22 de abril de 2023

Redes sociais e propagação do medo

Por Sierra


Imagem: Internet
Tidas como terra de ninguém, as chamadas redes sociais vêm a cada dia deixando evidente que um processo de regulação é uma tentativa de tentar pôr freio na onda de crimes que são praticados e propagados por elas



Não é de hoje que as chamadas redes sociais se encontram no centro de debates acerca de mentiras, notícias falsas e disseminação de discursos de ódio e de preconceitos. Tal questão, apesar de sua gravidade, de algum modo vinha e vem sendo tratada e conduzida como algo a ser resolvido, algo que se posterga e se vai empurrando com a barriga sem que, de fato,  se resolva absolutamente nada.

Tratados, no mais das vezes, como algo que dizem respeito fundamentalmente a adultos, os ditos males propagados pelas redes sociais, a bem da verdade, atingem a todos aqueles que fazem uso delas e que interagem com suas ferramentas, ou seja, praticamente toda e qualquer pessoa e de qualquer idade que tenha acesso a um smartphone interligado à internet e que saiba usá-lo. E essa toda e qualquer pessoa inclui, evidentemente, crianças e adolescentes.

Aqui e ali aparecem no noticiário casos envolvendo crianças e adolescentes que foram vítimas de aliciamento de criminosos - principalmente de pedófilos - e de pessoas que lhes propõem participar de "desafios", que consistem em fazer determinadas coisas e até cometer suicídio. Tais casos evidenciam o quanto o público, em geral, e as crianças e os adolescentes, em particular, estão vulneráveis a toda sorte de vilezas e de crimes que são disseminados por meio das redes sociais, algo que é muito preocupante, principalmente quando se avalia que a posse de um smartphone não é um indicativo de poder econômico, porque ele está presente em praticamente todos os segmentos e classes sociais; e quando se compreende que crianças e adolescentes são pessoas em formação.

Anteontem, em âmbito nacional, as redes sociais mais uma vez deram o tom e a dimensão do peso que elas passaram a ter em nossa vida cotidiana negativamente falando:  por conta de boatos, através delas espalhados, de que ocorreriam ataques a estudantes em escolas, creches e universidades, vários alunos deixaram de ir assistir às aulas, porque, dado o caso assustador e covarde ocorrido numa creche em Blumenau (SC), onde um sujeito invadiu uma creche e matou quatro crianças a golpes de machadinha, o medo tomou conta não apenas de crianças e adolescentes, mas também dos seus pais, que, receosos de que os boatos não fossem só boatos e sim ameaças reais, preferiram deixar os filhos em casa e não mandá-los para as escolas, creches e universidades.

Um amigo, que trabalha numa escola que atende o público infantil em Abreu e Lima (PE), me contou que muitos alunos faltaram na quinta-feira; outro, cujos filhos estudam numa escola em Paulista, cidade vizinha de Abreu e Lima, me disse que de 250 alunos, apenas 80 compareceram naquele dia. Isso significa que os propagadores das ameaças via redes sociais conseguiram o que queriam, que era criar  um clima de pânico e deixar parte das pessoas apavoradas e temerosas. E isso significa também dizer, a meu ver, que já passou da hora de a sociedade e o Estado se mobilizarem no sentido de regular as plataformas das redes sociais objetivando com isso que elas ponham em ação dispositivos e ferramentas que possam de alguma forma barrar a propagação de discursos de ódio e de promoção e incentivo de práticas criminosas, como as de ataques que, segundo os boatos, ocorreriam na última quinta-feira.

Note-se que não são poucos os que se opõem à regulação das plataformas das redes sociais porque, segundo esse coro oposicionista, isso significa um ataque à liberdade de expressão. Ora essa, então quer dizer que liberdade de expressão significa que podemos dizer e propagarmos o que bem entendermos? Por acaso liberdade de expressão confere salvo-conduto e isenção a quem quer que seja para a disseminação e/ou incentivo de práticas criminosas?

É claro que não são apenas as redes sociais que devem ser tomadas como espaços onde ocorre um verdadeiro "liberou geral"; a própria internet - e os milhões e milhões de sites que ela abriga - é um campo, um vastíssimo campo com certos trechos minados. Existe, inclusive, uma chamada deep web que é uma versão da internet que abriga o que de pior uma mente maligna pode conceber para difundir atos criminosos através da rede mundial de computadores. Ocorre que as rede sociais têm se revelado ambientes mais propícios para a ação de delinquentes de todo tipo. E enfrentar isso é um desafio urgente deste nosso tempo.

Não tratemos de encarar os males provocados pelas redes sociais como ocorrências que por si mesmas se consumirão e deixarão de existir qualquer dia desses. Não, o problema é grave, como deixaram ver as operações de Polícias Civis e Militares que agiram para aprender adultos e apreender adolescentes, em vários estados do país, responsáveis por perfis em redes sociais que estavam propagando e/ou incentivando a prática de ações criminosas contra escolas, creches e universidades. É fato que mentes perversas conseguem manipular o pensamento de indivíduos desajustados que só estão à espera de um incentivo para sair por aí tocando o terror.

Não tratemos as redes sociais apenas pelo que elas têm de bom, porque, se agirmos assim, baixaremos a guarda e daremos espaço para que criminosos não somente difundam ataques verbais a minorias como arquitetem e consigam pôr em prática massacres como o que ocorreu em Santa Catarina. Toda a vigilância deve ser necessária para barrarmos a escalada de violência motivada pelas redes sociais. A bem da verdade, ou a sociedade e o Estado tratam de se empenhar para que ocorra a regulação das redes sociais para que elas percam o status de terra de ninguém ou teremos de amargar um futuro imediato em que elas serão tão nocivas para todos nós quanto as drogas ilícitas que alimentam o mundo do crime  e destroem famílias inteiras.

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