Seguramente não é por acaso
que num desgoverno que zela cuidadosamente pelo culto à ignorância, como se
isso fosse item de pauta do Produto Interno Bruto, o Ministério da Educação -
e, por extensão, toda a área da cultura, da arte e do patrimônio histórico –
figure como a pasta governamental mais desprestigiada, espezinhada e humilhada
pelo mandatário desta República Antidemocrática Bolsonariana.
Num país de dezenas de
milhões de analfabetos de todos os matizes, desde os que nada sabem de
letramento até os que conseguem ler, mas pouco ou nada compreendem daquilo que
leram. Num país no qual são bastante elevadas as taxas de evasão escolar nos
níveis médio e superior. Num país onde se encontram aos montes, vergonhosa e
estarrecedoramente aos montes, escolas mal, muito mal aparelhadas tanto física
como humanamente. Num país, enfim, que desvaloriza sobremaneira a pessoa e a
profissão do professor, do mestre, daquele que nos ensina a compreender e a ler
o que não só dizem as letras e as palavras, como também o mundo em si, a
Educação – assim mesmo, com inicial maiúscula – está sendo tratada pelo senhor
Jair Bolsonaro como artigo de última necessidade.
Rebaixado a Ministério da
Deseducação, a pasta ministerial que deveria figurar como uma espécie de farol
do verdadeiro progresso socioeconômico do país, vem sofrendo todo tipo de
desprezo e de descaso, como se fosse algo apenas acessório, supérfluo e menor e
não uma instância fundamental para que nós vislumbremos um bom futuro e, de
alguma maneira, apostemos e acreditemos que este país tem jeito e que a vida
vai melhorar, porque é a educação que transforma; é a educação que faz evoluir;
é a educação que nos civiliza; é a educação que nos tira da condição de animal
e nos humaniza; é a educação que faz com que pensemos e possamos construir uma
sociedade alicerçada em valores de igualdade, de justiça, de respeito e de luta
pelo bem comum; é a educação que nos confere – e isso, Jair Bolsonaro, eu
aprendi com o meu mestre Paulo freire, que o senhor odeia, lendo, entre outras
de suas obras, Pedagogia da autonomia
e Educação como prática da liberdade –
um entendimento claro de qual é o nosso lugar e papel no mundo e a dimensão e o
valor da nossa liberdade.
Apesar de desacreditar e
manter uma verdadeira ojeriza contra a figura pública do senhor Jair Bolsonaro
e, por conseguinte, também por todos aqueles que ele recruta para participar do
seu desgoverno, por acreditar que gente realmente honesta, virtuosa e escrupulosa
jamais tomaria parte como auxiliar de um governante que, a meu ver, é, em
muitos aspectos, desprezível, eu torço pelo país, até porque uma hora esse
canalha vai sair de cena e, de novo, teremos de apostar numa outra
possibilidade de acerto. Dito isso e considerando que, em um ano e meio, o
Ministério da Educação serviu como palco para apresentações de stand up comedy e de idiossincrasias bastante
ruinosas para o seu bom funcionamento, eu, que não vejo outro meio de sairmos
do buraco no qual estamos a não ser investindo em educação, tolamente me vi
animado e esperançoso quando do anúncio de que um pós-doutor e, ainda por cima
negro, iria assumir o comando da tal pasta ministerial. Não demorou para que a
minha fantasia e o meu princípio de simpatia pela figura aparentemente
bonachona e serena do senhor Carlos Alberto Decotelli, supostamente um orgulho
da raça, um cisne negro a ruflar suas asas sobre o concreto armado de Oscar
Niemeyer no cerrado brasileiro, definhassem a ponto de me entristecer.
Não se pode esperar que um
desgoverno que conta com tantos opositores vá deixar de ser, de uma hora para
outra, esquadrinhado e observado em minúcias, em filigranas, porque, como todos
nós sabemos, esse é o modo de correto de bem combater o inimigo; e não permitir
que ele se arvore de ser o que não é; e nem que ele possa fazer o que bem
entende e quer e, muito menos, passar por cima do que convencionalmente é
considerado legítimo, legal, moral e ético.
Assim que o economista
fluminense Carlos Alberto Decotelli foi nomeado como o novo ministro da Educação
– o terceiro em um ano e meio do desgoverno do senhor Jair Bolsonaro – teve início
uma desconstrução de sua pessoa e de seu muito propagandeado e vistoso
currículo. Verificou-se que o seu trabalho de conclusão de mestrado, defendido
na até então prestigiosa Fundação Getúlio Vargas, foi apontado como contendo
pelo menos 70% de plágio. Ele não tem doutorado na Argentina. E é igualmente
falsa a informação inserida na Plataforma Lattes de que ele cursou um
pós-doutorado num universidade da Alemanha. O desnudamento foi se processando
com tal força e velocidade que eu cheguei a pensar que, dali a pouco, iriam
também divulgar que ele é um homem trans, que o seu RG é igualmente falso e que
ele, ao contrário do palhaço, ator e autor circense negro Benjamin de Oliveira,
que eu conheci ao ler o livro Cultura
popular: temas e questões, de José Ramos Tinhorão, que atuava representando
personagens brancos graças a um processo de maquiagem com base no alvaiade, o
senhor Carlos Alberto Decotelli é, na verdade, um indivíduo branco que se
pintou de preto para pleitear algo disponibilizado pelas políticas de cotas
para a população negra. Foi triste isso. Triste e decepcionante.
É sempre necessário e muito
oportuno falar neste país sobe desigualdade social, negritude e racismo
estrutural; e, ainda mais, num momento em que, nos quatro cantos do mundo,
multidões saíram às ruas para dizer, em tom de protesto, que black lives matter, que vidas negras
importam. Como “justificativas” para a sua desonestidade intelectual, o senhor Carlos
Alberto Decotelli – e não nos esqueçamos de que a ex-presidente Dilma Rousseff
mentiu sobre o seu currículo, assim como também o fizeram o governador Wilson
Witzel e a professora negra Joana D’Arc Félix de Sousa, que, inclusive, iria
ter a sua trajetória transformada em filme – evocou a sua longa carreira
profissional de mais de cinquenta anos, o que, segundo o seu entendimento,
seria mais do que uma comprovação de sua capacidade independentemente dos supostos
títulos acadêmicos que ele vaidosamente dizia possuir; e mais, ao ser
desmascarado ele resolveu, digamos, posar de coitadinho e pôr a questão racial
na pauta, colocando-se como vítima do sistema e do preconceito por ser negro,
tendo ele chegado mesmo a declarar que “Brancos trabalham com imperfeições em
currículo sem incomodar”.
Observaram o tamanho da
tragédia protagonizada pelo senhor Carlos Alberto Decotelli, que calha de ser
negro numa sociedade preconceituosa e brutal para com os seus semelhantes e que
“justificou” seus atos desonestos classificando-os de “imperfeições” e como
sendo da mesmíssima natureza das praticadas por brancos? Perceberam a dimensão
do enquadramento moral e ético no qual ele se colocou ao quase alegar que, se
os outros, os brancos, incorrem em ilicitudes, ele, por assim dizer, também tem
o direito de agir do mesmo modo?
Será que houve algum racismo
nesse, digamos, desmonte curricular do senhor Carlos Alberto Decotelli? No currículo,
não, porque foram examinados documentos e dados que ele próprio produziu;
ninguém inventou as informações para atacá-lo; e, quanto a isso, eu não vejo
como apontar racismo. E quanto ao fato de ele ser um negro que ocuparia um
ministério, será que houve resistência? A esse respeito eu diria também que
não, porque isso não é uma prática da chamada esquerda, considerando que é a
esquerda que mais aponta as inconsistências e barbaridades desse desgoverno que
aí está; e ainda tomando como referência o fato de que o senhor Jair Bolsonaro
escalou para o comando da Fundação Palmares, um irascível Sérgio Camargo, que
ataca duramente Zumbi e rejeita religiões de matriz africana e que, a mim me
parece, sente um severo desconforto por ser negro, e que continua atuante. Concordei
com o ministro que foi sem ter sido quando ele disse que “Brancos trabalham com
imperfeições em currículo sem incomodar”. Mas eu concordei apenas em parte,
porque foi um argumento fraco como justificativa de seu ato torpe. Trata-se de uma
realidade vivenciada por gente de todas as cores: muitas e muitas pessoas neste
país estão por aí ocupando cargos e desempenhando funções portando diplomas e
certificados comprados, porque, da mesma
forma que se compram trabalhos e pesquisas de conclusão de cursos, diplomas e
certificados também podem ser adquiridos sem que o indivíduo sequer alguma vez
assista a uma aula e/ou se apresente nas instituições que supostamente emitem
esses falsos documentos de desempenho acadêmico.
Diferentemente da pandemia
do coronavírus que apareceu nestas plagas há pouco tempo e que segue firme e
forte abatendo milhares de brasileiros, o arrivismo, o mau-caratismo, a
sem-vergonhice e a desonestidade são epidemias que existem de modo permanente
por aqui. Este país é uma farsa. O Brasil é uma grande farsa. Não foi à toa que
lhe pespegaram o epíteto de país do futuro, porque o seu passado é vergonhoso
e o seu presente é normalmente uma desgraça, de maneira que se lança para o
futuro uma possibilidade de redenção; só que um futuro é construído, daí por
que o do Brasil é sempre e sempre adiado.
Para mim, ter o Ministério
da Educação sob o comando de uma pessoa negra, honesta e competente seria de
uma simbologia enorme – recorde-se que antes da nomeação de Carlos Alberto
Decotelli, o que foi ministro sem ter sido, até onde eu sei, em toda a sua
história, esse ministério só teve de fato apenas um negro como titular, que foi
José Henrique Paim, no desgoverno de Dilma Rousseff -, considerando todos os
obstáculos socioeconômicos enfrentados por negros e pardos neste país para
tentarem, como diz o clichê, ganhar a vida. Mas, contudo, entretanto, todavia,
como alguém disse dias atrás, o comportamento antiético do senhor Carlos
Alberto Decotelli pode fazer o incauto pensar que enganar, que trapacear e que
maquiar e/ou falsificar currículo, pode levar alguém a conquistar espaços e a alcançar
o prestígio dos altos cargos públicos e privados. E, cá para nós, participar de
um desgoverno autoritário, hipócrita, estúpido e covarde, como o é esse do
desequilibrado e asinino senhor Jair Bolsonaro, é manchar inteiramente o
currículo.
Num país onde a farsa, a
mentira, a sem-vergonhice e a desonestidade são quase que instituições de
Estado, o senhor Carlos Alberto Decotelli que, eu acredito, desapontou e
envergonhou tão somente as doze dúzias de cidadãos de bem que devem existir por aí, retrocedeu, involuiu e de, admirado cisne negro, voltou à
triste e repudiada condição de patinho feio.
Em todo país em que a educação é a mola e engrenagem de transformação intelectual, econômica e demais avanços, principalmente da ciência de um país. O Brasil segue na contra mão de todos os países do mundo. A indicação de dicotele, a primeira Impressão me encheu de uma certa representatividade, porém a decepção advinda de um desgoverno oportunista fascista seria de longe uma solução para educação. O espírito de porco como expressao usada quando se quer tripudiar, enganar as pessoas mais uma vez tomou espaço e continuamos sem a mola principal da educação, o que nada importa neste desgoverno. A princípio essa prática fascista, nazista de manter o povo na ignorância é uma ideologia usada a primórdios. As amarras das algemas ainda não se quebrou , ainda longe...
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