18 de março de 2023

Diante da folha em branco

 Por Sierra


Imagem: Internet
Diante do “vazio mental”, por assim dizer, eis que, na “falta do que fazer”, eu resolvi divagar e tecer considerações sobre o desafio de preencher a folha em branco em dias, como o de hoje, que parecem subtrair de mim tudo ou muito do meu processo criador e da minha ânsia de dizer de mim e/ou do que eu vi, li, ouvi, imaginei e senti.


Tem dias que eu sento diante de uma folha em branco e sem demora começo a preenchê-la porque, às vezes, as ideias já estão como que arrumadas na cabeça, os pensamentos já estão alinhados querendo apenas sair dali e virar escrita. Mas tem dias que parece que a cabeça está oca e que nada se revela interessante ou motivador para eu começar a escrever.

Hoje eu amanheci assim, me perguntando sobre o que eu deveria escrever para a postagem da semana. E nada de o assunto chegar. E nada de eu conseguir acionar meus mecanismos de criação para fazer a pena correr e o texto ir aparecendo como um desenho mágico, como uma ventania que vem trazendo folhas e as espalha num terreiro.

Estou com vários textos esperando serem revistos e burilados para poderem ser adicionados aqui no blog. Ocorre que eles vão demandar leituras complementares e escolha de fotografias e o meu tempo de hoje é curto, porque eu ainda estou às voltas com os ajustes no prefácio para o livro do antropólogo Cristiano Galvão. O meu tempo é curto para complementar aqueles textos e a hora urge.

Diante do “vazio mental”, por assim dizer, eis que, na “falta do que fazer”, eu resolvi divagar e tecer considerações sobre o desafio de preencher a folha em branco em dias, como o de hoje, que parecem subtrair de mim tudo ou muito do meu processo criador e da minha ânsia de dizer de mim e/ou do que eu vi, li, ouvi, imaginei e senti.

Nessa circunstância, agora mesmo me chegou à lembrança o que eu li em algumas crônicas do Antônio Maria; crônicas nas quais ele relatou esse exercício de uma escrita urgente porque comprometida, no caso dele, com veículos de imprensa que eram o seu ganha-pão. No meu caso – pelo menos até agora – a escrita neste espaço se dá como um compromisso intelectual que eu assumi comigo mesmo. E só eu sei o quanto que esse compromisso é forte em mim. E não somente para com a manutenção deste blog ativo, como também para com a aquisição periódica de livros e de outros alimentos para o espírito com o propósito de manter a imaginação, o desejo de saber e a força criadora sempre preparados para enfrentar o desafiador exercício de preenchimento da página em branco.

Talvez hoje fosse um dia que eu deveria ter destinado apenas para leituras. Ou para ouvir músicas como as do cd The element of freedom, da Alicia Keys, que eu pus ontem à noite no toca-discos para encher a minha casa com outras atmosfera enquanto eu ia labutando para deixar tudo limpo e arrumado, mergulhado numa solidão benfazeja. Talvez hoje fosse um dia em que eu deveria era sair com um livro debaixo do braço para ir lê-lo lá na beira da praia, algo que provoca em mim um desses prazeres indescritíveis. Ou eu deveria sentar e procurar versos para completar umas canções que estão à espera de seu término e de minha voz.

Daqui da minha janela eu posso ver, neste exato momento em que estou escrevendo, um céu nublado, um céu carregado anunciador de chuva. E isso me fez pensar que não são propriamente palavras e imaginação que estão me faltando agora, e, sim, a escolha do que é necessário que eu diga no dia de hoje.

Vem vindo lá de fora um barulho incômodo provocado por homens que estão trabalhando na reforma de uma casa de veraneio. Nem sempre eu consigo abstrair e nem me alhear dessas coisas. E isso por vezes rouba de mim a substância do silêncio profundo que eu prefiro ter ao meu redor quando a faina consiste em ler e/ou escrever.

Hoje eu acordei sentindo vontade de me fartar de vida até dizer basta. Eu, que costumo encarar de modo muito prático os afazeres do dia a dia a fim de dar logo conta dele, às vezes me vejo como que enfadado e sem disposição para enfrentá-los, como se a minha ideia e plano de existência pudesse se dar e se realizar completamente libertos deles.

Eu vou sair daqui a pouco, quer chova, quer não. Eu vou até o outro lado desta ilha onde moro exercitar o corpo. Talvez hoje fosse um dia que eu deveria ter dedicado tão somente só aos exercícios físicos a fim de enrijecer músculos e fortalecer ossos. Mas eu sei que isso por si só não me basta e nem faz do meu dia um dia de completude, porque, assim como o mar me chama, assim como as máquinas da academia de musculação me chamam, assim como o trabalho me chama e assim como as prateleiras do supermercado me chamam, os livros e as páginas em branco também me chamam.

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