24 de outubro de 2013

Aparências e falsos pudores

Por Clênio Sierra de Alcântara

Eu prefiro ser
Essa metamorfose ambulante
Eu prefiro ser
Essa metamorfose ambulante
Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo
Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo.

                                                               Metamorfose ambulante. Raul Seixas



Dias desses um amigo me telefonou dizendo que, em que pese o tom confessional e por vezes sensível contido em grande parte dos meus textos, recorro a certos subterfúgios - a "cortinas de fumaça", foi a expressão exata que ele utilizou - para não me mostrar de corpo inteiro. O telefonema desse meu amigo de longuíssima data teve um propósito muito claro: expressar seu descontentamento para com algo escrito num dos posts deste blog que o magoou profundamente. Pedi desculpas na ocasião em que me ligou e torno a pedir neste momento: perdão, meu caro, porque eu sou de todo falível; e de maneira alguma eu escrevi pensando em magoá-lo, muito pelo contrário.

Desde que iniciei minha jornada neste espaço aberto eu não fiz outra coisa do que me revelar; de modo que, ter ouvido que recorro a "cortinas de fumaça" como fazem os ilusionistas, me incomodou deveras. Nunca quis ser o dono da verdade. Apesar da minha irascibilidade; apesar do meu caráter temperamental; apesar de minha intolerância para com uma série de pessoas, coisas e situações; enfim, apesar de tudo, eu reconheço claramente minhas limitações, todas elas, sem exceção; do mesmo modo que enxergo o que em em mim é luminoso e bom. Daí por que continuo otimista com a vida e me maravilho com as descobertas. Daí por que não aceito que me digam que eu escrevo recorrendo a disfarces, como se eu tivesse medo, um receio profundo de expressar o que penso e sinto, de narrar minhas inquietações e fraquezas, e, sobretudo, como se eu tivesse vergonha de ser o que eu sou.

Não escondo de ninguém que não creio em deus algum. Não escondo de ninguém que não faço distinção entre parceira e parceiro sexual. Não escondo de ninguém que sou órfão de pai - na verdade eu não sei se ele já morreu; mas para mim não faz diferença. Não escondo de ninguém que minha mãe frequenta a Igreja Universal do Reino de Deus. Não escondo de ninguém que minha avó é analfabeta. Não escondo de ninguém que fui reprovado em Matemática e perdi o ano na 6ª série.  Não escondo de ninguém que uma fulana, com a qual fiquei uma única noite, diz que eu sou o pai de uma menina e eu nunca quis conhecê-la. Não escondo de ninguém que não consumo bebida alcoólica  nem como carne vermelha. Não escondo de ninguém que não acompanho Copa do Mundo de Futebol. Não escondo de ninguém que não faço amor e sim sexo. Não escondo de ninguém que não sinto ciúmes de quem quer que seja. Não escondo de ninguém que uma vez votei no PT.

Assumir essa postura não significou sempre acertar e/ou despertar simpatia; o que mais me acontece é eu quebrar a cara, porque o que não falta nesse mundo são pessoas que preferem ouvir uma mentira que as deixe felizes a uma verdade que as entristeça e/ou as ponha de cara com a realidade. Mas eu não faço concessões; eu não abro mão de minha liberdade, porque eu me eduquei para isso. Por que ser cativo? Eu não tenho cartão do Bolsa Família. Eu não trafico drogas. Eu não me apropriei de dinheiro da Lei Rouanet. Eu não mantenho casamento de fachada. Eu não uso a religião para disfarçar os males que pratico. Eu não fraudo licitações. Eu não sou assassino. Eu não abuso sexualmente de crianças. Eu não recebo por fora. Eu não desvio verbas. Eu não sonego impostos. Eu não sou filiado a partidos políticos. Eu não defendo menores infratores. Eu não faço campanha em defesa de ditadores. Eu não milito contra o aborto. Eu não acompanho micaretas. Eu não leio Gabriel Chalita.

Não tenho paciência nenhuma para com quem não toma partido, não tem opinião, sempre tergiversa, sai pela tangente, não sai de cima do muro, se esquiva. Não tolero os subservientes, os hipócritas, os dissimulados, os fingidos, os reféns das aparências  e das formalidades e os que cultuam falsos pudores. Não suporto quem está na vida e tem medo de viver.

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