Por Sierra
Tem dias que eu sento diante
de uma folha em branco e sem demora começo a preenchê-la porque, às vezes, as ideias
já estão como que arrumadas na cabeça, os pensamentos já estão alinhados
querendo apenas sair dali e virar escrita. Mas tem dias que parece que a cabeça
está oca e que nada se revela interessante ou motivador para eu começar a
escrever.
Hoje eu amanheci assim, me
perguntando sobre o que eu deveria escrever para a postagem da semana. E nada
de o assunto chegar. E nada de eu conseguir acionar meus mecanismos de criação
para fazer a pena correr e o texto ir aparecendo como um desenho mágico, como
uma ventania que vem trazendo folhas e as espalha num terreiro.
Estou com vários textos
esperando serem revistos e burilados para poderem ser adicionados aqui no blog.
Ocorre que eles vão demandar leituras complementares e escolha de fotografias e
o meu tempo de hoje é curto, porque eu ainda estou às voltas com os ajustes no
prefácio para o livro do antropólogo Cristiano Galvão. O meu tempo é curto para
complementar aqueles textos e a hora urge.
Diante do “vazio mental”,
por assim dizer, eis que, na “falta do que fazer”, eu resolvi divagar e tecer
considerações sobre o desafio de preencher a folha em branco em dias, como o de
hoje, que parecem subtrair de mim tudo ou muito do meu processo criador e da
minha ânsia de dizer de mim e/ou do que eu vi, li, ouvi, imaginei e senti.
Nessa circunstância, agora
mesmo me chegou à lembrança o que eu li em algumas crônicas do Antônio Maria;
crônicas nas quais ele relatou esse exercício de uma escrita urgente porque
comprometida, no caso dele, com veículos de imprensa que eram o seu ganha-pão. No
meu caso – pelo menos até agora – a escrita neste espaço se dá como um compromisso
intelectual que eu assumi comigo mesmo. E só eu sei o quanto que esse
compromisso é forte em mim. E não somente para com a manutenção deste blog
ativo, como também para com a aquisição periódica de livros e de outros
alimentos para o espírito com o propósito de manter a imaginação, o desejo de
saber e a força criadora sempre preparados para enfrentar o desafiador
exercício de preenchimento da página em branco.
Talvez hoje fosse um dia que
eu deveria ter destinado apenas para leituras. Ou para ouvir músicas como as do
cd The element of freedom, da Alicia Keys,
que eu pus ontem à noite no toca-discos para encher a minha casa com outras
atmosfera enquanto eu ia labutando para deixar tudo limpo e arrumado,
mergulhado numa solidão benfazeja. Talvez hoje fosse um dia em que eu deveria
era sair com um livro debaixo do braço para ir lê-lo lá na beira da praia, algo
que provoca em mim um desses prazeres indescritíveis. Ou eu deveria sentar e
procurar versos para completar umas canções que estão à espera de seu término e
de minha voz.
Daqui da minha janela eu
posso ver, neste exato momento em que estou escrevendo, um céu nublado, um céu
carregado anunciador de chuva. E isso me fez pensar que não são propriamente
palavras e imaginação que estão me faltando agora, e, sim, a escolha do que é
necessário que eu diga no dia de hoje.
Vem vindo lá de fora um
barulho incômodo provocado por homens que estão trabalhando na reforma de uma
casa de veraneio. Nem sempre eu consigo abstrair e nem me alhear dessas coisas.
E isso por vezes rouba de mim a substância do silêncio profundo que eu prefiro
ter ao meu redor quando a faina consiste em ler e/ou escrever.
Hoje eu acordei sentindo
vontade de me fartar de vida até dizer basta. Eu, que costumo encarar de modo
muito prático os afazeres do dia a dia a fim de dar logo conta dele, às vezes
me vejo como que enfadado e sem disposição para enfrentá-los, como se a minha ideia
e plano de existência pudesse se dar e se realizar completamente libertos
deles.
Eu vou sair daqui a pouco,
quer chova, quer não. Eu vou até o outro lado desta ilha onde moro exercitar o
corpo. Talvez hoje fosse um dia que eu deveria ter dedicado tão somente só aos
exercícios físicos a fim de enrijecer músculos e fortalecer ossos. Mas eu sei
que isso por si só não me basta e nem faz do meu dia um dia de completude,
porque, assim como o mar me chama, assim como as máquinas da academia de
musculação me chamam, assim como o trabalho me chama e assim como as
prateleiras do supermercado me chamam, os livros e as páginas em branco também
me chamam.
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