Por Sierra
Não sei você, leitor, mas eu
aproveitei o Carnaval deste ano para renovar as baterias da minha alegria ao
mesmo tempo em que celebrava o fortalecimento da democracia e exorcizava alguns
demônios. E não deixei barato para os demônios, não. Eu mesmo fui o meu
estandarte. E quem quer que me visse andando por aí certamente enxergaria na
luz dos meus olhos o reflexo da satisfação e do prazer da liberdade e da
plenitude da vida.
Em Olinda a multidão encheu ladeiras do sítio histórico
E quem não quer ser livre
que levante o braço. Cadê? Ninguém levantou o braço, não foi? Pois é, no fundo,
no fundo todo mundo quer ter liberdade, quer ser livre, mas uns e outros creem que
sua missão na vida é cercear a liberdade das outras pessoas; é promover a
discórdia para gerar um conflito e uma animosidade permanentes. Chega disso!
Eu trabalhei no dia do
desfile do Galo da Madrugada que, eu só vim saber depois, quis bancar de
autoritário no seu terreiro atacando profissionais da imprensa. Assim não pode,
assim não dá, Seu Galo da Madrugada! Mas nos três dias seguintes eu botei para
quebrar: peguei o busão na Ilha de Itamaracá e tomei o rumo de Olinda e do
Recife sem querer saber quem pintou a zebra de listrado e nem quem colocou
galho na cabeça do veado.
O Elefante de Olinda arrastou foliões apaixonados
Quem foi que disse que o presidente Lula não ia dar uma passadinha em Olinda? |
O Carnaval de Olinda, você sabe, não é? É quase uma maratona. É quase uma prova de resistência. O que a gente sobe e desce ladeira atrás de blocos não está no gibi. E, por mais que se suba e se desça ladeiras, parece que o cansaço não chega, parece que as baterias não descarregam. Desconfio que isso se deva ao fato de que, durante o Carnaval, quanto mais nos movimentamos, mais ânimo nós vamos tendo. A alegria potencializa as nossas baterias.
Rainha Lia de Itamaracá mandando ver na ciranda |
Não deu para ficar parado –
e eu não fui a Olinda para ficar só de espectador, claro. Quem fica parado é
poste. Eu remexi o esqueleto ao som de samba – Jorge Aragão, que maravilha ver
o senhor grandiosamente comandando a massa -, ciranda – rainha Lia de
Itamaracá, obrigado pelo abraço, pelo beijo e pelas palavras. Eu adoro a
senhora -, coco – Mestra Ana Lúcia, que energia! -, frevo – Renatto Pires, foi
bom e pode ficar ótimo – e até MPB – Fafá de Belém, ô Fafá, que coisa boa
danada, mulher! Você é uma paraense pernambucanizada já faz um tempão. E,
naquelas ruas lotadas de gente, eu também acompanhei os tradicionalíssimos
blocos Vassourinhas e Elefante de Olinda.
No Marco Zero, no Recife, a multidão estava muito animada também
Na segunda-feira eu cheguei
ao Marco Zero, no Bairro do Recife, em tempo de acompanhar o Bloco da Saudade
se apresentando no maior palco para a maior platéia da cidade. Um clima de paz
e de harmonia reinava ali para que sentíssemos de mansinho as batidas do
coração no compasso maravilhoso da vida. Estar naquele lugar e no meio daquela
multidão foi um desses acontecimentos que a gente nunca esquece e que de vez em
quando mentalmente revisita como se estivesse revirando as folhas de um álbum
de fotografias onde estão guardadas só boas recordações. Ali, no Marco Zero,
por um momento, eu dei um giro de 360º em torno de mim mesmo para contemplar o
cenário e olhar as pessoas, como que querendo apreender as sensações todas e as
boas energias que delas emanavam enchendo a praça de uma alegria verdadeira.
Só quem sente, sabe o que é isso
Eu adoro o Carnaval. Adoro a greia. Adoro ver as pessoas esbanjando irreverência e alegria, brincando a valer, fantasiadas ou não, cheias de roupas ou quase completamente nuas, caindo na festa e na gandaia como se não houvesse amanhã e o hoje possibilitasse o todo ou o máximo possível de encantamento e de prazer. Gosto de por vezes poder encarar a vida desse jeito, potencializada pela ideia e pela busca da satisfação e do prazer intensos. E tem gente que reserva suas energias para vivenciar essa experiência justamente durante o Carnaval, porque encara os dias do reinado de Momo como os únicos do ano apropriados para isso.
Fafá de Belém parecia que tinha devorado um quilo de açaí com guaraná: que energia danada, mulher!! |
Até a boneca foi ver Fafá de Belém animar a festa |
Eu sei que, assim como eu, muita, muita gente encarou o Carnaval deste ano como uma desforra contra diversos males que intentaram nos abater durante o tempo em que durou o drama causado pela pandemia do coronavírus. De modo que, montar uma fantasia, pintar o rosto, despir-se de neuras e sair por aí para celebrar a vida, para festejar o fato de ter sido forte o bastante para ter conseguido sobreviver à peste da covid-19 e a outras pestes realmente foi uma ocasião de expurgação e de catarse. E, ao menos em Olinda, o que eu vi foi um misto de exaltação e de celebração da vida com a defesa da democracia com muitos “olê, olê, olê, olá, Lula, Lula” cantados em vários pontos do sítio histórico.
Blocos líricos são muito encantadores
Perdão estava barato, mas já tinha acabado |
Saí de casa para ir brincar em Olinda e no Recife durante três dias seguidos. Nossa, como foi bom ver a vida sendo vivida intensa e alegremente por milhares de pessoas. Cada vez que entoavam uma canção, cada fantasia que enchia os meus olhos e cada passo de dança como que incutiam em mim uma dose extra de apego à vida numa larga medida. Que coisa boa poder ter sentido isso! É verdade, amanhã pode ser muito tarde. Por que não exaltar o bom da vida agora? Muita gente extravasou a alegria no Carnaval deste ano. E eu encarei o Carnaval como uma mais do que necessária exaltação da vida. Evoé, Momo!! Eu já estou com saudades.
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