Por Sierra
Nesta semana, no intervalo
de poucas horas, mais uma vez o cinismo e a desfaçatez de quem, muito cheio de
si, se julga acima da lei e dos mais simples códigos de convívio social, saiu
por aí evocando e celebrando a ideologia supremacista nazista, aquela mesma
que, partindo da Alemanha, lançou em fornos milhões de pessoas e cometeu outras
atrocidades contra judeus, ciganos, portadores de deficiência física, homossexuais
e outros “tipos de gente” que não se enquadravam e que não tinham vez e nem
lugar numa ideia de sociedade onde só deveria existir um certo “tipo de gente”.
Por que nós continuamos
assistindo a episódios como os que foram praticados por Bruno Aiub e Adrilles Jorge? Acusar pessoas que atuam fazendo apologia a
monstruosidades como o nazismo de desconhecimento da História é, no mínimo,
agir de modo ingênuo e diminuir a gravidade do delito. Não podemos de maneira
alguma ser condescendentes com esse tipo de coisa e muito menos fazer de conta
que isso não é grave e nem vai dar em nada.
O script é tão previsível que chega a ser tedioso se não fosse
irresponsável e criminoso. O sujeito faz e acontece na internet com vistas a
ganhar audiência e patrocinadores, ataca quem bem quer, demole a base do bom
senso, passa por cima da ética e da moralidade, promove discursos de ódio
contra minorias, aplaude ideologias desumanas e, depois, quando o negócio fica
feio para o lado dele, põe-se com a maior cara de pau a pedir desculpas e/ou a
negar que fez o que fez, que não fora a sua intenção, que a repercussão negativa
foi desproporcional ao ato praticado, que ele está sendo perseguido, que tem
muito mimimi por aí e até, que disse o que disse, porque estava bêbado, como
anunciou o Bruno Aiub.
Como eu vinha dizendo não é
que falte a essas pessoas que fazem apologia a barbaridades desumanas como o
nazismo conhecimento da matéria. Não, é justamente o contrário. Esses indivíduos
sabem muitíssimo bem do que estão falando; e é por saberem que eles tratam de
pôr o dedo nas feridas com o único propósito de, como se diz por aí, causar e
ganhar audiência, porque, sob essa lógica de mercado, amplamente difundida na
internet, os fins sempre e sempre vão justificar os meios; e danem-se a
comunidade judaica, danem-se os negros, danem-se os homossexuais, danem-se os
portadores de deficiências físicas, danem-se, enfim, os que eles consideram
como lixo social.
Por mais repugnantes,
absurdas e execráveis que sejam as recentes demonstrações de uma, digamos,
simpatia pelos ideais do hitlerismo, convenhamos que elas são perfeitamente
condizentes com o cenário de terror que vivenciamos tendo na Presidência da
República um indivíduo que é armamentista, misógino, homofóbico, insensível ao
sofrimento alheio e glorificador de torturadores. Não nos esqueçamos de que
figuras do desgoverno do senhor Jair Bolsonaro, como o ex-secretário da
Cultura, Roberto Alvim, protagonizaram episódios de apologia ao ideário
nazista.
O frequente e obstinado
exercício de negação do Holocausto que se verifica no Brasil em várias partes
do mundo sinaliza que a nossa vigilância e o nosso repúdio a esse estado de
coisas também precisam ser frequentes e obstinados, do contrário, correremos um
grande, um enorme risco de vermos sendo repetidas por aqui as mesmas
atrocidades que os nazistas seguidores de Adolf Hitler infligiram a milhões de
indivíduos nos campos de concentração erguidos na Europa. Não creio que a
História só se repete como farsa; ela também se repete como uma espécie de
dínamo, quase irrefreável, da brutalidade e da animalidade que em alguma medida
em nós habitam.
Essa verdadeira “banalização
do mal” – para usar uma expressão tão cara à filósofa alemã Hannah Arendt – não
deve nunca, não deve jamais ser tomada como normalidade. Certa feita o filólogo
italiano Umberto Eco afirmou que as redes sociais deram o direito à palavra a uma
“legião de imbecis” que antes falavam apenas “em um bar e depois de uma taça de
vinho, sem prejudicar a coletividade”. Eu vou além do que disse o autor de O nome da rosa; eu vejo que as redes
sociais e a internet em si, como amplos campos democráticos que são, deram
espaço também a uma grande legião do mal, a pessoas que fazem uso dessas ferramentas para
disseminar discursos de ódio, preconceito e perseguição a minorias e para
divulgar notícias falsas. As redes sociais e a internet em si, em grande parte,
foram transformadas em um imenso parlatório para indivíduos que pregam ideias e
ideais retrógrados e desumanos.
Repudiar veementemente e
lançar luz sobre condutas de indivíduos que insistem em evocar o obscurantismo
e as trevas pode até não nos livrar completamente dos males que eles propagam,
mas, certamente, pode nos ajudar a nos preparar para enfrentá-los. Essas animalidades,
essas bestialidades que se arvoram de ser seres humanos superiores aos demais
seres humanos jamais vão agir almejando o bem comum. Há pessoas que não
conseguem ser efetivamente úteis à sociedade, que não têm uma experiência de
vida que pode ser benéfica para o todo social, que desprezam o conceito de
responsabilidade social, que menosprezam o sofrimento alheio e a memória da dor
do outro e que, ainda assim, seguem pensando que só as suas vidas realmente
importam. Não permitamos que tais indivíduos ajam impunemente. Não sejamos
condescendentes e nem coniventes com a propagação dos males que eles difundem.
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