Especialmente para Luciana Campos
Foto: Internet Às vezes uma simples ajuda, por menor que seja, pode transformar completamente para melhor a vida de uma pessoa |
Há uma guerra acontecendo lá
fora. Na verdade, há várias guerras acontecendo lá fora: na Ucrânia, no Iêmen,
na Somália, na Síria... Há guerras acontecendo e se desenrolando em várias
partes do mundo; Petrópolis está ainda a contar seus mortos e a procurar pelos
seus desaparecidos; e hoje eu resolvi falar de generosidade.
As imagens das guerras me
entristecem. O desamparo social me entristece. A vida sem rumo me entristece. A
crueldade me entristece. A fome alheia me entristece. A burrice me entristece. O
não querer enxergar a realidade me entristece. A recusa da oferta de ajuda me
entristece. O poder ajudar e não fazê-lo me entristece. O silenciar quando se
deveria era falar me entristece.
Entre os vários defeitos que
em mim habitam está o de, como se costuma dizer, se intrometer na vida dos
outros. Não estou falando aqui de bisbilhotar a vida alheia e de fofocar sobre
fulano, beltrano e sicrano, que isso todo mundo faz. Não, a coisa aqui se dá em
outra ordem. Quero dizer do intrometimento de quem se dispõe a – e eu costumo
fazer isso não só com gente por quem eu sinto alguma estima, mas também com
quem eu compartilho vivências ou com quem eu acabei de conhecer e que não é necessariamente
alguém por quem eu nutra algum sentimento de cuidado -, digamos, abrir os olhos
e mostrar uma direção; de dizer que do jeito que a coisa vai, a pessoa irá
quebrar a cara e ficar na pior. Por experiência própria, eu sei que nem todo
mundo quer ter por perto uma pessoa assim como eu sou; e a recusa costuma vir
acompanhada por enfáticos “Não se meta na minha via”, “Eu sei o que estou
fazendo” e “Cuide da sua vida que eu cuido da minha”. Ah, ainda tem o “Quem
sabe da minha vida e do que é bom ou ruim pra mim sou eu”. E ponto. Já ouvi
várias pessoas dizerem que não vale a pena insistir na questão; e que, em se
tratando de gente assim, o que se tem a fazer é deixar tais indivíduos
afundando na lama e/ou caminhando em direção ao precipício, porque tem gente
que precisa quebrar a cara para aprender a lição – e tem os que nem mesmo assim
a aprendem.
Quem já recebeu uma ajuda,
um apoio, um auxílio – financeiro, material ou de outra natureza, como um
abrigo, por exemplo; como um tempo para ouvir um desabafo; etc. – sabe muito bem do que eu estou falando. Assim como a
gentileza, a generosidade também não se paga. E, geralmente, as pessoas que
costumam ser generosas e/ou que praticam atos de generosidade, são pessoas que
em algum momento de suas vidas foram elas mesmas apoiadas, auxiliadas e
ajudadas. E o replicar o ato de generosidade diz muito da nossa disposição para
de alguma forma retribuir o bem que recebemos.
Muitas vezes, porque levamos
rasteiras de quem nos prontificamos a ajudar, pensamos em não mais estender a
mão a quem quer que seja. Mas isso logo passa; esse sentimento ruim não fica
impregnado em nós, porque a força da lembrança da ocasião em que nós fomos
ajudados é muito poderosa e revitalizadora; e é essa força que faz com
continuemos a praticar atos de generosidade.
Não é todo dia – e eu aqui
estou falando por mim – que estamos dispostos e/ou com condições de ofertar o
auxílio de que fulano, beltrano ou sicrano estejam precisando num dado momento.
O ditado que diz “Não se deve descobrir um santo para cobrir outro” é uma
espécie de mantra para mim. Eu sou uma pessoa que costuma agir com bastante
pragmatismo nesse aspecto. Não tenho disposição para me prejudicar em
decorrência de um auxílio que eu possa vir a dar. Não tenho mesmo. Eu auxilio,
eu dou ajuda e eu apoio quando isso está ao meu alcance; o “dar-se um jeito”
não está registrado em minha cartilha; eu calculo até aonde eu posso ir.
Quando eu ajo com
generosidade, eu não pratico o ato esperando que a pessoa me retribua. De maneira
alguma. Esperar retribuição, neste caso, anula o que seria generosidade, porque a generosidade é desinteressada. O que eu na verdade e sinceramente espero da pessoa é que ela, uma vez
que tenha superado o obstáculo e a dificuldade que enfrentava, consiga ser
generosa, que ela consiga praticar pelo menos um ato de generosidade em sua vida,
olhando para trás e recordando que alguém um dia já praticou a generosidade em
benefício dela. Às vezes uma simples ajuda, por menor que seja, pode transformar
completamente para melhor a vida de uma pessoa.
Outro dos meus defeitos é me
aborrecer e lamentar quando alguém se nega a aceitar a minha “intromissão”, quando
alguém abusa da minha bondade e/ou faz pouco caso da minha disposição para
ajudá-lo. Cada um é o que é; isso é um fato. E cada um só dá o que tem. Os reveses
dessa natureza têm me feito ver que a recusa de uns e outros e as rasteiras que
uns e outros me deram não tiraram de mim – e nem hão de tirar – a compreensão
de que a prática da generosidade, seja ela em que escala ou medida for, é um
exercício do meu bem viver do qual eu não abro mão.
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