Por Sierra
No começo desta semana eu experimentei uma sensação muito, muito incômoda e ruim. Uma pessoa do meu convívio no trabalho veio me abraçar porque sabe que eu vim ao mundo para abraçar, porque abraço me faz bem; e eu a abracei como costumo abraçar a quem eu quero abraçar: um abraço como quem abriga, um abraço como quem conforta, um abraço como quem reciprocamente troca boas energias. Eu abracei a pessoa e recordei, enquanto a abraçava, que, dias antes, eu tinha agido de modo desleal com ela.
Nós só deveríamos ser
desleais com quem não presta – na verdade, de quem não presta, nós devemos manter
a maior distância que for possível. Agir com deslealdade e ainda por cima com
quem demonstra simpatia e estima para conosco é de alguma maneira ser perverso;
é ser duas caras; é dar demonstração de pequenez; é dar facada pelas costas.
Quando eu disse que abracei a
pessoa como sempre eu abraço, não menti e nem dourei a pílula. O que ocorreu
foi que eu não me senti bem em ter recordado o meu malfeito no instante do
abraço. Mas eu o abracei com força e com vontade como se eu quisesse redimir e
pagar pelo meu ato de deslealdade. Ele não merecia isso. Eu pisei na bola, sei
muito bem.
Há quem tome a deslealdade
colocando-a sempre em grande dimensão, em grandes malfeitos e em ações que
provocaram enormes estragos na vida de outrem. Pois eu compreendo que a
deslealdade pode ser vista e praticada em, digamos, pequenos atos aparentemente
inofensivos; em falas indiscretas; em comentários que expõem fragilidades e que
fazem circular coisas e assuntos que a pessoa prefere deixar de lado e não
tocar; coisas e assuntos que não são necessariamente segredos ou algo do tipo,
mas são coisas e assuntos que a própria pessoa quer esquecer e/ou pôr uma pedra
em cima; e, se ela assim o quer, por que que eu, que a tenho em conta e que
vejo que ela é alguém que me preza, devo expô-la por aí, falando isso e aquilo
de sua vida?
Não sou santo. Mas o
exercício da franqueza é atividade que eu gosto de praticar. Não tem por que
razão ser diferente disso. Hoje, na minha mesa de trabalho, pensando num
assunto para preencher uma folha em branco, eu refleti que seria de alguma
valia expor este sentimento que me marcou na segunda-feira. Se nós não
conseguimos enxergar a nós mesmos uma coisa é certa: estamos desviando a vista
para outro ponto e não para o que se passa ou anda passando dentro de nós.
Alguém, na verdade, várias
pessoas já me disseram para ser comedido e não falar do que eu sou, penso e
sinto para uns e outros, porque nunca se sabe o que uns e outros são capazes de
fazer com tais informações contra nós. Talvez por isso ou por simples mudança
de rota, eu resolvi que não irei mais compartilhar certos aspectos e
acontecimentos da minha vida exterior e interior com quem quer que seja; e não
porque eu tema que tudo o que eu disser e/ou expor a meu estrito respeito possa
ser usado contra a minha pessoa. Não foi por isso. Eu tomei a decisão porque eu
comecei a perceber ultimamente – e, confesso e admito, que eu demorei a
perceber isso – que certas coisas que eu dizia de mim acabavam por travar o meu
interlocutor; a pessoa passava a agir de modo meio encenado, sabe? como se
temesse e/ou rejeitasse o que eu sou,
penso e sinto; e, em vez de procurar se afastar de mim, agia sem naturalidade. Não
ficou claro? Deixa para lá. Não vou tentar mais me explicar neste momento. É cansativo.
É chato. E eu sei que os pormenores por mais esmiuçados que sejam ou possam ficar,
ainda assim correm o risco de não ser compreendidos.
O que importa é que aqui
dentro de mim, aqui dentro da minha cabeça, a coisa se processou de modo
absolutamente claro; e eu compreendi que fui sacana e desleal para com o
indivíduo que na segunda-feira eu abracei com toda a ternura de que dispunha
naquele instante. Ontem, ao abraçá-lo novamente, eu já me senti como que renovado,
porque o episódio de me dera uma lição poderosa sobre o sentido da lealdade.
Como a prática do exercício da franqueza por vezes pode ser extremamente daninha tanto para quem fala como para quem ouve, de uns tempos para cá eu comecei a me calar diante de certas situações e circunstâncias para evitar aborrecimentos a mim e constrangimentos a outrem. Sim, eu quero continuar sendo fiel e leal aos meus princípios e a tudo em que eu acredito, porque não pode ser de outra forma. Eu também quero e devo continuar sendo fiel e leal a quem me estima e me quer bem, porque, igualmente, não pode ser de outra forma.
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