Afora
o apreço incomensurável pela leitura e pelos livros, a vontade de saber e de
conhecer, a curiosidade, o gosto pelo que é mais comezinho e também pelo que se
compreende como sendo complexo, a disposição para escarafunchar papéis antigos,
o prazer pela escrita e a consciência da preservação da memória, outra lição
que aprendi com o meu mestre maior Gilberto Freyre foi a admirar e reverenciar
as pessoas de reconhecido talento, atuem elas em que segmento for.
Quando
me veio a notícia do falecimento do jornalista Geneton Moraes Neto, ocorrido no
dia 22 de agosto, a sensação que pesou sobre mim foi a da plena convicção de
que a morte outra vez levara consigo, adormecido em seus braços, um homem e um
profissional que entendia como poucos do ofício que desempenhava e fazia dele
uma referência precisa e necessária.
Enquanto
alguns perambulam pelas redações de jornais e televisões preocupados tão
somente em fechar a pauta do dia, Geneton fazia do seu labor diário uma rotina
de perscrutação dos fatos. Enquanto uns e outros preenchem páginas e páginas
com mais do mesmo, como que repetindo uma receita culinária, Geneton escrevia
buscando entrar no âmago dos acontecimentos. Enquanto outros tantos falam e/ou
escrevem sem se darem conta da importância do que estão a registrar, Geneton
primava por enriquecer o quanto podia suas abordagens porque desde a sua
elaboração mantinha o foco e o entendimento – e por que não dizer compromisso –
de que estava produzindo memória.
Quem
teve a oportunidade de ler algum dos seus textos ou de acompanhar alguma de
suas entrevistas exibidas pela televisão, pôde perceber e sentir como enorme
era nele o ímpeto, o impulso que o levava a buscar o esclarecimento todo que
fosse possível. Daí por que por vezes a sua gana e a sua habilidade para tentar
extrair revelações e/ou confirmações dos entrevistados pareciam que iam
descambar em agressões verbais e físicas da parte de quem estava sendo
inquirido. E isso se dava porque, tanto quanto suficientemente embasado e
seguro do conteúdo que fundamentava suas indagações, Geneton Moraes Neto
mantinha, andando sempre de mãos dadas, a audácia e a coragem de perguntar,
algo que não é tão comum de se encontrar na figura de um jornalista, porque
normalmente o que se vê é a repetição de obviedades quando não o total domínio
do entrevistado sobre o entrevistador.
Dono
de um tino e de um faro para o dissecamento de um fato bastante acentuados,
Geneton unia a essas qualidades o destemor e uma sagacidade admiráveis. Vê-lo
atuando de certa forma fazia com que eu tentasse relevar os aborrecimentos que
me acometiam quando eu me deparava – e ainda me deparo – com jornalistas
presunçosos que saem das faculdades sem sequer ter o domínio da língua
portuguesa e talvez pensando que a prática do bom jornalismo consiste em andar
por aí escrevinhando e/ou falando para públicos que estão desinteressados de
tudo.
Num
momento em que assistimos ao desenrolar de investigações policiais sobre casos
estarrecedores protagonizados por grandes figurões da nossa espezinhada e
afanada República e vemos profissionais da imprensa ser constantemente atacados
e demonizados pelos delinquentes e seus comparsas, como se os jornalistas
tivessem inventado os crimes e as inúmeras barbaridades em que eles se meteram,
a perda de um profissional do quilate de Geneton Moraes Neto é algo
extremamente triste e lamentável porque ele pertencia a uma estirpe de
jornalista que apurava com seriedade e perspicácia os fatos antes de
convertê-los em notícias.
Vou
repetir aqui o que eu disse ao meu confessor naquela noite em que no Rio de
Janeiro o aclamado jornalista pernambucano se despediu de todos nós: o Brasil
perdeu um dos seus grandes e admiráveis filhos.
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