31 de dezembro de 2021

Não estou fechado para balanço

 Por Sierra



Foto: Rebeca Campos
  Não estou fechado para balanço. Eu estou aberto, eu estou aberto, mas não é qualquer um nem qualquer coisa que pode entrar na minha vida


 

Hoje, 31 de dezembro de 2021. Fim de mais um ano de pandemia e a minha vida resiste. Contra todos os males, contra todas as angústias, contra todas as frustrações, contra todos os pesadelos, contra todos os dissabores, contra todas as pessoas sacanas e ruins, eu novamente sobrevivi.

Não estou fechado para balanço. Não vou, portanto, contar o que sobrou, enumerar os acertos e nem computar os erros. Não vou citar aqui nomes de quem me fez bem e nem de quem me fez mal. Não vou dizer o que planejei, o que não levei adiante e nem o que enterrei para todo o sempre. Não vou sopesar a solidão porque ela continua sendo benéfica e necessária para mim, e, quando deixar de ser isso, eu mandarei ela ir embora. Não vou anunciar por onde irei andar, o que farei ao chegar lá e nem o que direi quando o encontro, enfim, se der. Não vou explicar, eu não preciso explicar, por que foi que eu paulatinamente fui me afastando e deixando uns e outros para trás. Não vou deixar saírem de mim os anseios, os desejos, os ideais de liberdade e nem o meu plano de paz. Não vou compactuar com malfeitores. Não vou abrir mão da tentativa constante de me livrar dos meus demônios, das minhas mesquinharias e de certas abominações que eu ainda pratico enquanto atiro pedras na vidraça alheia. Não vou reunir os destroços para armazená-los num depósito. Não vou reatar alianças que se revelaram desleais e contraproducentes. Não vou tomar lugar na mesma barca furada. Não vou dar ouvido a derrotistas. Não vou reescrever a narrativa que não mais me interessa e nem vou dourar a pílula de nada que eu vivi. Não vou remendar o que se quebrou. Não vou beijar de novo aquela boca amarga. Não vou me reconciliar com quem aprontou comigo. Não vou pedir que reconsiderem o mal que eu fiz. Não vou partir para a autoflagelação. Não vou construir uma cápsula do tempo para guardar miudezas sem préstimo. Não vou exigir simpatia de quem quer que seja. Não vou abraçar mais os que eu passei a desprezar. Não vou mais responder as mensagens de quem saiu da órbita do meu sistema solar. Não vou perder tempo com conversas fiadas e desagradáveis. Não vou mais me sujeitar à mediocridade e à estupidez.

Não estou fechado para balanço. Viver para mim não é um fardo. Eu não vivo por obrigação. E continuo confiante e apostando numa ideia possível de futuro e não numa fantasia e/ou ilusão pretensamente redentora que pode desmoronar ao menor sopro do vento. Não estou fechado para balanço. Eu estou aberto, eu estou aberto, mas não é qualquer um nem qualquer coisa que pode entrar na minha vida.

Nenhum comentário:

Postar um comentário