11 de junho de 2016

Urbanização caótica

Por Clênio Sierra de Alcântara




Foto: internet    A exemplo do que se verifica na expansão da favela do bairro do Morumbi, em São Paulo, a maior cidade do país, o crescimento desordenado das cidades brasileiras, em geral, acarreta danos por vezes irreparáveis ao ordenamento urbano



É um fato amplamente divulgado que a grande maioria da população mundial está se deslocando em ritmo acelerado do campo para as cidades. Isso por si só deveria ser motivo para que os centro urbanos fossem preparados para receber as imensas e constantes levas de contingentes que a elas chegam desejosos de ocuparem seus espaços. Contudo, o que se assiste ao redor do planeta é a um descompasso entre as políticas públicas visando à melhoria das cidades e as necessidades prementes de seus habitantes, gerando um desequilíbrio que acaba causando em certa medida a deterioração do tecido urbano.

Basta que olhemos ao redor das ruas das cidades brasileiras, em geral – sejam elas pequenas, médias ou grandes – e, da qual habitamos, em particular, para que constatemos como o processo de urbanização tem seguido uma cartilha que prega e estabelece a desordem pura e simples. Os espaços urbanos estão crescendo e se expandindo de maneira desordenada e caótica fazendo com que as nossas cidades não consigam ser preparadas para suportar demandas futuras.

O desrespeito às leis de uso e ocupação do solo, cujo efeito principal é tornar a área urbana uma terra de ninguém, revela a falta de prumo e de autoridade do poder público para coibir os absurdos e os abusos que são encontrados em várias zonas do município. Construções desafiando qualquer ordem e fundamento da arquitetura e da engenharia subindo e descendo encostas, margeando rios, córregos e represas delineiam um desenho horroroso de cidade e podem dificultar ainda mais qualquer iniciativa destinada a reconfigurar os sítios por elas ocupados. Quando uma cidade cresce sem ordenamento e planejamento ela encerra em si inúmeros obstáculos para um projeto que vise a sua reestruturação.

Como bem sabem os habitantes da maioria das cidades deste país, esses espaços são muitas vezes acometidos por diversas deficiências que vão desde algo aparentemente simples e banal, como o calçamento ou pavimentação de uma rua até a precariedade quando não a ausência total de saneamento básico e de aterros sanitários. Mas não apenas isso. À maioria de nossas cidades faltam também estudos que viabilizem sua malha viária de modo que o caos no trânsito não sirva de desculpa para que o tecido urbano seja constantemente retalhado com alargamento de artérias e aberturas de outras vias numa completa submissão aos automóveis, sem que se promova a melhoria do transporte público de passageiros; e faltam igualmente políticas que ponham em discussão, junto à população, a preservação do seu patrimônio histórico edificado, de suas áreas naturais, de seus espaços de lazer e de seus equipamentos culturais, porque uma cidade não é só constituída por residências, pontos comerciais e industriais, repartições públicas e pelo vai e vem de veículos; ela é, além disso, um imenso e complexo universo de convívio onde pessoas estabelecem as suas existências.

Cenário de muitos contrastes, numa mesma cidade coexistem, por exemplo, diversas ocupações destinadas à moradia: é a palafita que margeia um rio; é o condomínio de luxo erguido num terreno privilegiado e em tese livre dos males que estão para além dos seus muros; é o acanhado conjunto habitacional projetado pelo governo federal destinado à população de baixa renda; é o edifício de alto padrão levantado à beira-mar; é a favela que corajosamente ocupa morros e terrenos baldios. E, afora todos esses tipos de morada, a cidade “abriga” um sem-número de “desabrigados”, uma gente que se ampara sob viadutos, pontes, marquises e prédios abandonados, levando uma vida de acentuada precariedade.

Administrar uma cidade, seja ela do tamanho que for, é uma tarefa deveras desafiadora e repleta de entraves e complicações, porque cabe à Municipalidade não somente gerir os recursos de maneira que eles possam viabilizar as necessidades do dia a dia da imensa cadeia urbana; é preciso, por outro lado, pensá-la para além do tempo presente, adequando-a a necessidades futuras. Agora, é certo que existem demandas que a Municipalidade sozinha não consegue dar conta e necessita de suportes financeiros das esferas estadual e federal para executá-las.


Não podemos conceber um ideal de cidade sem que nele caiba o harmonioso convívio dos seus habitantes com o espaço construído, com o meio ambiente e até mesmo com a cidade que se desenha em pranchetas, projetando-a para o futuro. A cidade ideal deve ser aquela que fundamentalmente seja um lugar de abrigo e não de exclusão para quem nela habita.

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