9 de maio de 2012

Delícias de Brasília Teimosa

Por Clênio Sierra de Alcântara



Fotos: Ernani Neves







Encravado na Zona Sul do Recife, o bairro de Brasília Teimosa é um dos territórios de resistência de uma cidade que sempre carregou no seu bojo fortes impulsos de sedição.




 


Ontem, à noite, esse lugar, cuja história encerra tantas lutas sociais, deu as boas-vindas ao Festival Delícias da Comunidade. O evento, ocorrido na Colônia de Pesca Z-1, apresentou à imprensa a natureza da iniciativa, bem como o cardápio e os culinaristas escolhidos para compor essa edição do projeto que contempla também – pela segunda vez - a Bomba do Hemetério, um bairro da Zona Norte da capital pernambucana.



De minha parte foi um privilégio e tanto integrar a equipe multidisciplinar que mergulhou no universo dessa comunidade com vistas a sondar suas origens, perceber suas demandas e destacar suas inúmeras qualidades que, claro, não se resumem às delícias culinárias que podem ser encontradas ali.











Comer é um ato não só de sobrevivência, no sentido de consumo de matérias vitais para as engrenagens do nosso corpo. Comer é, também, um ritual de busca de prazer, de aguçamento dos sentidos. À prática culinária se ligam saberes cujas origens, muitas vezes, remontam a épocas imemoriais. A escolha e manipulação de ingredientes; o tempo certo de cozimento; a medida exata do acréscimo de temperos e ervas; os utensílios próprios para o preparo de dada receita; a apresentação dos pratos; os acompanhamentos; os segredinhos de cozinha... O preparo de uma comida resulta de uma conjunção não apenas de saberes, mas também de gostos, de crenças – religiosas ou não -, de acesso a esta ou àquela substância e de um verdadeiro envolvimento de quem cozinha com o alimento que resulta desse labor.





Dispostos numa grande mesa – e noutros suportes –, várias das iguarias que compõem o cardápio estiveram à disposição para degustação do público: o peixe a vinagrete do Quiosque do Cabo; a ova frita do Rosbife da Vera; a agulha frita do Império dos Camarões; o mingau de cachorro do Caldinho do Mago; os bolinhos de pescada branca do Caçarola; a pamonha da Cantina da Irmã; os crepes da La Crepe... Bom, eu gostei de tudo o que provei; e creio que o grande público que esteve presente no evento também, porque o movimento em torno dos quitutes era enorme.









É inegável o sentido de valorização que o festival desperta nos culinaristas das comunidades aonde aporta. Conversei com o Mago, do mingau de cachorro, e percebi o quão radiante ele se mostrava por estar participando de um evento deste porte. Aliás, valorizar o que cada comunidade tem de melhor, é mesmo um dos objetivos do Festival Delícias da Comunidade. O antropólogo Raul Lody, curador do evento, destacou que o festival busca divulgar os culinaristas, suas receitas e suas comunidades, “realizando um trabalho de preservação e salvaguarda desse importante patrimônio cultural e culinário de Pernambuco”.



Entre os inúmeros convidados que compareceram à Colônia de Pesca Z-1 estava a simpática Sônia Freyre, filha do meu mestre Gilberto Freyre. Filha de um Gilberto que certamente aplaudiria com muito entusiasmo um festival como o é o Delícias da Comunidade.

Ontem foi a avant-première desse verdadeiro circuito gastronômico que, a partir de amanhã, até o dia 20, o público em geral poderá conferir percorrendo as ruas de Brasília Teimosa.







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