23 de setembro de 2011

A ignorância e a intolerância como dínamos da consciência


Por Clênio Sierra de Alcântara


Sempre que as nuvens negras da ignorância e da intolerância intentam pairar sobre a minha cabeça, eu fecho os olhos e mentalizo as palavras luminosas da psicóloga Ana Bock que, em apenas três páginas de uma revista (Veja, nº 1646 - 26/04/2000), me deram um entendimento de mim e do que vai ao meu redor, que eu não encontrei na leitura de vários livros.

Toda forma de violência é repugnante. E o é ainda mais quando perpetrada por pessoas que, dizendo estarem agindo em benefício da humanidade, utilizam livros religiosos e/ou quaisquer outros escritos e/ou discursos doutrinadores como escudos e espadas em suas infames guerras particulares contra a liberdade de pensamento e comportamento, e contra certas raças, crenças e orientações sexuais.

É, segundo o meu entendimento, isso o que explica a ação de grupos neonazistas, religiosos e quejandos que espancam negros, trucidam homossexuais, ateiam fogo em mendigos, submetem as mulheres aos mais absurdos horrores, explodem-se com bombas presas ao corpo a fim de aniquilarem o maior número possível de indivíduos, perseguem minorias étnicas e empunham armas de fogo para dar cabo de dezenas de vidas em alguns poucos minutos, como ocorreu recentemente na Noruega.

Não aceitar do que se é feito, é recusar-se a entender a si próprio. E quando não se aceita e não se entende a si mesmo, jamais se poderá aceitar e entender o outro; e respeitar as diferenças. Daí por que muitos padecem por não se aceitarem como são; e por acreditarem que não podem se encaixar nos arquétipos que as convenções sociais estabelecem como bonito, correto e adequado.

São habitualmente carregadas de "verdades absolutas" as pregações de moralidade e de bons costumes que se apoiam em crenças religiosas. Costumo dizer que o que pertence a cada religião - suas liturgias, suas doutrinas - deve somente servir aos que a ela seguem. Quando, por exemplo, criticam a Igreja Católica de agir de maneira retrógada ao não difundir o uso da camisinha, eu digo que ela não está errada, porque os seus seguidores é que devem se adaptar aos preceitos nos quais ela está alicerçada; ou, do contrário, dela devem se afastar. O que não pode de maneira alguma é os Malafaias, os Macedos, os Bentos e outros quererem agir como se vivêssemos em feudos teocráticos, como se devêssemos ser submetidos ao que eles acreditam e pregam, porque mais do que estupidez, isso é de uma pretensão absurda. As leis que todos e cada um de nós temos de seguir são as que estão estabelecidas na Constituição Federal. Ninguém é sequer obrigado a ter crença religiosa e/ou acreditar em qualquer divindade que seja. Assim como existem os crentes, existem os descrentes. E o mundo é grande o bastante para comportar todos eles.

O convívio social é uma das tarefas mais difíceis que enfrentamos diariamente. Conflitos podem surgir a qualquer momento, até dentro de nossas casas, no seio familiar. Nem sempre temos paciência para com as pessoas, para com as coisas e para com determinadas situações. E é por isso que devemos nos policiar para que consigamos domar a raiva, os preconceitos, a intolerância e a impaciência, esses demônios que em nós habitam e por causa dos quais, às vezes, colocamos tudo a perder.

Não pretendia, mas acabei por vincular este artigo à efeméride que lembra os dez anos do Setembro Negro, aquele de 2001, ocasião na qual os Estados Unidos sofreram uma onda de ataques terroristas que ceifaram centenas de vidas; e que ficou marcado, em nossa história recente, como o mais espetacular, espantoso e macabro exemplo do que a intolerância para com o outro e o obscurantismo são capazes de engendrar.

Francisco de Goya (1746-1828), o magistral artista espanhol, dizia que "o sono da razão produz monstros". O grande mal que assola esse nosso tempo é que muitos não querem acordar.


(Artigo publicado também in: O Monitor [Garanhuns], setembro de 2011, Opinião, p. 02).    
                                   

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