16 de maio de 2020

Canalhas, canalhinhas e canalhões ou Como fazer dos interesses pessoais política de Estado

Por Clênio Sierra de Alcântara


Foto: Marcos Corrêa
Reunião ministerial ocorrida no dia 22 de abril de 2020.
O autoritarismo é deveras contagioso. Foi por isso que, do alto de minha pequenez e insignificância, eu decretei que, doravante, o 22 de abril também passará a ser o Dia do Canalha.

I

Nesta semana o grande assunto que dominou a crise política que se arrasta neste país concomitantemente à marcha irrefreável das mortes provocadas pela pandemia do coronavírus foi o vídeo da reunião ministerial ocorrida no dia 22 de abril. Muito embora o mencionado vídeo não tenha sido revelado ao grande público, comentários e notinhas soltas, aparecidas aqui e ali, já na terça-feira, davam conta do seu teor. Atribuiu-se ao senhor Jair Bolsonaro, presidente da República, esta declaração lapidar, reveladora de um comportamento de gente muito escrota que diz aos bandidos dos outros que a lei tem de ser dura; já para os deles, a coisa tem de ser diferente. Teria dito o nobre presidente no encontro: “Já tentei trocar gente da segurança nossa no Rio de Janeiro oficialmente e não consegui. Isso acabou. Eu não vou esperar f[oder] minha família toda de sacanagem, ou amigo meu, porque eu não posso trocar alguém da segurança da ponta de linha que pertence à estrutura. Vai trocar; se não puder trocar, troa o chefe dele, troca o ministro. E ponto final. Não estamos aqui para brincadeira”. Esta foi a transcrição feita pela Advocacia-geral da União (AGU) e entregue ao Supremo Tribunal Federal (STF) na quinta-feira, como indicativo de que o dito-cujo não estava, vejam vocês, se referindo à Polícia Federal, negando o que parece óbvio, basta ver o que ocorreu dois dias depois da fala autoritária: demissão do então diretor-geral daquela Corporação, Maurício Valeixo; e, na esteira da crise, o pedido de saída do governo oficializado pelo então ministro da Justiça e da Segurança Pública, Sergio Moro. Repito: o teor da maldita reunião, do verdadeiro pandemônio, como eu disse, começou a circular dias antes dessa transcrição feita pela AGU (Matheus Teixeira e Renato Onore. “’Não vou esperar f. minha família toda de sacanagem’, disse Bolsonaro em reunião, segundo AGU”. In Diario de Pernambuco: https://www.diariodepernambuco.com.br/noticia/politica/2020/05/nao-vou-esperar-f-minha-familia-toda-de-sacanagem-disse-bolsonaro.html. Publicado em 14 de maio de 2020. Acessado em 14 de maio de 2020).

Como já foi dito, ainda não chegou ao público geral todo o conteúdo da tal reunião; contudo, para mim, somente esta fala, se a reunião tivesse sido marcada tão só para o senhor Jair Bolsonaro dizer o que ele disse, isso é um certificado, um atestado mais do que claro do mandatário desta nação, de que o seu propalado discursinho de honestidade e austeridade não passa de conversa confiada, de mentira pura e simples para enganar idiotões e angariar apoio e simpatia. Além disso – e eu não posso deixar de mencionar aqui que, ainda naquela reunião, o ministreco da Deseducação Abraham Weintraub, teria dito que os ministros do STF deveriam ser presos; e que a “louca da goiabeira”, ministra Damares Alves, foi da opinião que governadores e prefeitos também deveriam ser presos por estarem mantendo o isolamento social contra o coronavírus -, o senhor Jair Bolsonaro, o impoluto, o honestíssimo presidente da República Antidemocrática Bolsonariana deixou superevidente que não mede e nem medirá esforços para fazer dos seus interesses pessoais política de Estado, porque, numa autocracia, como a que ele pretende que vigore neste país, o mandatário faz o que bem quer e entende à revelia da lei e sob o imperativo de sua vontade. Jair Bolsonaro é um animal político autoritário e desumano que age como se estivesse com toda a autoridade que existe e pudesse infringir e atropelar e ignorar e passar por cima das leis.

II

Parece inacreditável que nesta altura dos acontecimentos, em que o número de mortes provocadas pelo coronavírus atingiu a casa dos 15.000, tantas e tantas pessoas permaneçam ignorando as recomendações das autoridades da área da saúde para, na medida do possível, não saírem de suas casas e, caso precisarem sair, usarem máscaras. Já se recorreu ao fechamento de ruas e praças; já se estabeleceu a aplicação de multas a pessoas e a comerciantes que abrem estabelecimentos considerados não essenciais; já se fez saber que os hospitais estão à beira do colapso e, mesmo assim, o desrespeito às determinações continuam; e tem sido necessário, em muitas cidades, que guardas, policiais e bombeiros precisem agir para tentar coibir a livre circulação de pessoas e a abertura de certos comércios.

O senhor Jair Bolsonaro é em grande medida responsável por essa realidade de desobediência quase generalizada das pessoas, porque desde o início da pandemia até agora, as ações e as atitudes dele frente ao combate ao coronavírus tem sido de desdém e de minimização da gravidade da doença. E como ele tem muitos apoiadores, suas falas e o seu comportamento irresponsável são copiados e disseminados como o próprio vírus, gerando isso que temos visto, uma ampla contaminação da população e um elevado contingente de mortos.

É de se notar que a crítica ainda hoje em pauta que se fez e se faz aos telejornais da Rede Globo por estarem eles, segundo seus detratores, dando muita ênfase ao assunto e, por conseguinte, sendo contra o presidente e apavorando a população, a meu ver, caiu no vazio. Primeiro porque, caso estivessem mesmo amedrontando as pessoas, os telejornais da emissora mais assistida do país, teria conseguido convencê-las a respeitar as recomendações do Ministério da Saúde no que diz respeito à quarentena. Segundo, acusar a Rede Globo de ser contra o senhor Jair Bolsonaro é de uma obviedade tamanha, porque qualquer empresa e/ou pessoa de bom senso compreende que essa criatura abominável não está agindo corretamente no trato do combate à pandemia, muito pelo contrário. Os bolsonaristas seguem a cartilha do seu chefe-supremo porque, assim como ele, são escravos da ignorância; e, acredito que, tal qual Seu Jair, podem até não concordar exatamente com o que defendem, mas o fazem por pirraça e maldade.

III

Custa-me aceitar que pessoas de inteligência e competência profissional elevadas concordem em participar de um governo comandado por um sujeito tão asqueroso e inimigo dos preceitos democráticos. E mais: que entrem numa situação que já tem uma configuração definida; e que ela vai entrar ali já sabendo que, a não ser que seja tão maligna e autoritária quanto o seu chefe-supremo, não terá nem vez nem voz para traçar estratégias de ação que não se alinhem com o pensamento, os gostos, as crenças e os caprichos dele.

Será que o senhor Nelson Teich estava em outro planeta e não viu e nem tomou conhecimento de tudo o que o asinino presidente da República fez com que seu antecessor no Ministério da Saúde, o deputado federal e médico Luiz Henrique Mandetta? Eu me pergunto ainda: se o senhor Nelson Teich não concordava com o fim do isolamento social e muito menos com o uso da cloroquina para o tratamento dos infectados pelo coronavírus, os dois principais pontos defendidos pelo mandatário da nação, o que danado foi que o levou a tomar parte nessa tragicomédia de muitos erros que é o desgoverno do senhor Jair Bolsonaro?

Em 26 de outubro de 1840, poucas semanas depois de ter chegado ao Recife para trabalhar na Repartição de Obras Públicas da Província de Pernambuco, o engenheiro francês Louis Léger Vauthier, que cedo compreendeu as agruras de conviver e lidar com uma gente de um lugar atrasado, escreveu assim nas páginas do seu diário: “Não se pode fazer coisa alguma bem feita e depressa neste maldito país” (Diário íntimo do engenheiro Vauthier [1840-1846]. Rio de Janeiro: Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, 1940, p. 75).

O tino e a clareza de entendimento da realidade que teve o arguto francês Vauthier, faltaram ao oncologista Nelson Teich, que resolveu entrar no Ministério da Saúde, onde não se demorou nem um mês e pediu para sair ontem, ao se dar conta de que não tinha voz de mando; que não poderia fazer nada sem o consentimento do chefe-supremo; que o dito-cujo tomava decisões que diziam respeito à sua pasta – na segunda-feira, com cara de cachorro que caiu da mudança, o então ministro tomou conhecimento através de jornalistas, de que o seu chefe incluíra salões de beleza e academias, imaginem, como serviços essenciais -; e que ele não passava nem de um fantoche, porque fantoches fazem o que nós queremos, e sim de um objeto de decoração naquele ministério.

Assim como ocorreu com Sergio Moro, Nelson Teich pediu para sair de um desgoverno onde imperam o autoritarismo e a ignorância de um presidente da República que é a personificação do retrocesso e da perversidade.

IV

Não adianta: não me peçam aqui que eu faça historismo, que consiste em uma narração de fatos desprovida de críticas, que eu até sei fazer, mas não me proponho a fazê-lo, porque isso vai de encontro ao meu compromisso intelectual de dizer de minhas inquietações, visões e compreensões de mundo.

V

Todos que acompanharam a campanha eleitoral do senhor Jair Bolsonaro viram que era uma constante dele e de seus apoiadores o gesto de fazer uma “arma de fogo” com os dedos polegar e indicador. O revólver, a arma de fogo, mais do que um instrumento que, na compreensão deles, servia como autoproteção, era o símbolo máximo de um então candidato que pregava não só o direito a todo e qualquer cidadão de portar uma arma, mas também, por assim dizer, uma política de tolerância zero aos criminosos, o que lembrou muito o discurso de “caça aos marajás” do infame Fernando Collor, que deu no que deu.

Fiz esta brevíssima introdução só para fazer os bolsonaristas de plantão lembrarem da arma, ops, da promessa de campanha do seu chefe-supremo; e para lhes comunicar, porque eu acredito que tão ocupados que eles estão  em organizar carreatas, participar de protestos na Praça dos Três Poderes, em Brasília, que por eles deveria ser batizada de Praça do Poder Único, e de espalhar nas redes sociais fake news e os ideais da República Antidemocrática Bolsonariana que, no Rio de Janeiro, comerciantes de Duque de Caxias – e de bairros da capital e provavelmente de outras cidades de lá – estão sendo obrigados por milicianos a abrir seus estabelecimentos desde o início da quarentena, porque os coagidos têm de pagar por proteção às milícias que, claro, não querem ficar sem receber. Por que é que o senhor Jair Bolsonaro não combate milicianos, hein? (“Cidade da Biaxada Fluminense tem saúde à beira do colapso e comércio aberto a mando da milícia”. In GauchaZH: https://gauchazh.clicrbs.com.br/geral/noticia/2020/05/cidade-da-baixada-fluminense-tem-saude-a-beira-do-colapso-e-comercio-aberto-a-mando-da-milicia-cka2j6x5q04ev01qlvdcuxf9t.html. Publicado em 11 de maio de 2020. Acessado em 12 de maio de 2020).

Para um desgoverno que põe, digo, que pôs o combate à bandidagem e à corrupção como meta, não deve ter sido nada confortável lidar com o fato de que mais de 73.000 – isso mesmo: 73.000 – integrantes das gloriosas Forças Armadas deram um jeitinho de enganar o sistema da Dataprev e receber o auxílio emergencial de R$ 600,00. Que coisa bonita, hein, senhores e senhoras?! Que belo exemplo de cidadania os senhores e as senhoras deram ao povo deste Brasilsil varonil” (“TCU manda 73,2 mil militares das Forças Armadas devolverem auxílio emergencial de R$ 600”. In Blog de Jamildo: https://blogs.ne10.uol.com.br/jamildo/2020/05/13/tcu-manda-732-mil-militares-das-forcas-armadas-devolverem-auxilio-emergencial-de-r-600/. Publicado em 13 de maio de 2020. Acessado em 14 de maio de 2020).

VI

Quem lê o que eu venho publicando nas últimas semanas neste espaço pode chegar a pensar que eu sou um defensor incondicional da Rede Globo. Não, eu tenho várias restrições à emissora da família Marinho, como, aliás, tenho em vários outros segmentos, como na minha alimentação, por exemplo. Agora, promover ataques à Rede Globo por tomá-la o tempo todo como golpista e manipuladora da opinião pública é, no meu entendimento, ficar cego a tudo o mais que acontece ao redor de nós, inclusive, nos outros órgãos da imprensa e da mídia em geral, e nos bastidores do poder político.

E o rol de críticas à Vênus Platinada é infindável: “Ah, a Globo só fala mal de Bolsonaro”; “A Globo fica o tempo todo mostrando coisas ruins do Governo”; ou como o que está escrito num dos cartazes de protesto deixados no terminal de ônibus de Igaraçu, na Região Metropolitana do Recife, que eu recolhi agora à noite, quando regressava do trabalho: “William Bonner é pau mandado. Globo de merda”.

Eu vejo manifestações como essas e faço um questionamento bem trivial: gente, a Rede Globo vem exibindo mentiras nos seus telejornais? A acusação de manipuladora e de ser tendenciosa para mim é pertinente sim, mas não diz tudo, principalmente quando se considera que há outras emissoras e que elas também possuem telejornais cuja neutralidade é discutível; ou seja, basta que eu, você que me lê neste momento ou quem irá ler este post, varie as suas opções de canais de informação e tire as suas próprias conclusões sobre determinados fatos. É científico isso: os indivíduos tendem a acreditar somente naquilo que se encaixa nas suas crenças, compreensões e visões de mundo, descartando e/ou repudiando tudo o mais, ainda que esse “tudo o mais” sejam dados factuais e/ou entendimentos e/ou explicações racionais e verdadeiras. Paremos de pensar que a grande massa é toda ela ignara e escrava da ignorância. Não, as pessoas habitualmente – e isso é um entendimento meu – são escravas de seus desejos, de suas ideologias e de suas ambições. Discordar de uma verdade evidente e estabelecida, eu acredito, não é necessariamente não compreendê-la e não enxergá-la; pode simplesmente ser não aceitá-la por uma série de razões, como o comportamento de quem não admite que errou e nem quer dar o braço a torcer.

Tendo em vista tudo o que já se viu até agora no desgoverno do senhor Jair Bolsonaro, que tantos defendem com paus, cartazes, facas, bandeiras, alto-falantes, carreatas, unhas e dentes; considerando todas as arbitrariedades, todos os crimes e todas as malfeitorias que esse ser presunçoso, perigoso e autoritário já praticou mesmo sob os olhos “manipuladores” e “tendenciosos” da Rede Globo, você que ainda permanece aqui lendo este artigo, já parou para pensar no tanto de estrago e de abuso de poder que essa criatura teria posto em prática caso só existisse uma mídia que o aplaudisse e concordasse com tudo o que ele diz e faz e não com uma que vigia, critica e reprova os seus atos e manobras?

Aproveitando ainda o tema “ataques à Rede Globo”, que são feitos tanto pela direita quanto pela esquerda, porque ela não consegue agradar a nenhum dos lados, eu também quero comentar aqui outra questão. Particularmente eu considero extremamente repulsivo o comportamento de quem costuma cuspir no prato que por anos a fio comeu. Não é este o caso do jornalista Alexandre Garcia, que saiu da Rede Globo, ingressou nas hostes bolsonaristas, mas, até agora, não desferiu ataques à emissora na qual trabalhou durante décadas. O falecido Paulo Henrique Amorim sim, desempenhou este infame papel; e ainda foi trabalhar na TV Record, propriedade de uma figura pública que, para mim, está na galeria onde se encontram reunidos os personagens mais execráveis e repugnantes deste país, o maldito Edir Macêdo, que se tornou multimilionário se aproveitando da fragilidade e da ingenuidade de seus seguidores..

Por que, para Paulo Henrique Amorim, só para ficarmos neste notório exemplo, a Rede Globo só passou a não prestar quando ele saiu dela? E por que que ele, tão sabido e perspicaz, levou tanto tempo para chegar à tal conclusão? É no mínimo, no mínimo intrigante e curioso esse tipo de comportamento difamador de pessoas que, ao perderem espaço na emissora mais influente e mais vista do país, passem a atacá-la como modo de se manter sob os holofotes e, quiçá, angariar um publicozinho e conseguir auferir algum ganho financeiro.

Pesando essas considerações, eu penso que a Giuliana Morrone, em áudio vazado de um diálogo dela com o também jornalista Gerson Camarotti, ocorrido nesta semana, foi muitíssimo descortês e duplamente ofensiva ao sugerir que, talvez, o comportamento do senhor Alexandre Garcia, por ela acusado de endossar a cassação da concessão da emissora, seria de alguém que, tal qual a Regina Duarte, parece estar gagá.


VII

Ainda que fazendo o uso de máscaras, muitas, muitas pessoas nestes dias pandêmicos que correm e estamos de alguma forma a vivenciar e a acompanhar, não têm conseguido esconder o que elas realmente são. A defesa dos próprios interesses camuflados numa suposta preocupação com o bem comum está sendo vista no comportamento de um sem-número de empresários que querem a todo custo e ainda que corramos o risco de contabilizar e saltar dos atuais quase 16.000 mortos para, sei lá, 50.000, 100.000 falecidos vitimados pelo coronavírus, reativarem os seus empreendimentos. Amedrontados com o risco de repente perderem seus negócios e mesmo ficarem pobres, que é, para eles, imagino, a pior desgraça da vida, muitos desses animais selvagens do capitalismo que sonegam impostos e até adulteram produtos estão com a corda toda, empenhados em reabrir as suas empresas, tenha isso a consequência mortífera que tiver.

Os desvalidos, os necessitados, os mendicantes, os moradores de rua, os excluídos do bem-estar e da bonança da sociedade, como aquele ser vivente descrito em versos por Manuel Bandeira no Rio de Janeiro, em 27 de dezembro de 1947, dois dias depois das cristãs e fartas ceias natalinas, que foi visto “Na imundície do pátio/Catando comida entre os detritos”, “O bicho que não era um cão,/Não era um gato,/Não era um rato” e sim um homem (Manuel Bandeira. “O bicho”. In Estrela da vida inteira. 20ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993, p. 201-202), sempre e sempre estiveram por aí, sendo notados por alguns e ignorados pela imensa maioria de nós, que não os via e/ou fingia não os ver, porque, afinal, mal podemos cuidar de nós mesmos, não é?

Um dos efeitos da pandemia que nos assola foi nos fazer enxergar, sem filtro e sem lente de aumento, a multidão de miseráveis que habita neste mundo de tantas desigualdades sociais. Quantos de nós não age, no mais das vezes, como uma espécie de autômatos, repetindo diariamente funções e/ou atividades, buscando atender as nossas necessidades essenciais, como comer e beber água, como se fôssemos meros animais, como se não detivéssemos a capacidade de sopesarmos as nossas ações e de refletirmos sobre o existir e sobre o quanto as nossas crenças, os nossos valores, os nossos comportamentos e tudo aquilo, tudo o que elegemos como nossas necessidades materiais de existência, podem ser excludentes e eu diria mesmo que maléficas para tantos outros seres humanos e para o próprio meio ambiente do qual somos inteiramente dependentes?

VIII

Quem, no começo da semana, viu o senhor Jair Bolsonaro fazendo uso de máscara – na segunda-feira começou a vigorar, no Distrito Federal, a determinação do uso – e, ainda que forçosamente, entregando os resultados dos seus exames de testagem do coronavírus, pode ter chegado a pensar que o impávido e inflexível presidente da República estava, finalmente, entrando na idade da razão. Mas os acontecimentos verificados logo em seguida puseram ao rés do chão toda e qualquer veleidade a esse respeito.

Na quarta-feira, quando saiu publicada no Diário Oficial da União, uma logo demasiadamente criticada medida provisória que, de acordo com juristas, tem feição de uma espécie de salvo-conduto, ao estabelecer uma, digamos, isenção de responsabilidade por parte de funcionários públicos no trato e/ou omissão na condução do enfrentamento da pandemia do coronavírus e mesmo como uma medida de autoproteção do mandatário da nação – o que reforça o que eu mencionei como ação de quem quer fazer dos interesses pessoais, política de Estado -, o asinino e irresponsável senhor Jair Bolsonaro, em videoconferência com empresários, continuou a defender o fim do isolamento social como único meio de reanimar e salvar a economia; disse que os governadores estão praticando desobediência civil ao não encamparem o que ele vem determinando (ele omitiu que o STF estabeleceu que governadores e prefeitos podem elaborar suas próprias determinações no combate à pandemia); que por ele tudo neste país estaria funcionando, como desde o início da pandemia fez a Suécia (ele omitiu que a Suécia acabou figurando como o país nórdico onde mais o coronavírus tirou vidas de pessoas; e que, mesmo com tudo funcionando, ainda assim os suecos entrarão em recessão); e apelou que eles, os empresários, pressionassem os governadores a liberarem a volta à “normalidade” da economia (“Bolsonaro defende isolamento vertical e diz que quer ‘abrir tudo’”. In Diario de Pernambuco: https://www.diariodepernambuco.com.br/noticia/politica/2020/05/bolsonaro-defende-isolamento-vertical-e-diz-que-quer-abrir-tudo.html. Publicado em 14 de maio de 2020. Acessado em 14 de maio de 2020).

Enquanto faz as suas pregações salvadoras da economia; enquanto dissemina fake news em suas redes sociais; enquanto pratica uma bestialidade atrás da outra; enquanto segue apontando os inimigos da sua tresloucada administração; e enquanto joga para cima de governadores e de prefeitos que não seguem as suas recomendações desastrosas a responsabilidade por tudo de ruim que a pandemia provocou e/ou agravou, o excrementíssimo senhor Jair Bolsonaro permanece também negociando parte de seu desgoverno com o inescrupuloso “centrão”, que não tem compromisso nenhum com a opinião pública, porque ele, presidente da República, vê cada vez mais próximo de si, a abertura de um processo de impeachment sendo posto em pauta na Câmara dos Deputados.

Jair Bolsonaro é alguém excepcionalmente privado de delicadeza de ideias, de bons sentimentos e de palavras postas em seus devidos lugares. Jair Bolsonaro rói o seu osso de irresponsabilidade e inépcia e não o solta.

Não sei até quando teremos de amargar a lamentável realidade de ver um indivíduo tão despreparado, estúpido e irresponsável ocupando a presidência da República deste país. Mas algo é certo: tal qual pandemia que atualmente nos castiga, chegará o dia em que a desgraça desse desgoverno também vai acabar.

O autoritarismo é deveras contagioso. Foi por isso que, do alto de minha pequenez e insignificância, eu decretei que, doravante, o 22 de abril também passará a ser o Dia do Canalha.

Um comentário:

  1. Como se era de esperar, veio a tona através do vídeo liberado pelo ministro do STF a reunião que provaria os relato do Sérgio Moro sobre a real intenção é interferência desse desgoverno sobre a polícia federal. Os desmando do governo veio a tona recheado de palavrões e ofensa que mais parecia uma reunião de moleques ou mesmo de uma milícia. Como sabido, além provar a interferência PF acabou por revelar ameaças aos poderes na fala do vagabundo ministro da educação, que educação não tem nada, da boca da louca Damares e os planos do ministro do meio ambiente que de forma sorrateira queria legalizar a grilagem e deixar a boiada passar como mesmo mencionou. Os bolsominions como esperado com sua falta de caráter continua na defesa de um cidadão que em momento algum se dirigiu a preocupação com o atual cenário de covid no Brasil, mostrando total omissão diante de milhares de mortos. É inadmissível tais comportamento de seus eleitores em simplesmente fechar os olhos para todos aqueles que perderam seus entes pra essa doença. Por fim o que se viu foi um presidente preocupado apenas, em blindar sua família e seus amiguinhos, em uma ideologia covarde e miliciana. Diante de tudo isso, resta agora a PGR se denúncia ou não pelos vários crimes cometidos apenas naquela reunião. Resumindo, o Aras não irá denunciar e continuará os desmando desse governo ditatorial.

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