Por Clênio Sierra de Alcântara
Não consigo aceitar de todo e
nem me submeto a certos tipos de comportamento que julgo inapropriados para
mim. “Ah, Sierra, mas a etiqueta manda fazer assim e assado”. Então, que se contrarie
e se reveja a etiqueta. Onde já se viu a pessoa se manter refém de algo que lei
nenhuma estabeleceu e que uns e outros por convenção e/ou comportamento de
manada, se põe a seguir?! Comigo não, violão. É porque não dá mesmo.
Relutei o quanto pude para
não adentrar nos domínios dessa entidade multicéfala chamada WhatsApp. Ocorre que, desde que eu
resolvi ter um telefone celular, escolhi como fornecedora de serviços a
operadora Oi, que, no dizer muito certeiro e apropriado do meu amigo Adelbar
Lima, “é a pior empresa de telefonia do mundo”. De modo que, na ilha onde eu
moro, o serviço oferecido por essa empresa, de uns tempos para cá, só fez
piorar; e piorou de tal maneira que, por vezes, meu celular, mesmo que posto no
terraço de minha casa, passava – e passa – dias inteiros sem conseguir captar
sinal. Sabe o que eu fiz para não me ver completamente isolado do mundo? Em vez
de pesquisar e me tornar cliente de uma operadora de telefonia verdadeiramente
eficiente, eu contratei os serviços de uma empresa de internet e instalei wi-fi
na minha humilde residência. E para usufruir e fazer uso do telefone para
efetuar ligações, comprei um smartphone
e, em janeiro passado, iniciei uma jornada no universo do famigerado WhatsApp, que também atende pelo vulgo
zap.
Não posso negar que o meu
problema de falta de comunicação via telefone se resolveu: eu saí do quase
total isolamento. Por outro lado, não demorou para que eu me desse conta de que
adentrara em um terreno muito, muito movediço e repleto de pessoas dadas a fazerem
e/ou quererem fazer de mim um estúpido, um idiotão do tipo Débi e Lóide, sabem?
E o pior não foi a minha quase que inteira inadequação ao danado do zap. O pior
mesmo foi ter de aturar – e às vezes me deixar levar pelas sandices – o comportamento
bobalhão – constatei que algumas pessoas, em realidade, sérias, ficaram
bastante soltinhas e porraloucas no ambiente virtual – de certos indivíduos
pelos quais eu nutro alguma estima e carinho.
Pouco adiantou o esforço –
ainda que mínimo – que eu fiz para tentar me adequar ao dito ambiente. É uma
grande verdade: não adianta tentar se enganar e nem se fingir de morto; as
pessoas são o que são e pronto, estejam elas no mundo real e/ou virtual. Bisonho,
eu fui tateando com dificuldade naquele lugar, descobrindo ferramentas e seus
usos. E logo vieram as cobranças por atenção, as aporrinhações e as encheções
de saco acompanhadas por uma miríade de “bom dia!” e “boa noite!”. A coisa
principiou assim. E, em seguida, começaram a chegar os vídeos pornográficos, as
correntes, as piadas sem graça, as notícias falsas e por aí vai. Depois, meu
caro leitor, eu passei a ser alvo de cobranças por não ter comentado o que
recebi, por não ter respondido o “bom dia!” e o “boa noite!” e seguem-se os
demais.
É claro que o meu ser
bronco, a minha impaciência e a minha língua – e escrita – ferina eram e
continuam sendo inadequados para lidar e interagir com esse tipo de gente. Mas o
que fazer? Como reagir e sobreviver naquele ambiente? Por que essas pessoas
agem assim, pensando que a vida é uma futilidade só e que todo e qualquer
indivíduo que utiliza o zap tem que estar sempre a fim de bate-papo e de
conversa mole, sem ter o que é realmente importante para fazer e como se cada
uma delas fosse o nosso único contato naquele espaço? Esses eram – e continuam
sendo – alguns dos questionamentos que eu me fazia enquanto transcorria o meu
tempo de adaptação àquele território.
Sabem vocês o que uma das
criaturas que lá se encontrava me disse pouco depois de eu ter adentrado ali? “Bem-vindo
ao inferno das redes sociais!”. Ela escreveu isso depois de eu reclamar – vejam
vocês que eu ainda tentei ser gentil e contornar a situação – do fato de todos
os dias ela me enviar mensagens perguntando “como vai?” e isso e aquilo. Pelo desaforo
eu não pensei duas vezes: acionei o dispositivo e bloqueei o insolente. E desde
esse dia em que eu cometi o meu primeiro bloqueiocídio no WhatsApp, não consegui mais parar. Gostei da coisa, entendem? Eu não
sei, eu não consigo explicar a sensação de prazer que me toma quando eu saco do
meu celular, miro a vítima e ajo para que ela desapareça para sempre da minha
tela. É realmente uma sensação in-des-cri-tí-vel. Só quem já cometeu
bloqueiocídio pode compreender com exatidão o que eu estou dizendo.
Eis a narrativa que antecedeu
a mais recente eliminação, ocorrida na última terça-feira:
João Pedro: - Rapaz, não
faça mais isso.
Eu não sabia do que se
tratava.
Eu: - Isso o quê?!
João Pedro: - Dias atrás eu
perguntei como você estava e você não me respondeu.
Eu: - Foi? Eu não me lembro
de ter visto isso, não.
João Pedro: - Viu sim,
porque as barras ficaram azuis, indicando que você leu o que eu escrevi.
Li isso estando já de ovo
virado, como se diz por aqui. E disparei:
Eu: - Escuta, cara, tu
pensas que eu tenho obrigação de responder a tudo o que eu recebo no zap, é?
João Pedro: - Eu perguntei
como você estava. Você foi mal-educado.
Eu: - Tá bom. Eu sou mesmo
mal-educado.
João Pedro ainda chegou a
escrever que eu o estava agredindo; e que “não sabe o que está acontecendo com
as pessoas”. Presumo que pelo menos nesse quesito eu sei “o que está
acontecendo com as pessoas”: gente que antes do advento do WhatsApp raramente telefonava para alguém porque não queria gastar
e/ou não tinha créditos para tanto, de uma hora para outra, dado o baixo custo
do WhatsApp e/ou pegando arrego no wi-fi alheio, passou a se arvorar de ser
a pessoa mais simpática e atenciosa do mundo; e a querer ser a sua best friend. Eu aguento um negócio desses?
É claro que não. E por isso foi que eu prontamente fui lá e play, apertei o comando e bloqueei o
João Pedro, assim como já fizera com mais outros três chatonildos. Foi menos um
que não irá mais me atazanar e cobrar de mim bons modos, candura e paciência. Foi
mais um que terá de buscar outra pessoa bem diferente de mim a fim de manter a
sua zapdependência. Para alguém que, como eu, diz não tetê-à-tête com uma comovente naturalidade, fazer uso de um
dispositivo de bloqueio de contatos é um procedimento igualmente indolor e que,
pelo menos em mim, não deixa nenhuma cicatriz.
Devo-lhes dizer que eu era
feliz no meu tempo de “burro fone” e sabia. O diabo foi que eu resolvi querer
escapar da deficiente e precária operadora Oi comprando um smartphone e me lasquei. Perdi o meu sossego. E se eu não me ligar,
ele vai acabar é roubando ainda mais o meu precioso tempo. Desconfio que essa
gente zapdependente esteja me cercando e conspirando para que eu involua e me
emburreça.
Nenhum comentário:
Postar um comentário