauro Mota lê o seu jornal, ignorando o barulho proveniente dos bares, e como que convidando o passante a sentar-se ali, junto dele, e gozar desse prazer imenso que é proporcionado pela leitura.










Conclamemos as autoridades municipais para que a Rua da Roda seja revitalizada o quanto antes. As políticas públicas de uma Prefeitura não devem se concentrar em absoluto nas deficiências de seu tráfego de veículos, porque os problemas da cidade como um todo são inúmeros e urge que eles sejam conjuntamente solucionados.


2 comentários:

  1. Você sabe me informar quem é o homem da escultura?
    Desde já agradeço pela atenção.

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  2. Muito bom dia! Está dito no texto e eu acrescentei na legenda da foto: é o poeta Mauro Mota

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