6 de dezembro de 2012

Oscar Niemeyer: utopia e concreto armado

Por Clênio Sierra de Alcântara


Foto: internet








A ousadia da sinuosidade. O exagero da altura. A beleza das formas. O lecorbusierismo. A monumentalidade. O pragmatismo. A utopia comunista... Um dos maiores arquitetos do mundo, autor de algumas das criações mais espetaculares da história da arquitetura, o brasileiro Oscar Niemeyer, que faleceu ontem, foi, em vários aspectos, superlativo: nos projetos arquitetônicos espalhados pelo mundo afora, na defesa algo estúpida do comunismo e até no número de anos que viveu – 104 anos.

Oscar Niemeyer sempre figurou na lista de personalidades com as quais eu gostaria de ter mantido um dedo de prosa. Assim como as grandes obras literárias das quais ouvimos tanto falar que acabamos conhecendo seus enredos e personagens sem que nunca as tenhamos lido, as grandes obras arquitetônicas são ícones que marcam paisagens e se tornam por nós bastante conhecidas sem que nunca tenhamos sequer passado diante delas, porque suas imagens são por demais disseminadas em livros, revistas, calendários, internet, etc. Oscar Niemeyer traçou desenhos que, corporificados com concreto armado e muito vidro – lições do franco-suíço Le Corbusier -, pontuam inúmeras cidades, sendo os prédios do Plano Piloto de Brasília certamente seus trabalhos mais conhecidos pelo grande público.

O que o conjunto da obra niemeyeriana deixa ver é que o seu criador nunca levou em consideração as tantas críticas que sofreu, sobretudo, no que diz respeito a uma propalada falta de funcionalidade de seus edifícios, e àquilo que muitos consideram como inadequado para os trópicos, que é o uso desmedido do vidro nas fachadas e janelas. Gilberto Freyre, por exemplo, apesar de um entusiasmo inicial, talvez tenha sido o crítico mais ferrenho de tal obra, observando que em Brasília não houve a união das engenharias física, humana e social. Segundo o autor de Homens, engenharias e rumos sociais, faltou ao arquiteto – a ele e a Lucio Costa, no caso específico da Capital Federal – ouvir profissionais de outras ciências como sociólogos e antropólogos a fim de entender o organismo citadino como um todo e não apenas os seus prédios administrativos.

Pode-se dizer que Niemeyer foi sempre um discípulo, um devoto fervoroso da beleza e da monumentalidade, mas de modo algum da funcionalidade. Funcionalidade era acessório, não artigo que fundamentasse seus projetos. Quem observa o Museu de Arte Contemporânea de Niteroi fica extasiado com suas linhas elegantes tão bem casadas com o sítio onde foi erguido – o mesmo pode ser dito da Estação Cabo Branco, em João Pessoa, cuja forma também se harmoniza perfeitamente com o terreno. Já o Parque Dona Lindu, no Recife, é, a meu ver, um exemplo do que o arquiteto carioca fez de feio e de muito mau gosto.

Celebrado em todos – ou quase – os quadrantes do planeta como um arquiteto que sempre esteve à frente do seu tempo, Oscar Niemeyer, por outro lado, era adepto de uma ideologia do atraso - o comunismo. Por mais que alguns queiram pintá-lo como um homem preocupado com os despossuídos, com os miseráveis; por mais que queiram apresentá-lo como um humanista, ele foi, durante a maior parte de sua existência, partidário de um sistema que não fez outra coisa do que ceifar milhões de vidas sob a justificativa de que muitos têm de ser sacrificados para que o bem comum seja alcançado. Deve ser muito confortante disseminar uma ideologia retrógrada sem aderir de fato a ela. Deve ser deveras regozijante empunhar uma bandeira sem seguir os princípios que ela simboliza. Deve ser bastante conveniente ser comunista tendo os bolsos cheios de dinheiro.

Oscar Niemeyer se foi e com ele um modo muito particular de ver o mundo e de nele se deixar. Quem é maior: o homem ou a obra? Feliz ou infelizmente tudo passa sobre a terra.

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