31 de dezembro de 2022

Jair Bolsonaro: um autêntico e legítimo ouro de tolo

 Por Sierra

 

Foto: Daniel Arroyo
Que louvados nunca sejam aqueles que pregam o ódio, o preconceito, o morticínio, a intolerância e a desumanidade. Amém!
 

Hoje, dia 31 de dezembro de 2022, o Brasil que acredita no progresso deste país respeitando a ordem e a democracia dá adeus, como quem se despede de um ente nada querido, a um delinquente que durante quatro anos ocupou a presidência da República. Hoje, dia 31 de dezembro de 2022, o Brasil que acredita no desenvolvimento plural deste país, incluindo índios, negros, gays, mulheres e pobres, dá adeus a um facínora como quem festeja uma vitória numa luta contra um câncer. Hoje, dia 31 de dezembro de 2022, o Brasil que acredita no crescimento de uma cidadania dos que muito trabalham neste país dá adeus a um mentecapto como quem acredita que se livrou de um recorrente pesadelo. Hoje, dia 31 de dezembro de 2022, o Brasil que acredita, que aposta, que milita e que confia numa ideia feliz de país dá adeus a uma criatura exemplar da bestialidade humana, como quem exorciza um demônio.

O que será que levou milhões de brasileiros a eleger, em 2018, um político inexpressivo e burrão que passou quase trinta anos no Congresso Nacional falando unicamente para militares e afins e para os pensionistas deles? O que será que levou milhões de brasileiros a acreditar que alguém tão despreparado poderia livrar o país dos corruptos e dos corruptores? O que será que levou milhões de brasileiros a querer mantê-lo na presidência da República, passados quatro anos pontuados por um rol de males por ele praticados?

Não creio que só a roubalheira ocorrida durante a Era Petista explique isso, mesmo porque, não fazia e nem faz sentido querer estancar e/ou pretender estancar roubalheira e outros ilícitos escolhendo para tal combate um celerado desqualificado e desumano. A mim me parece que esses milhões de indivíduos que elegeram Jair Bolsonaro e que tentaram reelegê-lo neste ano, se reconheceram em toda a sua malignidade, em toda a sua hipocrisia, em todo o seu mau caratismo, em toda a sua indiferença, em toda a sua retórica antidemocrática, em toda a sua homofobia, em todas as suas perversões e fixações sexuais, em todo o seu discurso armamentista, em toda a sua manipulação da fé espiritual e religiosa, em todo o seu desprezo pelo meio ambiente, em todo o seu transtorno psicológico e em toda a sua bestialidade. Esse olhar para alguém como Jair Bolsonaro e se reconhecer nele, como quem está diante do espelho, diz muito dos males que se carrega dentro de si e que não existem apenas na outra pessoa.

Bravateando quase todo dia e ladrando diuturnamente como um cão raivoso, Jair Bolsonaro foi arregimentando mais e mais membros para a sua seita messiânica eivada de intolerância e de preconceito. Daí por que, aqui e ali, nos quatro cantos deste país, vimos membros dessa seita macabra invadindo hospitais no auge de uma pandemia mortífera; agredindo fisicamente jornalistas; desrespeitando o ambiente religioso, seja como líderes espirituais, seja como frequentadores de tais espaços; bloqueando estradas, impedindo o ir e vir de pessoas que queriam ir trabalhar, estudar e ser atendidas em consultas médicas; incendiando terreiros de religiões de matriz africana; ameaçando de morte quem se recusava a tomar parte na seita; desacreditando a eficácia das vacinas contra a doença trazida pelo coronavírus; matando aqueles que manifestavam voto ao candidato petista; humilhando necessitados e famintos que não pensavam politicamente como eles; clamando que as Forças Armadas dessem um golpe de Estado; e planejando atentados terroristas com o fito de, segundo eles, gerar o caos e provocara decretação de estado de sítio.

Nasci durante a Ditadura Militar; mas eu era ainda uma criança quando a vi caminhando para o seu fim, de modo que eu tenho de vivência do período de exceção algumas poucas referências e todas elas ruins. O meu aprendizado sobre aquele período foi adquirido de modo quase todo livresco, quer lendo narrativas dos que eram considerados subversivos e comunistas, quer lendo o que um e outro defensor da pátria, da família, de Deus e da liberdade escreveram dando os seus testemunhos dos fatos. E, em que pese a verdade histórica que diz que houve prática de crimes do lado dos subversivos, eu nunca e jamais aceitarei que, ao se contrapor a isso, o Estado, como representação do processo civilizatório, tenha considerado que era legítimo e necessário praticar toda sorte de tortura e de humilhações contra os seus opositores, além de assassinatos e sumiços de corpos que nunca foram encontrados. E são esses horrores que Jair Bolsonaro defende e prega em seu messianismo perverso.

Para quem tinha e tem um mínimo de consciência de valores, como bem comum e harmonia social, só o fato de alguém louvar torturadores, assassinos e delinquentes já diz mais do que o suficiente de sua personalidade maligna. Mas, ao que parece, foi preciso que ocorresse uma pandemia mortal para que pelo menos parte dos fanáticos de Jair Bolsonaro enxergasse finalmente toda a malignidade e desumanidade que o constitui e que ele, doentiamente vaidoso, faz questão de exaltar. Foi preciso o acontecimento de uma pandemia mortal para que Jair Bolsonaro revelasse que é muito mais abjeto, vil, torpe, mesquinho, repugnante e nocivo para os ideais de uma sociedade democrática do que ele aparentava ser.

Enquanto a contaminação pelo coronavírus grassava, Jair Bolsonaro desacreditava a gravidade da doença. Enquanto o número de contaminados crescia velozmente, Jair Bolsonaro incentivava os seus seguidores a invadir hospitais para ver se era aquilo mesmo. Enquanto famílias choravam pelos seus mortos, Jair Bolsonaro promovia motociatas, cavalgava, andava de jetski, voava de helicóptero e pedia que o povo voltasse para as ruas. Enquanto a pandemia cobria de luto todo um país, Jair Bolsonaro apoiava e participava de atos antidemocráticos repetindo, à exaustão, em tom sempre ou quase sempre, intimidatório, que qualquer hora dessas o Brasil iria ser tomado por forças realmente garantidoras da lei e da ordem contra “aqueles que insistem em jogar fora das quatro linhas”.

Hoje, dia 31 de dezembro de 2022, não se encontra neste país o homem que tanto ameaçou as instituições e os seus opositores. O homem que passou quatro anos dizendo que iria fazer e acontecer embarcou ontem, num avião, rumo à Flórida, nos Estados Unidos, carregando consigo e em sua pesada bagagem, o estigma da derrota e a pecha de covarde, logo ele que, do alto de sua propagandeada imbrochabilidade, se apresentava como o fodão que este país jamais teve outro igual.

Jair Bolsonaro foi embora e deixou para trás uma grande massa de iludidos, parte da qual está até agora nas portas de quartéis clamando, orando e pedindo a Deus que o Messias volte logo, volte e convença, de uma vez por todas, as Forças Armadas a novamente decretar e estabelecer uma ditadura militar neste país. E eu espero que algum dia todas essas pessoas, todos esses milhões de eleitores, ditos defensores da pátria, da família, de Deus e da liberdade, olhem para trás e vejam os males que, na verdade, eles defenderam, praticaram e ajudaram a disseminar.

Que louvados nunca sejam aqueles que pregam o ódio, o preconceito, o morticínio, a intolerância e a desumanidade. Amém!

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