Por Clênio Sierra de Alcântara
Incomodo-me sobremaneira
quando leio ou escuto alguém dizer que os cidadãos brasileiros – o povo, a
população, a sociedade – não lutam pela salvaguarda e proteção do patrimônio
histórico edificado. Dar-se o incômodo pelo seguinte: como se pode exigir tal
tipo de ação e/ou comprometimento da parte de um indivíduo que, assim como cada
um de nós, não foi educado para tanto? Sabe-se – e não é de hoje – que o que se
deu no âmbito geral da nossa sociedade foi justamente o contrário; o que sempre
ou quase sempre se alardeou é que “construções velhas” – principalmente se elas
estão abandonadas e deterioradas – devem ser demolidas para que deem lugar a
edificações novas.
A noção que o cidadão comum
tem do passado como algo de valor e/ou valioso está muito ligada a um caráter
venal. Por essa percepção, um anel de ouro do ano de 1920 tem um valor
considerável, mas uma carta assinada pelo escritor fulano de tal naquele mesmo
ano, não. Do mesmo modo, um relógio que foi fabricado em 1901 certamente deve
valer um bom trocado, mas um vestido usado na última festa havida na Ilha
Fiscal, não. Sem dúvida, a meu ver, é a questão da venalidade que determina o
apreço e/ou indiferença que a maioria das pessoas sente por determinados
artefatos de um tempo, digamos, remoto. Sob essa perspectiva, como esperar que
alguém levante a voz em defesa da conservação do prédio número tal, localizado
na rua que fica por trás da barbearia do Seu Antônio?
Muito mais do que uma ação
de Estado, a defesa, divulgação, conservação e salvaguarda do patrimônio
histórico, artístico e cultural de uma nação deve ambicionar ser um projeto de
integração nacional; as pessoas precisam ser chamadas, convocadas a tomar parte
nesse processo de uma maneira que se constitua, que se forme uma corrente
multiplicadora de um entendimento que ponha o patrimônio – o material e o
imaterial -, digo melhor, a defesa do patrimônio na prática diária de nossa
cidadania. Daí por que, acredito, se faz necessário que a chamada “educação patrimonial”
passe a integrar os conteúdos curriculares desde os primeiros anos da vida
escolar dos alunos, para que a familiarização com a temática se dê de forma
gradativa e natural e eles possam compreender e se apropriar de uma visão do
passado para além das aulas de História, identificando sobrevivências e
testemunhos de um tempo longínquo no presente cotidiano de suas vidas.
Nós precisamos de todas as
maneiras promover um discurso legitimador e proficiente em defesa do
patrimônio, para que dessa forma consigamos atingir e convencer o grande
público da importância da preservação; do contrário, continuaremos assistindo
aos repetidos casos de abandono, descaso e destruição fundamentalmente do patrimônio
edificado que pouco a pouco vai desaparecendo de nossas cidades sem que
esbocemos qualquer sinal de protesto ou insatisfação perante esse estado de
coisas.
Reajamos contra tudo que
queira se posicionar em favor do amesquinhamento e desaparecimento dos testemunhos
do nosso passado. Não sejamos cúmplices do império da indiferença e nem
militemos em prol da ignorância.
Nenhum comentário:
Postar um comentário