30 de janeiro de 2016

Personas urbanas (11)

Por Clênio Sierra de Alcântara


Prepare o seu coração pras coisas que eu vou contar
Eu venho lá do sertão, eu venho lá do sertão
Eu venho lá do sertão e posso não lhe agradar.
      
                                  Disparada. GeraldoVandré/Théo de Barros

              


Silêncio e reclusão. Considero o acontecimento de conhecer pessoas uma das coisas mais fascinantes desta aventura empolgante, trágica, encantadora e desafiadora que é a vida. Há quem tenha dito que qualquer indivíduo torna-se desinteressante depois de vinte minutos de conversa. Já me ocorreu de esse tempo demarcado ser bem mais curto: bastou que a criatura começasse a falar para que instantaneamente perde-se o encanto para mim. O contrário também acontece: vez por outra me deparo com pessoas que me enchem de tanto entusiasmo que horas a fio de troca de figurinhas não me fartam.

Aprecio tremendamente o conhecer gente. Apraz-me encontrar no outro a possibilidade da manutenção de um diálogo que diga de nós dois muito do que somos, sentimos, imaginamos, desejamos, conquistamos, perdemos, construímos, fomos, almejamos, gostamos, lemos, ouvimos, conhecemos, escrevemos, sofremos, sabemos, ignoramos, esquecemos, abandonamos, recuperamos, amamos, adoramos, seguimos, rejeitamos, ensinamos, aprendemos, recusamos... Sou capaz de dizer completamente de mim à pessoa que me escuta em pouquíssimo tempo. Elenco, sem receio de causar boa ou má impressão, o rol dos meus defeitos, as minhas inseguranças, as minhas falhas, o meu ranço egoísta, autoritário, impositivo e dominador, bem como as paixões que me movem e me lançam para frente rumo ao futuro que eu franca e sinceramente não temo.

Apesar de soar paradoxal, tendo em vista tudo o que eu escrevi até aqui, não sou e nem consigo ser, por maior apreço que eu tenha para com alguém, um bom cultivador de amizades. E penso que para indivíduos como eu, poucas coisas incomodam e aborrecem tanto como a insistência e, sobretudo, a cobrança que certas pessoas nos fazem por atenção e por uma companhia e cumplicidade que nem sempre temos interesse e/ou disposição para oferecer. E junto com esse tipo de cobrança e aporrinhação vêm acusações de que as tratamos com desprezo, com pouco caso e, principalmente, indiferença, quando, na verdade, agimos desapegados disso.

Há pessoas que vivem com um nível de carência afetiva tão grande que fazem dos seus amigos uma tábua de salvação. Definitivamente eu não sou assim. E nem me presto como essa matéria redentora. Mobilizo-me e ofereço ajuda, se for preciso, mas não me disponho a me manter em constante contato com a rede de pessoas que conheço e nem as vejo frequentemente, mas isso não quer dizer que eu não goste delas e que eu as abandonei.

Espanta-me ver como, fazendo uso de smartphones e outros aparelhos, tanta gente gaste horas do seu dia trocando mensagens. Eu fico me perguntando o que é que tanto essas pessoas têm a dizer umas às outras; e se elas não têm algo realmente importante com que se ocuparem. Acontece que eu não me enquadro nesse perfil; não sou um ser gregário; e, menos ainda, dado a ficar um tempo quase sem fim escrevendo coisinhas para quem quer que seja, porque isso logo me cansa e enfastia. Não troco a interação estabelecida pela palavra falada por nenhum desses aplicativos de mensagem de texto. Não insistam, por favor.

Eu ainda carrego dentro de mim o anseio do encontro tête-à-tête; da proximidade geradora de intimidade e cumplicidade; do contato físico; da visão de um sorriso se abrindo ou de uma lágrima se derramando; das despedidas arrematadas com beijos e abraços; da emoção e satisfação de estar junto. Por isso, vou continuar a caminhada da vida sem essa paranoia destes tempos em que tanta gente se vê obrigada a estar quase que permanentemente em contato com as pessoas que conhece real ou apenas virtualmente, fazendo um demorado uso de aparelhos de telefone celular tanto para falar como para trocar mensagens escritas.

Vou dizer mais uma vez para que não reste nenhuma dúvida: eu não quero tomar parte nisso. Respeitem a minha necessidade de silêncio e de reclusão.


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