27 de outubro de 2017

Personas urbanas (15)

Por Clênio Sierra de Alcântara


Seu mal é comentar o passado
Ninguém precisa saber

O que houve entre nós dois
O peixe é pro fundo das redes
Segredo é pra quatro paredes
Não deixe que males pequeninos
Venham transformar os nossos destinos
                                                             Segredo. Herivelto Martins/Marino Pinto



Guardar segredo. Segredos que são guardados a sete chaves nem sempre estão completamente protegidos das vicissitudes que, por vezes, os trazem à tona à revelia de quem envidou todos os esforços para mantê-los inacessíveis. Talvez seja da natureza mesma dos segredos a inquietação por querer se revelar, por querer dizer de si, por querer falar, por querer fazer saber da sua existência. Daí por que guardar segredo não é uma tarefa das mais fáceis de ser executada por quem quer que seja.

Dentro dos nossos círculos de relações – e eu nem falo aqui necessariamente apenas de relações amorosas e/ou de amizade: quantas vezes você, leitor, assim como eu, já não disse e falou para alguém que só viu apenas em uma única ocasião, sobre fatos de sua vida tidos como íntimos no sentido de serem do conhecimento de poucas pessoas ou mesmo de ninguém mais até então? – comumente fazemos revelações sobre nós ou com relação a outrem e pedimos ao interlocutor que guarde segredo a respeito do que lhe foi dito e outras vezes não, porque julgamos nem ser necessário. Ocorre também a situação de que nosso interlocutor tome como confissão a ser guardada longe, bem longe de outros ouvidos, algo que, em que pese o seu teor íntimo e revelador, dizemos com a maior naturalidade e abertamente para quem queira ouvir, porque aquilo não significa para nós matéria que mereça e/ou precise ser ocultada; isso se dá pelo simples fato de que o que eu ou você trata como assunto banal pode ser considerado pela pessoa com quem dialogamos, um tema espinhoso, com o qual ela não saiba tratar, seja por medo, vergonha, crenças e até por falta de esclarecimento.

Não é raro que encontremos pessoas que não estão dispostas a falar de si e só se disponham a nos ouvir. Não sou do tipo que espera reciprocidade do interlocutor no tocante a isso; não é porque durante um encontro ou num telefonema ou ainda numa troca de mensagens de texto ou de áudio eu disse isso e aquilo de mim e fiz um resumo da minha vida, que eu espero que a criatura que me foi toda ouvidos faça o mesmo. Não, de jeito nenhum. Cada um tem sua necessidade de falar ou de nada dizer, de se manter em completo silêncio, porque, para muitas pessoas, o caminho da busca pelo autoentendimento reside mesmo nesse processo de ouvir o que o outro tem a dizer para que daí, quem sabe, elas possam encontrar as respostas para as dúvidas e inquietações que carregam consigo.

Por mais extrovertido e liberto de certas paranoias ditas autoprotetoras que alguém possa ser, acredito que essa pessoa guarda dentro de si um ou mais segredos sobre ela mesma que nunca irá revelar. E por vezes nem se trata de algo medonho, criminoso ou abjeto; pode ser uma mínima coisa que a pessoa compreende como sendo digna de permanecer guardadinha numa das gavetas do pensamento.

Àqueles que pensam que estão guardando um segredo ao contá-lo ao seu “melhor amigo”, um conhecido meu tem a dizer o seguinte: o negócio facilmente se espalha porque o indivíduo que ouviu a confissão irá repassá-la para um outro seu “melhor amigo” e a corrente vai seguindo ininterruptamente, de maneira que o que era para ser um segredo resultará em conhecimento de meio mundo. Sendo assim, se você está mesmo disposto a guardar um segredo que lhe foi contado, não o compartilhe com o seu “melhor amigo”, como eu costumava fazer. Guarde-o consigo e pronto, porque relações de plena confiança também estão baseadas nesse tipo de atitude.


Caso você se julgue incapaz de guardar um segredo, sinceramente, diga a seu interlocutor que não se presta para ser um “cofre de confissões” e que tem uma cabeça muito fraca para lidar com isso. Digo assim porque, para mim, poucas coisas são tão indesculpáveis quanto o fato de alguém sair por aí falando para um e outro sobre algo que lhe foi dito em tom confidencial. Temos que ter discernimento, como diz um amigo meu, que existem pessoas que não merecem e/ou não se prestam para assumir papel de confessores. Nessa circunstância a prudência manda dizer que o mais adequado a fazer é se calar.

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