Por Clênio Sierra de
Alcântara
Foto: Divulgação Márcio Mendes, um verdadeiro operário do showbiz nacional, continua esbanjando simpatia e levando alegria e suingue por este país afora |
Não dava para ficar
indiferente: todas as vezes que anunciavam a apresentação do Trio Los Angeles
nos programas de TV da fervilhante década de 1980, eu, então um menino, corria
para ver aquelas duas mulheres e aquele homem entre elas formando um conjunto
tão bonito e harmonioso que cantava e dançava de modo supersensual e
envolvente. A bem da verdade, eles eram anjos bem endiabradozinhos.
Criado em 1981 e lançado em
1982 pela gravadora RCA que, inclusive, escolheu o nome do grupo, o Trio Los
Angeles era formado pelo requisitado modelo Márcio Mendes, por sua irmã Ana
Maria e por uma amiga de ambos, Cléo Ferreira. A estreia aconteceu no programa Almoço com as Estrelas, apresentado por
Lolita Rodrigues e Airton Rodrigues em 22 de abril de 1982, na TVS/SBT. O
estouro deles aconteceu ainda naquele ano com o sucesso “Vamos dançar mambolê”,
uma composição de Lucas Robles, Hélio Santisteban e Ann Chris que era o lado A
do compacto que trazia no lado B nada menos do que o clássico “O xote das
meninas”, de Luiz Gonzaga e Zé Dantas. Na esteira desse primeiro hit, vieram os
inúmeros convites para aparecerem nos programas de rádio e de televisão e para
fazerem shows por este país afora.
Dois anos depois, coroando,
por assim dizer, uma popularidade muitíssimo expressiva e impressionante, a
música “Transas e caretas” (Michael Sullivan e Paulo Massadas) foi por eles
gravada como tema de abertura da novela homônima da Rede Globo, exibida na
faixa das 19:00 h.
Ao longo de todos esses anos
o Trio Los Angeles teve várias formações, mas o irrequieto Márcio Mendes sempre
permaneceu como uma espécie de espinha dorsal do grupo, buscando não apenas
manter a chama da música acesa, como também ampliando os seus horizontes de
atuação: de 2006 a 2009, por exemplo, ele apresentou o programa O Melhor da Vida com Márcio Mendes, no
NGT (canal UHF de São Paulo); e chegou a tentar uma carreira solo.
Nascido Márcio Antônio
Mendes, em 13 de setembro de 1949, na cosmopolita cidade de São Paulo, no bairro
da Lapa, esse verdadeiro operário do
showbiz nacional permanece percorrendo o Brasil inteiro levando sua ginga, seu
bom-humor e sua alegria para onde é chamado.
*
* *
No mesmo dia em que foi
exibida a derradeira edição do Vídeo Show
– no último dia 11 de janeiro, dia do meu aniversário – eis que, como se fosse
uma atração vinda direta do Túnel do
Tempo, um dos quadros daquele programa, eu fui apresentado por meu amigo
Sol Esoje, numa festa no Recife Antigo, ao famoso Márcio Mendes. Nossa, que
barato! Desculpem o clichê, mas enquanto eu me mantive ao lado dele trocando
figurinhas, um filme foi passando pela minha cabeça; e me chegaram à lembrança
imagens do Trio Los Angeles se apresentando no Cassino do Chacrinha. E dois dias depois desse para mim agradável e
caloroso encontro, eu fui prestigiar a apresentação dele como mestre de
cerimônia do Concurso Miss Terceira Idade, na Ilha de Itamaracá, evento esse
que integrou um conjunto de atividades voltadas para as comemorações dos 75
anos de vida da mais ilustre moradora daquela ilha, a cirandeira Lia de
Itamaracá. Ao término do concurso, Márcio Mendes pacientemente me concedeu uma
entrevista, enchendo a tarde daquele domingo com essa coisa muitíssimo
prazerosa que é o de se sentir pleno na vida, algo que ele deixou transparecer
durante todo o tempo em que permaneceu ali comigo. Aos 69 anos de idade, Márcio
Mendes continua sendo um artista que se dedica com galhardia e entusiasmo ao
seu ofício, esbanjando carisma e alegria por onde passa. Não tenho dúvida de que, para ele, a música seja o principal combustível de sua vida.
Como
foi a sua carreira de modelo?
Eu comecei como modelo
participando de um concurso de beleza. O Silvio Santos tinha um programa na
antiga TV Tupi, em São Paulo, e elegeu o homem mais bonito do Brasil. Isso foi
nos anos 60. Eu tinha 18, 19 anos. E eu fui candidato do concurso e fiquei em
segundo lugar. Você vê que coisa incrível, né? Aí eu parti para a moda, com
vinte e poucos anos. Virei um modelo, um modelo de sucesso. Comecei como modelo
fotográfico fazendo vários comerciais de foto e comerciais de filmes de
publicidade também, inclusive, cremes hidratantes. Aí eu virei um manequim
famoso. Fui para a Mesbla. Você lembra da Mesbla?
Havia
uma Mesbla bem grande no Recife.
Fizemos a Mesbla Brasil. Foi
quando eu aprendi a me comunicar com o povo, porque a Mesbla fazia o desfile
totalmente bem popular, entendeu? Inclusive aqui, no Recife. Eu lembro que a
gente fez durante três anos a turnê no Brasil inteiro. Depois de muito sucesso,
muitos desfiles na Fenit (Feira Nacional da Indústria Têxtil considerada a
precursora da São Paulo Fashion Week) no Rio de Janeiro, no Brasil inteiro, eu
fui convidado com a Ana e com a Cléo, as primeiras, para fazer um teste na
gravadora RCA para lançar o Trio Los Angeles. Isso foi no dia 15 de novembro de
1981. Fizemos o teste e fomos aprovados para montar o Trio Los Angeles.
Gravamos o “Mambolê”, que vendeu 4 milhões de cópias, que eu ganhei até um
carro de presente na época, um carro esporte da gravadora. Comecei a fazer show
e comecei a investir na minha carreira, entendeu? Junto com as meninas, a Cléo
e a Ana. Foram quinze anos de sucesso, muito sucesso. Aí eu comecei a fazer um
trabalho solo, eu tenho um trabalho solo bacana gravado, mas não rolou o solo,
porque a minha marca é o Trio Los Angeles. Quando foi mais ou menos há uns
vinte anos atrás, eu remontei o trio com duas meninas novas. Aí eu estou hoje
com o Trio Los Angeles, que é um sucesso. Tenho minha banda, meus músicos,
tenho dois backing vocals, tenho duas
bailarinas. É um show maravilhoso, é um show grande.
O
Trio Los Angeles é um dos ícones incontestáveis do cenário musical brasileiro
da década de 80. Houve dificuldades para se firmar num período de diversificada
e numerosa produção no universo da música?
Eu tive problemas nos anos
80 porque as gravadoras não investiam em produção de visual. Como eu vinha da moda com a Cléo
e com a Ana, eu comecei a fazer moda com música. Então a gente, sem querer, se
destacou na música com a roupa. Era um visual totalmente maravilhoso,
diferente. Inclusive, ajudou muito a me tornar conhecido no Brasil inteiro.
Foto: Sol Esoje Eu e Márcio Mendes na tarde em que ele me concedeu esta entrevista: alegria e bom humor a toda a prova |
Impossível
falar do saudoso Cassino do Chacrinha
e não lembrar das apresentações do seu grupo nele. Havia disputas nos
bastidores para conseguir se apresentar no programa? Houve alguma coisa
engraçada nesse programa ou em outros que ocorreu e não veio a público?
Olha, a gente fazia muito
sucesso. E naquela época já existia uma palavra chamada Ibope, e o Trio Los
Angeles sempre deu muito Ibope. Tanto é que a gente fazia muito televisão e as
TV’s disputavam a presença do Trio Los Angeles. Da minha parte, nada era pago.
A minha gravadora na época era a RCA, uma multinacional, né? Uma gravadora rica
e investiu muito pouco na gente, porque a gente fez muito sucesso. A gente caiu
no gosto do público rapidamente. A gente recebeu vários discos de ouro, de
platina, de brilhante. Tudo isso eu tenho na minha casa guardado, eu tenho uma
sala só disso. E eu tenho amigos, né? Produtores musicais...
Uma
coisa engraçada que aconteceu.
Nos programas de TV muita
coisa engraçada aconteceu, mas não me vem à memória. Tipo assim, por exemplo,
as meninas usavam uns amarrados e alguns amarrados desamarravam e elas ficavam
de calcinha e sutiã. Aí tinha de gravar de novo o programa, não era ao vivo.
Uma coisa engraçada, por exemplo, aconteceu no Viva a Noite, do Gugu. A gente fez o primeiro programa. E eu lembro
que eu escorreguei no programa. Estavam o Trio Los Angeles e Fafá de Belém.
Fafá de Belém foi quem me levantou. Uma coisa muito gozada. O Gugu fez o
lançamento do Viva a Noite com o
Trio Los Angeles e com Fafá. E eu lembro que eu escorreguei inclusive, sabe,
num... Tinha uma máquina de fumaça na época, que soltava um líquido. Eu pisei
naquele líquido e escorreguei, eu, Ana e Cléo.
Na
hora de se apresentar foi?
Na hora de se apresentar. Só
que o programa era gravado. Mas a coisa foi tão engraçada que isso foi pro ar.
E
essa história do interior de Minas Gerais?
Nós fomos fazer um show em
Uberaba, no Triângulo Mineiro. E lá nós tínhamos um público de 90 mil pessoas
numa feira agropecuária. Noventa mil pessoas para ver o Trio Los Angeles. Era
uma coisa monstruosa. Até hoje tem. Eu lembro até que, quando acabou o show...
Assim, o meu empresário colocava o meu quarto ao lado do quarto de Cléo e de
Ana. E elas começaram a gritar: “Márcio, pelo amor de Deus, me socorre!”. Tinha
dois caras dentro do guarda-roupa. Pegaram as duas nuas, na hora em que elas
estavam tirando o sutiã, imagine. Aí vieram os seguranças, o gerente do hotel.
E os caras foram postos pra fora. Eram garotos de 15, 16 anos. De repente, sei
lá, era uma atração de sexo mesmo.
No
auge da carreira vocês faziam muitos shows?
Nós fazíamos muitos shows,
muitos. Eu não tinha tempo pra nada. Nós tínhamos avião particular. Se eu, por
exemplo, tivesse o sucesso hoje que o Wesley Safadão e a Ivete Sangalo têm, e
eu fazia esse sucesso com o Trio Los Angeles, eu estaria trilionário. Só que na
minha época não tinha esses cachês milionários que tem hoje.
Trabalhou
muito sem ganhar muito, né?
Não, a gente ganhava bem,
mas não como hoje. Eu vou te dar um exemplo. O Pelé, por exemplo, na época dele
não tinha cachê milionário como tem o Neymar hoje. Eu tenho minhas coisas, mas
eu não sou milionário. Eu tenho um carro bacana, eu tenho uma casa bacana, mas
eu não sou milionário. Eu sobrevivo do meu trabalho ainda. Mas sou feliz. Eu amo o
que faço.
É
indiscutível que, afora o tom sensual das músicas de vocês, havia também um
apelo carregado de certo erotismo nas roupas que você e principalmente as suas
companheiras de grupo usavam. Considerando este ponto você percebia que isso
facilitava a entrada do Trio Los Angeles nos programas de TV? As garotas e
mesmo você sofriam muito assédio do tipo: “Você só vai se apresentar no
programa se sair comigo”?
Não, isso não acontecia. Jamais.
Sabe por quê? Era assim: a sensualidade delas era eu que fazia. Aquelas roupas
todas que vocês viam, eu tinha uma costureira só para nós, contratada. Ela construiu
uma casa nos anos 80, nos anos 90, só fazendo roupas para nós. Ela trabalhava
bastante. A gente pagava a ela bem, entendeu? As roupas sensuais que você via
não eram vulgares. Eram apenas umas roupas transparentes. Se você for pegar as
capas dos meus discos, por exemplo, do meu primeiro lp, eu estou com a Cléo e a
Ana no mar assim (faz o gesto), com a mão levantada, e elas estão com o seio de
fora com uma camisa social branca. É muito sensual aquilo. Mas era uma coisa
que, por exemplo, na época era um escândalo realmente, mas não acontecia
assédio tipo assim: “Quero sair com você”, de diretor de programa. Também ele
sabe pra quem vai pedir. Tinha cantoras que saíam, elas não saíam. E era a
minha irmã, né?
Também
tinha isso, você cuidava dela.
Veja bem, eu nunca tolhi a
Ana. Sou bem mais velho que ela. Eu cuidava dela, mas eu nunca cortei dela o
que ela queria fazer. Se ela quisesse sair, por exemplo, com diretor de
televisão ou de gravadora, que saísse, era problema dela, entendeu? Agora, elas
não tinham essa imagem de meninas que saíam em troca de alguma coisa.
Com
inúmeras formações ao longo do tempo, o Trio Los Angeles permanece em
atividade. Como você se vê inserido num cenário musical dominado pelo que se
convencionou chamar de sertanejo?
Veja bem, o meu trabalho
hoje não é um trabalho, por exemplo, assim, eu não sou um artista que dependo
hoje de fazer sucesso por causa do sertanejo. Eu não sou nem MPB. E não sou
forró...
Você
se encaixa como musicalmente?
Eu me encaixo numa música
latina popular brasileira. Pega o forró que eu cantei “Alô loirinha do cabelo cacheado”
(cantando). Tem um arranjo latino-forró, entendeu o que eu estou dizendo? O que
eu faço é um trabalho totalmente latino moderno. Agora, eu adoro forró. Não adianta.
E eu tenho uma banda... Eles são maravilhosos. Eles são gente boa. Eles me amam
e eu amo eles. A abertura do meu show é maravilhosa. Produção linda, que esse
santo que está aqui faz para mim. Vagner (Fabris) cuida da minha carreira, do
meu trabalho. E não é estrela, é humilde. O que você pedir ele vai te fazer. Então
eu aprendi que todo mundo que trabalha comigo tem de ser como eu sou, porque se
não, não fica.
Como
ocorreu o seu ingresso na TV como apresentador e por que você se dedicou a um
programa voltado para os idosos?
O programa na NGT veio por
causa dos concursos. O programa foi uma consequência dos concursos. Eu fazia
júris. Lembra do Jair Rodrigues, o cantor? Lembra de um cara chamado Odair
José? Nós três fazíamos júri para alguns concursos que tinha na Grande São
Paulo, mas era tudo malfeito.
Concurso
de terceira idade?
Em São Paulo isso já existe
desde os anos 90. Só que era uma coisa malfeita, quando Vagner me chamou para a
gente começar a fazer os concursos e organizar com as Prefeituras.
Eu
sei, porque o nosso amigo em comum Sol Esoje me contou, que você adora
Pernambuco. O que é que neste lugar lhe atrai tanto?
Adoro. Acho que o que me
atrai em Pernambuco é a Ilha de Itamaracá. Eu morei há dez anos no Recife. Meu empresário
vendeu oito shows pra mim, Vagner com outro empresário que eu tinha. E eles
quiseram vir pra cá. Aí eu fiquei um mês. Passou um mês e eu disse: “Não vou
embora mais”. Acabei alugando um apartamento no Recife, em Boa Viagem. Então moramos
eu, Vagner e Sara (Sara de Itamaracá, produtora). Felipe (sobrinho-enteado de
Sara) era menino ainda. Só que eu fiquei um ano aqui e a coisa não rolava pra
mim aqui, entendeu? Porque assim, as bandas daqui, na época, as bandas que
estavam aqui elas, não sei te explicar, o mercado pra mim não abria. Aí tive
que ir embora. E aí eu falei: “Já que cheguei a São Paulo eu vou fazer a ‘melhor
idade’”. Eu adoro a ilha. A ilha é linda, é maravilhosa. Eu quero ajudar muito
a ilha, sabe? Eu quero cuidar da ilha. Eu acho que eu vou conseguir ajudar a
ilha. Nós temos que eleger um prefeito que conte comigo também um dia. Eu quero
ajudar a ilha.
São
muitos anos cantando e se apresentando no palco. Quem são seus ídolos e
influências no campo da música?
Desde criança eu sempre fui
um cara muito dançante. Eu gosto de cantar, de dançar, de alegria. Na escola eu
sempre participava de coral. Eu era um líder. Sempre tava na frente. Sempre toquei
piano um pouquinho. O meu irmão tocava acordeon e eu cantava junto com ele,
desde músicas latinas até música sertaneja, mas tudo no moderno. Sou um cara assim
totalmente eclético. Gosto de tudo que é música. Um detalhe: todo o meu
trabalho é voltado para aquela alegria de dança, de música, música para cima. Várias
pessoas cantando junto comigo também eu acho bacana. Nos meus shows eu tenho
participação assim de 50% com a plateia. É mais ou menos isso. Eu sou um cara
feliz. Adoro música. Adoro viver. Meus ídolos são vários, mas os principais que
eu mais me inspiro são Ney Matogrosso, que é um showman, e Maria Alcina, uma cantora dos anos 70 que eu sempre
curti muito; eu acho ela maravilhosa; e ela é uma cantora latina-brasileira. Eu
me inspiro muito neles, até nos trejeitos, muitas vezes, nos meus shows.
Márcio
Mendes o que é ser artista para você?
É isso o que eu estou sendo
aqui, agora. Ser amado por você. Ver o seu olho no meu show emocionado. Você tava
quase vertendo lágrimas. É mentira? Ver você me entrevistando agora com esse carinho,
com esse amor. Eu pegando na sua mão. Você ser meu amigo, entendeu? E você não
esquecer de mim. Isso é ser artista. É amar você do jeito que você me recebeu
ontem aqui na praia, a mim e ao Vagner. É isso. Ser artista é você ser
respeitado, ser querido, ser amado.
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