Por Clênio Sierra de Alcântara
Em sua seção “Voz do leitor”, o
Jornal do Commercio publicou, no último dia 19 de março, uma reclamação da
senhora Margarete Cristina P. Santos. Intitulada “Acesso a Itamaracá continua
precário”, a mensagem da leitora inicia-se deste modo: “Como veranistas da Ilha
de Itamaracá, infelizmente ainda não vimos a que veio o novo prefeito. A ilha
continua muito abandonada [...]”. E seguiu Margarete Cristina com seu rosário
detendo-se única e exclusivamente num ponto: a falta de manutenção da estrada
que dá acesso à porção norte da ilha, que sequer é pavimentada.
Quando li o depoimento da leitora
Margarete, meu pensamento fez um link com o artigo “Políticas de verão”, de
Adriana Méola, publicado pela revista República em fevereiro de 1998. Construído
de maneira bastante clara – e até didática eu diria -, o texto de Adriana
aborda a difícil realidade de vários balneários brasileiros, como Guarujá (SP),
Armação de Búzios (RJ) e Porto Seguro (BA), superprocurados no verão e nos
feriados, para abrigarem levas e mais levas de turistas sem possuírem
infraestrutura para tanto. Ela destacou casos em que o lugar, sem ter como
suportar a população flutuante, ficou sem água e luz, com trânsito
congestionadíssimo e filas gigantescas até para comprar pão.
Embora não tenha entrado na lista
dos balneários analisados por Adriana Méola, a Ilha de Itamaracá, que é um dos
municípios que integram a Região Metropolitana do Recife – dista a cerca de 50 km da capital – e está
situada no litoral norte pernambucano, apresenta quase que os mesmos problemas
enfrentados por aqueles outros destinos turísticos. Na alta estação a população
da ilha praticamente quadruplica; e com isso, nós – resido em Itamaracá há
quase treze anos -, moradores do lugar, pagamos o pato com o racionamento de
água, lixo em abundância nas ruas, barulho infernal de pessoas que desrespeitam
as leis e deixam o som ligado nas alturas noite adentro, e trânsito caótico.
A ausência de saneamento básico,
o racionamento de água e o acúmulo de lixo são, a meu ver, os pontos mais
críticos dessa equação aterradora. De um lado está a Companhia Pernambucana de
Saneamento (Compesa), uma das estatais mais execradas pela população devido ao
rol de malfeitorias por ela capitaneado: a Compesa não executa com eficiência a
instalação de redes de esgoto; a Compesa promove racionamentos absurdos de
água; a Compesa não atende de pronto quando acionada para conserto de
vazamentos e canos estourados; a Compesa escava ruas e avenidas e não tapa
devidamente os buracos que abre; enfim, a Compesa é um exemplar perfeito e
acabado de uma estatal ineficiente e obsoleta que há tempos deveria ter sido
privatizada. De outro lado estão os porcalhões: a maioria absoluta dos
veranistas e dos turistas que vem a Itamaracá vai embora e deixa o rastro de
sua passagem por aqui na forma de sacos e mais sacos de lixos que eles,
sacanas, não têm nem o cuidado de depositá-los num só lugar, e saem
espalhando-os aqui e ali, como animais que demarcam o território com
excrementos. (Não vou ser injusto: boa parte da população da ilha também merece o epíteto de porcalhona.)
Caros leitores, se duvidam do que
estou falando, sugiro que visitem Itamaracá ao término de um fim de semana e,
principalmente, de um feriado prolongado. Passem por lá e vejam em que estado a
ilha fica quando a turba vai embora.
Igreja de Nossa Senhora da Conceição, no bairro de Vila Velha |
Lá no fundo a Coroa do Avião vista de Vila Velha |
Quem, como eu, reside em
Itamaracá, tem plena consciência de que essa ilha-cidade não possui
infraestrutura adequada nem ao menos para comportar os seus moradores, que dirá
para os milhares e milhares de visitantes que vêm para cá. Itamaracá não possui
indústrias; o comércio dessa cidade é diminuto; e a Prefeitura vive
praticamente apenas do repasse do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). E
a vocação natural da ilha, o turismo, não é explorada devidamente.
Faz bastante tempo que a Ilha de
Itamaracá deixou de atrair turistas de verdade; turistas interessados em
conhecer seus monumentos históricos e não apenas suas praias; turistas que vêm
à procura de hotéis e pousadas; turistas que geram divisas para a comunidade
local. Nos últimos anos esse tipo de turista tem buscado principalmente
destinos como Porto de Galinhas, Serrambi e Praia dos Carneiros. O que restou
para Itamaracá foram os farofeiros, os suja-praias; um tipo de visitante que
não tem consciência de preservação ambiental e que não está nem aí para os
problemas de toda ordem que nós moradores enfrentamos. Destaque-se ainda que
foi a esse tipo irresponsável de visitante que coube a autoria da maioria dos
homicídios registrados na ilha de uns tempos para cá.
Muita gente não sabe que o FPM é
repassado para as prefeituras – preste bem atenção, Margarete Cristina, pois a
senhora fez questão de destacar “que mantém seus impostos em dia” – de acordo
com o número de habitantes que cada uma delas possui. Ou seja: as prefeituras
recebem recursos para cuidar do bem-estar - e elas nem conseguem isso – dos
seus habitantes! Como, então, poderão oferecer infraestrutura para um
contingente duas, três ou quatro vezes maior do que sua população? Qual a
solução? Em depoimento concedido à repórter Adriana Méola o urbanista Cândido
Malta foi enfático: “Nós não podemos esperar que a população pequena que vive
numa cidade de praia pague pelo preço de oferecer infraestrutura para milhões
de veranistas que vão lá poucos dias por ano [...] Estão recebendo um benefício
sem pagar nada por ele. Eu imagino uma espécie de pedágio – paga-se para usar a
praia”.
Este buraco existente na Estrada do Forte é mais uma obra da Compesa |
Sem dispor dos recursos
necessários para promover o desenvolvimento urbano e turístico da ilha – não é
de hoje que o Governo do Estado virou as costas para esta porção do litoral
norte pernambucano -, a Prefeitura reluta em pôr em prática um projeto
elaborado há vários anos, que estabelece a cobrança de pedágio para todo aquele
que queira conhecer este lugar. O discurso de que isso afugentará os turistas
não cola, porque as pessoas que viajam para um destino turístico não se furtam
em pagar taxas de preservação – e o caso de Fernando de Noronha é exemplar neste
aspecto -, desde que elas constatem que estão fazendo valer o dinheiro que
desembolsaram, que vão encontrar acomodações adequadas, atrações interessantes,
pessoas preparadas para recepcioná-las, organização e limpeza. Agora, passar a
cobrar pedágio e não investir em melhoria da infraestrutura vai, sim, afugentar
potenciais turistas. Urge que a cobrança de uma tarifa de acesso à ilha comece
a ser cobrada; e que, de alguma maneira, os visitantes sejam obrigados a levar
com eles o lixo que produzirem.
A situação atual em que se
encontra a Ilha de Itamaracá não é das melhores. Sucessivas e irresponsáveis
administrações municipais fecharam os olhos para as ocupações desordenadas e
invasões de áreas de Mata Atlântica; pouquíssimas ruas são calçadas e mesmo
nessas, o sistema de drenagem inexiste; os pontos turísticos carecem não apenas
de sinalização mas também de cuidados – há anos a população insiste em
depositar lixo a poucos metros da Capela de São Paulo; é um horror passar pelo
Engenho São João e ver roupas estendidas e trastes velhos espalhados por ali
por indivíduos que ocuparam um dos prédios -; as praias não possuem quiosques e
nem têm sido limpas com regularidade; não há saneamento básico na ilha; e até
mesmo o centro de informações turísticas – quem vai estacionar num girador, me
digam?! - vive permanentemente fechado. Será que Itamaracá não possui um plano diretor, uma lei de uso e ocupação do solo? As pessoas não podem construir onde quiserem; não podem montar barraca e/ou exercer qualquer atividade comercial onde e como bem entenderem. As cidades precisam de diretrizes que mantenham o seu ordenamento; e que sinalizem como o seu desenvolvimento deverá ser encaminhado. As cidades não são terras de ninguém, como certas pessoas pensam. Um mau exemplo: certo indivíduo está depositando carros velhos à margem da Estrada do Forte, próximo aos Chalés da Pedra Furada. Não acredito que ninguém da Prefeitura não tenha conhecimento de mais esse absurdo
Como eu disse noutra ocasião, não
creio que apenas a desativação das unidades prisionais existentes nesta
ilha-cidade, promoverá a solução de todos os seus males. Mais do que a retirada
dos presídios, Itamaracá precisará de um volume elevado de investimentos e
passar por um verdadeiro choque de administração, do contrário,
continuaremos a assistir à única e visível atividade que a Edilidade promove: a
coleta de lixo.
As belezas de Itamaracá precisam ser preservadas e divulgadas |
Continuo acreditando que
Itamaracá é uma ilha da qual estão sendo rapinados todos os seus tesouros.
muito boa reflexão, estive nas trilhas dos holandeses no dia 2 de jan de 2017. um potencial turístico muito bom porém sem nenhuma infraestrutura para o ecoturismo. estou realizando uma pesquisa de mapeamento dos pontos turísticos como subsídio ao turismo local. em breve divulgarei. marcondes marroquim. geógrafo UFPE
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