Por Clênio Sierra de Alcântara
Imagem: Internet
Incapazes de perceber que não constituímos uma sociedade bem educada, honesta e íntegra, continuamos a acreditar que, mesmo assim, bons políticos sairão dela
Começa e termina campanha
eleitoral e, no Brasil, a ladainha é repetida à exaustão: “Político nenhum
presta. É tudo ladrão”, é o que se ouve nas ruas. Numa completa e total falta
de espelho onde possa se enxergar, o eleitor brasileiro aponta o dedo para os
políticos como se eles, os políticos, não fossem a imagem e a semelhança do que
eles, eleitores, são.
Se eu pegar um chuchu e
colocá-lo num liquidificador e acionar o botão para triturá-lo, será que eu
terei um suco de morango? Claro que não. É óbvio que não. Os brasileiros, sem
distinção de classe social ou nível educacional, somos uns pulhas, uns patifes.
Somos uma massa ignara, desonesta e corrupta que quer tirar vantagem em tudo;
que sonega impostos; que pega a senha do conhecido que tem TV por assinatura;
que põe “macaco” no contador de energia; que se inscreve para receber os Bolsa
Família da vida ainda que não precise do auxílio; que é sempre pela lei do
menor esforço; que inventa doença para pegar atestado médico e não ir
trabalhar; que vende sentenças judiciais; que desvia recursos públicos; que
paga propina ao guarda de trânsito; que adultera leite com soda cáustica e
outras substâncias; que batiza gasolina com solvente; que pede a fulano,
beltrano e sicrano para ser laranja e/ou funcionário-fantasma e/ou entrar no
esquema de rachadinhas; e que vende o seu voto.
Pois é esse tipo de gente,
essa gentinha, essa gentalha que estupidamente reclama da má qualidade dos
políticos que estão nos palácios, nas câmaras, assembleias e no Congresso
Nacional, como se eles, os políticos, fossem oriundos de outro lugar, de outro
planeta, quem sabe, e não provenientes da mesmíssima e podre e corrupta e
analfabeta funcional sociedade da qual eles, eleitores, fazem parte. Ora, como
é que nós podemos esperar que os políticos sejam pessoas impolutas e corretas
se eles são também elementos integrantes desta porcaria de sociedade que nós
constituímos, se eles são matéria do mesmíssimo intestino do qual nós saímos? Não
é demasiadamente absurdo cobrar dos outros aquilo que em nossas vivências
cotidianas somos incapazes de praticar?
Ao que parece desde sempre
vigorou neste país uma falsa ideia de que só e somente só aos políticos e aos
governantes, de modo geral, cabe a responsabilidade por uma aparentemente
desejada transformação da sociedade e de suas instituições. Por sermos de baixo
nível intelectual e/ou educacional, estamos sempre a esperar que outros,
supostamente capazes, deem um jeito em tudo que existe de errado por aí. Nós sempre
estamos dispostos a responsabilizar alguém por tal ou para tal coisa, porque
fundamentalmente não queremos pôr a mão na massa, não queremos ser responsáveis
por nada; nós queremos sempre o bônus, como se não existissem ônus.
A lógica existencial que
nós, brasileiros, mantemos como seres sociais ficou como que atrelada de modo
permanente à casa-grande, esperando as determinações que dela advém. Acontece que
os negros eram e/ou estavam escravos não porque eles queriam e/ou desejassem
sê-lo. Os negros eram escravizados a ferro e fogo, ao passo que nós somos
escravizados pela ignorância e pela estupidez por vontade própria. Não atribuir
a si próprio qualquer responsabilidade pelo que acontece no seio da sociedade
é, no meu simples entendimento, negar que se faça parte dela e, ao mesmo tempo,
atribuir a si uma conduta impecável que, em realidade, pouco ou nada tem de
impecável.
As eleições presidenciais de
2018 foram um retrato fidelíssimo da nossa insignificância moral e ética e da
nossa estrambótica escala de valores. Era preciso, de todas as formas, impedir
que os filiados ao Partido dos Trabalhadores (PT) voltassem a comandar este
país, porque, como vinha há anos mostrando a imprensa, eles e os seus comparsas
cometeram muitos crimes. Muito acertado, superjusto e corretíssimo não eleger
novamente pessoas que assumem cargos eletivos para promover toda a sorte de
roubalheira e/ou malversação dos recursos públicos, algo que, convenhamos, não
foi inaugurado pelos petistas, esses supostos inimigos das desigualdades
sociais que se deslumbraram com o poder e muito fizeram para encher suas
burras.
Mas quem é que foi que a
maioria dos eleitores elegeu? O eleito foi um sujeito que foi expulso do
Exército por indisciplina; que, como deputado federal, personificou a nulidade
em vários mandatos; que trocou de partido como quem troca de roupa; que fez
inúmeras declarações homofóbicas e misóginas; e que, quando se empoleirou no Palácio
do Planalto, pôs-se a desferir ameaças ao Estado democrático de direito,
querendo fazer crer que ele é o próprio Estado e pode mandar e desmandar em
tudo. E, como se não bastasse, fez o diabo contra determinações sanitárias visando
o combate a uma pandemia que até o dia de hoje ceifou a vida de 150.000
indivíduos neste país; alinhou-se com as células cancerosas do Congresso
Nacional, o conhecido Centrão; e, para agradar os corruptos de sempre, que
temem as garras da Justiça, disse nesta semana que o país não precisa mais da
Operação Lava-jato, porque, segundo ele, a corrupção acabou. Ele só não disse
por que Fabrício Queiroz depositou R$ 89.000,00 na conta da primeira dama e que
vem amansando porque tem medo que os filhos sejam presos.
Aí eu pergunto: pode ser
considerado um bom político quem simplesmente diz que é honesto e que não rouba
recursos públicos? E o comportamento público? E os outros valores morais e
éticos não importam? Com a palavra os ditos conservadores, militares, policiais
e evangélicos, gente do calibre de Edir Macedo, Flordelis, Silas Malafaia e Pastor
Everaldo, que majoritariamente votaram nessa coisa que anda e fala e que, por
ora, está ocupando o Palácio do Planalto.
Não tem jeito. A sentença é muito, muito simples: uma sociedade mal-educada, podre e corrompida sempre há de gerar maus políticos.
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