Por Clênio Sierra de Alcântara
É um fato amplamente
divulgado que a grande maioria da população mundial está se deslocando em ritmo
acelerado do campo para as cidades. Isso por si só deveria ser motivo para que os centro urbanos fossem preparados para receber as imensas e constantes levas de contingentes que a elas chegam
desejosos de ocuparem seus espaços. Contudo, o que se assiste ao redor do
planeta é a um descompasso entre as políticas públicas visando à melhoria das
cidades e as necessidades prementes de seus habitantes, gerando um
desequilíbrio que acaba causando em certa medida a deterioração do tecido
urbano.
Basta que olhemos ao redor
das ruas das cidades brasileiras, em geral – sejam elas pequenas, médias ou
grandes – e, da qual habitamos, em particular, para que constatemos como o
processo de urbanização tem seguido uma cartilha que prega e estabelece a
desordem pura e simples. Os espaços urbanos estão crescendo e se expandindo de
maneira desordenada e caótica fazendo com que as nossas cidades não consigam
ser preparadas para suportar demandas futuras.
O desrespeito às leis de uso
e ocupação do solo, cujo efeito principal é tornar a área urbana uma terra de
ninguém, revela a falta de prumo e de autoridade do poder público para coibir
os absurdos e os abusos que são encontrados em várias zonas do município.
Construções desafiando qualquer ordem e fundamento da arquitetura e da
engenharia subindo e descendo encostas, margeando rios, córregos e represas
delineiam um desenho horroroso de cidade e podem dificultar ainda mais qualquer
iniciativa destinada a reconfigurar os sítios por elas ocupados. Quando uma
cidade cresce sem ordenamento e planejamento ela encerra em si inúmeros
obstáculos para um projeto que vise a sua reestruturação.
Como bem sabem os habitantes
da maioria das cidades deste país, esses espaços são muitas vezes acometidos
por diversas deficiências que vão desde algo aparentemente simples e banal,
como o calçamento ou pavimentação de uma rua até a precariedade quando não a
ausência total de saneamento básico e de aterros sanitários. Mas não apenas
isso. À maioria de nossas cidades faltam também estudos que viabilizem sua
malha viária de modo que o caos no trânsito não sirva de desculpa para que o
tecido urbano seja constantemente retalhado com alargamento de artérias e
aberturas de outras vias numa completa submissão aos automóveis, sem que se
promova a melhoria do transporte público de passageiros; e faltam igualmente
políticas que ponham em discussão, junto à população, a preservação do seu
patrimônio histórico edificado, de suas áreas naturais, de seus espaços de
lazer e de seus equipamentos culturais, porque uma cidade não é só constituída
por residências, pontos comerciais e industriais, repartições públicas e pelo
vai e vem de veículos; ela é, além disso, um imenso e complexo universo de
convívio onde pessoas estabelecem as suas existências.
Cenário de muitos contrastes,
numa mesma cidade coexistem, por exemplo, diversas ocupações destinadas à
moradia: é a palafita que margeia um rio; é o condomínio de luxo erguido num
terreno privilegiado e em tese livre dos males que estão para além dos seus
muros; é o acanhado conjunto habitacional projetado pelo governo federal
destinado à população de baixa renda; é o edifício de alto padrão levantado à
beira-mar; é a favela que corajosamente ocupa morros e terrenos baldios. E,
afora todos esses tipos de morada, a cidade “abriga” um sem-número de
“desabrigados”, uma gente que se ampara sob viadutos, pontes, marquises e
prédios abandonados, levando uma vida de acentuada precariedade.
Administrar uma cidade, seja
ela do tamanho que for, é uma tarefa deveras desafiadora e repleta de entraves
e complicações, porque cabe à Municipalidade não somente gerir os recursos de
maneira que eles possam viabilizar as necessidades do dia a dia da imensa
cadeia urbana; é preciso, por outro lado, pensá-la para além do tempo presente,
adequando-a a necessidades futuras. Agora, é certo que existem demandas que a
Municipalidade sozinha não consegue dar conta e necessita de suportes financeiros
das esferas estadual e federal para executá-las.
Não podemos conceber um
ideal de cidade sem que nele caiba o harmonioso convívio dos seus habitantes
com o espaço construído, com o meio ambiente e até mesmo com a cidade que se
desenha em pranchetas, projetando-a para o futuro. A cidade ideal deve ser
aquela que fundamentalmente seja um lugar de abrigo e não de exclusão para quem
nela habita.
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