Por Clênio Sierra de Alcântara
À memória de Tim Lopes, jornalista covardemente assassinado no exercício de sua profissão há exatos quinze anos
Quem vem acompanhando com
atenção as ações e os desdobramentos investigativos da Operação Lava-jato,
seguramente celebra o impacto positivamente arrasador que eles têm causado
sobre os atos criminosos praticados diuturnamente por políticos e empresários deste
país. São indiscutíveis o efeito moralizador e o sopro de esperança que os
executores da Operação lava-jato vêm imprimindo aos brasileiros de que algum
dia haveremos de viver livres se não de todo, de grande parte da corrupção que
desde sempre assola a nossa sociedade. Por outro lado, quando se atentam para
os detalhes das investigações – e residem precisamente nos detalhes as marcas
dos excessos cometidos – se percebe que, caso não nos mantenhamos vigilantes,
veremos que, sob pretexto de apoiarmos e aplaudirmos o julgamento e a prisão de
criminosos, abramos mão da decência e sobretudo do respeito aos direitos
fundamentais da pessoa humana elencados na Carta Magna da nação.
Não vou entrar aqui no
mérito das discussões em torno dos excessos cometidos pelas autoridades
policiais e judiciárias no efetivo campo do Direito, porque eu não tenho
cabedal para tanto. Os agentes, os delegados, os juízes e os procuradores
envolvidos com a Lava-jato fariam um bem tremendo ao Brasil caso se limitassem
às investigações e à correta aplicação de penalidades estabelecidas pelas leis
e deixassem de lado e evitassem as arbitrariedades, a divulgação precipitada de ações e a espetacularização
do seu modus operandi.
Talvez como meio de angariar
cada vez mais o apoio da sociedade à causa das ações anticorrupção que eles têm
empreendido, agentes da lei por vezes têm agido não somente como cumpridores
dos seus deveres, mas também como cidadãos que parecem estar acima de todos e
pudessem fazer muito além do que o arcabouço legal prescreve, agindo conforme
lhes dá na telha, atropelando ritos e ignorando o que vai dito na letra da lei.
Daí por que as desnecessárias conduções coercitivas, os Powerpoints da vida, o
show midiático da Operação Carne Fraca e, ainda há pouco, a sob todos os
ângulos repulsiva e condenável divulgação de fontes de um jornalista.
Muito embora eu creia que me
afaste até certo ponto da natureza jornalística propriamente dita, não posso
negar que aqui neste meu tão pouco visitado espaço, é jornalismo também sim, o
que eu venho exercendo há vários anos. Um jornalismo independente que é eivado
de idiossincrasias, mas que não apela, na medida do possível, para o mau gosto e o
baixo nível e nem para as agruras do mundo cão; que não teme o tom raivoso e carniceiro que
impera na rede mundial de computadores; que não é patrocinado ainda por quem
quer que seja; e que, por fim, é praticado por alguém que fundamentalmente foi
educado para a prática da liberdade: liberdade de se expressar; liberdade de
pensar; liberdade para dizer sim; liberdade para dizer não; liberdade para gritar; liberdade para contestar. Podem dizer que a minha escrita é precária e ruim;
que o que eu exponho neste blog é dispensável e irrelevante; que minhas ideias
e pensamentos são rasteiros e tudo o mais. Podem dizer o que quiserem, porque
não são os impropérios e nem os elogios que impulsionam a minha pena: o que
absolutamente me move nesse exercício é a minha vontade de dizer e a minha liberdade de
expressão.
O artigo 5º do Capítulo I da
Constituição Federal estabelece, entre os direitos e deveres individuais e
coletivos, que “é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o
sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional”. Apesar disso,
homens da lei, uma gente que deveria defender e cumprir tenazmente o que estabelece a Carta Magna,
atropelaram o fundamento do artigo 5º, divulgando fontes do muitíssimo afiado,
lido e preparadíssimo jornalista Reinaldo Azevedo, praticando, junto com isso,
outra arbitrariedade, que foi expor algo que nada tinha a ver com as
investigações então em curso.
Existem pessoas neste país que dizem zelar
pela moral e pelos bons costumes e, por outro lado, de maneira alguma toleram a
pluralidade de ideias. E é gente assim que pisoteia em Reinaldo Azevedo, quando
ele discorda das hostes petistas. É gente dessa natureza que esbraveja contra
Reinaldo Azevedo quando ele aponta desmandos cometidos por agentes da lei. É gente
dessa qualidade que ataca Reinaldo Azevedo por ele ter clareza de pensamento,
ideias próprias e nenhum receio de expor e defender aquilo em que acredita.
As forças que se unem contra
a prática do jornalismo lançam mão de vários meios e recursos visando o
silêncio do narrador. A intimidação e as ações covardes são postas como uma
declaração explícita de quem acredita piamente no poder do convencimento feito
à base de ameaças de toda espécie, inclusive de morte. Em vez de
contra-argumentar o que foi dito e/ou publicado, os que são mencionados na
narrativa tratam de toda forma desqualificar quem o disse e/ou escreveu sem
mostrar provas de sua inculpabilidade.
Ficou mais do que claro no
episódio de divulgação de fontes jornalísticas feita por agentes da lei, que
não se tratou de uma ação destinada a somente prejudicar a atividade de
Reinaldo Azevedo. O caráter nefando da execrável ação se portou como um recado
endereçado a todos nós que, de uma maneira ou de outra, exercemos o exercício
público da escrita e da fala.
Ao longo da história da
humanidade muitas vezes escrever significou discordar de pensamentos e ideias e
lutar contra forças opressoras. Continuemos empenhados em fazer saber sobre
aqueles que tentam distorcer e mascarar a realidade. Duvidemos do que nos é
revelado como verdade inquestionável. Não nos aliemos com os foras da lei. E jamais silenciemos, porque silenciar é
ser conivente com os agentes da vontade autoritária. Escrever sempre foi e vai
continuar sendo um desafiante - e por que não dizer? - libertário ato de coragem.
(Artigo publicado também in Informa Garanhuns [Garanhuns], junho de 2017, nº 10, Opinião, p. 2).
(Artigo publicado também in Informa Garanhuns [Garanhuns], junho de 2017, nº 10, Opinião, p. 2).
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