8 de março de 2013

Cinquenta tons de roxo

Por Clênio Sierra de Alcântara




Não, não se fará aqui uma resenha da obra de E. L. James, que eu não li e, muito provavelmente, nunca lerei, porque o seu enredo não despertou em mim o menor interesse. Tratar-se-á neste artigo de algo que também diz respeito às mulheres, como os livros dessa autora, mas que nada tem de ficção.

Dia desses eu acompanhei, através da TV Brasil, uma ampla discussão que tratava do abuso sexual praticado contra as mulheres. O caso recente de estupro coletivo sofrido por uma jovem na Índia foi um dos enfoques dos debates. Pois bem.

Como se fosse uma doença de muito difícil tratamento – para alguns, trata-se de um mal incurável -, os abusos sexuais de que comumente são vítimas as mulheres de todas as faixas etárias – embora em número menor, indivíduos do sexo masculino também sofrem com esse tipo de violência – continuam destroçando vidas sem que políticas públicas consigam barrar o seu avanço. As estatísticas são assustadoras, mesmo quando se leva em conta que inúmeros casos não chegam a entrar no cômputo geral por uma série de razões: a vítima sente vergonha de procurar uma delegacia de polícia – isso quando existe uma delegacia por perto – para denunciar o agressor e/ou agressores; a vítima vive sob ameaça de morte e acuada pelo criminoso; a vítima não sabe como proceder para se ver livre de seu algoz; etc.

O caráter hediondo dos abusos sexuais ganha proporção ainda maior quando eles são praticados por parentes da vítima; muitas vezes por seu próprio pai; e por anos a fio. Em situações como essa a criança e o adolescente abusados sexualmente ficam ainda mais desnorteados, dizem os especialistas, porque não sabem mais em quem confiar, uma vez que até mesmo os membros de sua família deixam de ser para eles o porto seguro que julgavam possuir.

Quando me veio o ímpeto de escrever este artigo tratei de examinar edições de alguns periódicos que circulam aqui em Pernambuco, a fim de ver se encontrava no noticiário relatos de casos de abuso sexual. Não deu outra. Em sua edição do dia 8 de fevereiro passado o Aqui PE noticiou que dois irmãos foram presos no dia anterior por suspeita de abuso sexual contra duas adolescentes de 14 e 15 anos, que seriam filhas de um deles; as investigações apuraram que a garota mais velha era abusada desde os 9 anos; e que os crimes teriam ocorrido no município de Ipojuca, localizado na Região Metropolitana do Recife. A mesma matéria narrava ainda um caso ocorrido no bairro recifense do Ibura de Baixo; tratava-se de uma adolescente de 13 anos que revelou, em carta escrita para a sua mãe, que vinha sendo estuprada por um seu tio há dois anos (“Adolescentes abusadas por parentes”. In: Aqui PE, Recife, 8 de fevereiro de 2013, p. 3). Já no último dia 27 de fevereiro o jornal Folha de Pernambuco veiculou a informação de que um padre da Arquidiocese de Niterói, no Rio de Janeiro, foi indiciado sob suspeita de estuprar uma menina de apenas 10 anos; o crime, segundo a polícia, ocorreu durante três anos (“Padre indiciado por estupro no RJ”. In: Folha de Pernambuco, Recife, 27 de fevereiro de 2013, Brasil, p. 7).

Repugnantes sob todos os aspectos, os abusos sexuais que são praticados ainda com tanta frequência – sobretudo contra indivíduos incapazes de se defenderem – mesmo numa sociedade como a em que vivemos, onde a sexualidade não é reprimida, pelo contrário, é exaltada em prosa, verso, danças e tudo mais – e eu diria até que de modo exagerado e inconsequente -, demonstram que nenhum avanço tecnológico, nenhuma liberalidade, nenhum diálogo aberto sobre as coisas naturais do sexo, conseguiu fazer com que os impulsos fossem domados. Seríamos completamente ingênuos se pensássemos que a maior parte desses abusos é praticada por indivíduos sexualmente descontrolados, por portadores de desvios patológicos. Creio que não seja bem assim. Acredito que, na maioria das vezes em que ocorreu, esse tipo de crime foi premeditado por indivíduos plenamente conscientes de seus atos covardes; ou seja, não houve um rompante, um impulso, o agressor não agiu sem pensar; ele escolheu sua presa antecipadamente e partiu para o ataque, talvez, confiante de que a vítima seria incapaz de denunciá-lo; talvez, acreditando que não sofreria penalidade alguma.

Muito se tem falado das conquistas femininas em todas as esferas profissionais, inclusive nos cargos de liderança de grandes empresas e nos de administração pública. O que pouco se debate é o fato de tantas mulheres continuarem sendo vítimas de abuso sexual. A propósito eu tenho um amigo que tem um pensamento bem definido sobre a penalidade que deveria ser imputada a um criminoso dessa natureza: a castração. Segundo ele, já que as leis brasileiras são tão brandas – elas encarceram os infratores para logo depois soltá-los, como se eles nada de mal tivessem praticado -, ao serem castrados pelo menos eles não fariam mais vítimas quando retornassem ao convívio social. É um pensamento radical? É. Tem um quê de crueldade? Não, não vejo assim. Cruéis mesmo são todos aqueles que espancam frequentemente suas esposas e companheiras. Cruéis mesmo são todos aqueles que cometem abusos sexuais.

Infelizmente, para milhões de mulheres ao redor do mundo, este 8 de março será só mais um dia de suas vidas em que elas serão espancadas e violentadas sem dó nem piedade.





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