Por Sierra
Fotos: Arquivo do Autor
Fechado há vários anos e ocupando indevidamente um espaço considerável da faixa de areia da praia, o Hotel Tambaú continua fazendo feia figura na orla da capital paraibana
Transcorridos dez meses após a minha última estada na capital paraibana, eis que, no mês passado, eu voltei àquela cidade aproveitando uns dias de férias do trabalho.
Como quase sempre eu faço quando vou a João Pessoa – e desta vez eu nem me hospedei lá; fiquei instalado no Conde, que é um município vizinho a ela -, eu percorri diversas ruas do centro histórico, por conta do meu interesse pelas questões ligadas à preservação do patrimônio histórico edificado, e aproveitei horas e horas de curtição na orla, principalmente na Praia de Tambaú.
É claro que, tendo ido àquela praia, nem que eu não quisesse eu poderia deixar de notar a presença concreta e incômoda do estado precário em que ainda se encontrava o Hotel Tambaú. Corrijo: em estado ainda mais precário do que quando eu o vira em janeiro passado, porque a maresia e o movimento das ondas trataram de castigá-lo um pouco mais.
Eu já falei mais de uma vez da minha insatisfação para com a presença do Hotel Tambaú naquele pedaço da orla marítima pessoense. A minha insatisfação e mesmo um certo incômodo se dão não por causa do projeto arquitetônico modernista de autoria do arquiteto Sergio Bernardes, que é até bonito quando visto do alto, porque somente assim, penso eu, é que se consegue realmente ter uma real compreensão de seu desenho inovador e da sua beleza, e sim por causa de sua localização inadequada, ocupando uma grande extensão da faixa de areia, uma área pública pertencente à União.
Particularmente eu não duvido que tenha havido negociatas que permitiram a construção do hotel naquele espaço. E o fato de ela ter ocorrido em plena vigência da Ditadura Militar se não diz tudo, diz muito sobre os atropelos das leis que se verificavam durante aquele período sombrio e macabro de nossa História recente: sabe-se, por exemplo, que houve casos em que os donos do poder da ocasião, deram aval a obras que puseram abaixo edificações históricas para que fossem abertas e/ou ampliadas ruas e avenidas.
Não bastasse a sua localização imprópria e ilegal, o estado de degradação em que se encontra o Hotel Tambaú contribui um pouco mais para as muitas críticas que tal empreendimento vem angariando entre pelo menos uma parcela daqueles que frequentam as praias de João Pessoa. A crítica que eu mais ouvi de pessoas com as quais eu conversei destacou que não podiam compreender como um hotel daquele porte e com aquela estrutura gigante pudesse estar fechado e ocupando indevidamente tamanho espaço numa praia que atrai tantos turistas.
Metido numa disputa judicial e acumulando dívidas, o Hotel Tambaú chegou a ir a leilão; foi cercado por uma tapume com adesivos da AMPAR Hotelaria de Participações Ltda; a Prefeitura Municipal chegou a divulgar que iria tornar o hotel um “bem de utilidade pública”, ou seja, iria desapropriá-lo para torná-lo um equipamento da Municipalidade; e agora o que eu ouvi é que uma empresa – não sei se a própria AMPAR Hotelaria - vai restaurar e requalificar a construção para reabri-la novamente como hotel.
Desde quando eu comecei a desfrutar do privilégio de poder viajar, eu passei a me deparar com realidades locais que diferiam das peças de propaganda de atrações turísticas divulgadas pelos governos estaduais e municipais. Desse modo, eu deixei de ficar frustrado ao encarar e ver de perto o que aparentava ser tão bonito e perfeito em tais roteiros de viagens. Diante disso e do fato que as propagandas continuam divulgando o Hotel Tambaú como uma das atrações turísticas de João Pessoa, eu preciso lhes dizer o seguinte: o hotel encontra-se fechado há vários anos; tenham cuidado ao circular nas proximidades dele, junto à praia, porque partes da estrutura de concreto armado estão despencando; e que vocês não conseguirão passear pela faixa de areia que ladeia o hotel quando a maré estiver alta.
Aproveitando o ensejo e fazendo ao mesmo tempo um serviço de utilidade pública, eu preciso lhes dizer também que o sítio histórico da cidade está repleto de sobrados e casas abandonados e em ruínas há muitos anos; e que um trecho do outeiro do Cabo Branco continua interditado para a circulação de veículos, porque parte da barreira está desmoronando há muito tempo e nem a Prefeitura Municipal e nem o Governo estadual decidem o que fazer para resolver o problema.
A indústria turística, como sabem todos aqueles que tem um mínimo de conhecimento sobre ela, mesmo que seja apenas como consumidor de seus produtos, tanto pode promover o desenvolvimento e o sempre louvado progresso de determinados lugares como desencadear transformações de impacto muito negativo para as populações locais, vide os movimentos de repulsa a turistas que vêm ocorrendo em algumas cidades da Europa. E João Pessoa, infelizmente, a meu ver, começou a sofrer com a presença cada vez maior de turistas e visitantes.
Nos últimos meses o noticiário divulgou uma série de acontecimentos que eu não consigo deixar de relacionar com a indústria turística: o Ministério Público caiu em cima de construtoras que ergueram prédios desobedecendo às leis que estabelecem alturas máximas para edificações construídas em determinadas áreas da cidade, como a beira-mar; fiscais municipais flagraram vários empreendimentos comerciais promovendo despejo irregular na rede de esgotos; e ocorreu uma valorização considerável dos valores de imóveis na capital paraibana.
Muito recentemente a Booking.com, uma das maiores agências de viagens online do mundo, divulgou o resultado de uma pesquisa, feita com milhares de seus clientes, em que João Pessoa apareceu entre os principais destinos turísticos para o ano que vem. E, particularmente, para mim, o grande atrativo de João Pessoa no aspecto turístico, ainda são os preços de comida e acomodações, que não estão ainda tão elevados como em outras capitais nordestinas. E muitos dos turistas que se hospedam na capital paraibana, a bem da verdade, vêm também interessados em conhecer as belíssimas praias da vizinha cidade do Conde, litoral sul da Paraíba.
Enquanto isso, fechado e degradado, o Hotel Tambaú permanece como um anticartão-postal - alguém até registrou a frase "Tire as construções da minha praia!!!" no tapume que está envolvendo a maior parte do terreno por ele ocupado - e um verdadeiro cancro de concreto armado fazendo feia figura na beira-mar de João Pessoa, um dos maiores destinos turísticos do Brasil.
Nenhum comentário:
Postar um comentário