Por Clênio Sierra de Alcântara
É de autoria do cearense e
marxista Rui Facó um dos estudos mais conhecidos que tratam do cangaceirismo. Intitulado
Cangaceiros e fanáticos: gênese e lutas
(o exemplar de minha biblioteca é da 9ª edição, que foi lançada pela Editora
Bertrand Brasil, do Rio de Janeiro, em 1991), o livro tece considerações e
sustenta teses que englobam tanto a natureza do surgimento dos cangaceiros como
do fanatismo religioso nos sertões do Nordeste. Eventos como o massacre havido
no Arraial de Canudos, de Antônio Conselheiro, ainda em fins do século XIX, na
Bahia, as diligências para exterminar os cangaceiros da década de 1930 em
vários estados e a ação para fazer desaparecer do interior do Ceará a
comunidade do Beato Zé Lourenço, um dos seguidores do Padre Cícero, no sítio
Caldeirão, também na década de 1930, aparecem nessa obra por demais esclarecedora
e fascinante. Na avaliação de Rui Facó o cangaceiro e o fanático eram “os
pobres do campo” que principiaram a sair de uma “apatia generalizada” e se
lançaram em lutas que começaram a adquirir “caráter social”: “Não era ainda uma
luta diretamente pela terra, mas era uma luta em função da terra – uma luta
contra o domínio do latifúndio semifeudal” (Op. cit. p. 45).
Segundo o autor foram a fome e a miséria, que aumentam nos longos períodos de estiagem, que provocaram a reação dessa gente e a formação de grupos de cangaceiros que “lutam de armas nas mãos, assaltando fazendas, saqueando comboios e armazéns de víveres nas próprias cidades e vilas”, e o surgimento de seitas de místicos – fanáticos – em torno de um beato ou conselheiro, “para implorar dádivas aos céus e remir os pecados, que seriam as causas de sua desgraça” (Op. cit. p. 37).
Segundo o autor foram a fome e a miséria, que aumentam nos longos períodos de estiagem, que provocaram a reação dessa gente e a formação de grupos de cangaceiros que “lutam de armas nas mãos, assaltando fazendas, saqueando comboios e armazéns de víveres nas próprias cidades e vilas”, e o surgimento de seitas de místicos – fanáticos – em torno de um beato ou conselheiro, “para implorar dádivas aos céus e remir os pecados, que seriam as causas de sua desgraça” (Op. cit. p. 37).
Cada coisa em seu lugar: o Museu do Cangaço de Serra Talhada é um exemplo de como um projeto museológico bem pensado valoriza tanto as peças do acervo como o ambiente em que elas são dispostas |
Terra de nascimento do mais
famoso cangaceiro que existiu, Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, a
cidade de Serra Talhada, situada no sertão pernambucano, abriga em parte de um prédio
que um dia foi uma estação ferroviária, o chamado Museu do Cangaço, que eu fui
conhecer no dia 27 de novembro de 2015 em companhia do meu amigo Beto Hees.
Às vezes me escapa, claro,
mas normalmente eu me apego muito a detalhes outros de instituições museais,
tais como condições do prédio, projeto museológico e conservação do acervo, sem
me ater às peças postas em exposição. Dito isso, eu me vi tomado por um vivo
entusiasmo ao entrar no Museu do Cangaço - que é também um centro de estudos e pesquisas sobre o cangaço - e me perceber como visitante
satisfeito por estar num ambiente que, embora diminuto, é extremamente bem aproveitado,
contando com um atraente projeto museológico que faz com que as peças do acervo
sejam plenamente vistas pelo visitante e componham um cenário verdadeiramente
instigador. A estrutura foi tão bem pensada e arquitetada que ali eu encontrei
até uma lojinha que entre suvenires disponibilizava livros sobre o cangaço. Gente,
isso parece ser mero detalhe, mas não é; eu já conheci museus grandes que não
disponibilizavam sequer um folder dizendo da instituição, que dirá uma loja
como a que eu encontrei nesse museu de Serra Talhada.
O acervo do Museu do Cangaço é grande, considerando que não há ali espaço para acomodar uma imensidão de peças. Esqueci
de perguntar se a instituição dispunha de uma reserva técnica que
possibilitasse fazer, de tempos em tempos, mostras de objetos diferentes. O que
vi ali exposto foram armas de fogo, vestimentas de couro, arte sacra, fotografias, recortes de jornais e utensílios domésticos que compreendiam e/ou diziam do universo existencial dos
cangaceiros.
Livros, chapéus, bonés e outros suvenires comercializados na lojinha do museu |
Beto encarnando um cangaceiro |
Na abrasadora Serra Talhada,
cidade que parece ter um sol particular e todinho só para ela, o Museu do
Cangaço é uma dica imperdível de visitação.
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