Por Clênio Sierra de Alcântara
Faz de conta que é Carnaval
e que você está subindo e descendo as ladeiras de Olinda e de Ouro Preto;
seguindo um trio elétrico em Salvador; acabando-se nas ruas do centro do Recife
acompanhando o Galo da Madrugada; torcendo pela Vai-Vai ou pela Gaviões da Fiel
em São Paulo; e vibrando com a Beija-flor, a Portela e a Mangueira no Rio de
Janeiro.
Faz de conta que é Carnaval
e que você se arrumou e se enfeitou todo e está curtindo o Baile Municipal de
sua cidade; aplaudindo a apresentação dos caboclos de lança e do maracatu rural
em Nazaré da Mata; pulando frevo em Neópolis, à beira do Rio São Francisco;
zunindo com as Muriçocas do Miramar em João Pessoa; imitando os papangus de
Bezerros e os caretas de Triunfo; correndo pelas ruas de São Luís com os trajes
de Fofão; e arrasando e lacrando tudo no desfile das Catraias na Ilha de
Itamaracá.
Faz de conta que é Carnaval
e que você vestiu uma linda fantasia ou o vestido de sua esposa ou a cueca do
seu marido e foi para a rua da sua casa, na maior greia, brincar até não
aguentar mais; que você está beijando muuuuuuuuito um boy magia que encontrou
por aí perdido no meio da multidão ou aquela bad girl com carinha de princesa à
qual você ofereceu uma long neck estupidamente gelada; e que você foi se juntar
aos seus amigos para cantar no Bloco da Saudade ou no Cordão da Bola Preta.
Faz de conta que é Carnaval
e a alegria está a mil ao som de frevo, axé, samba, afoxé e maracatu; que o
Homem da Meia-Noite daqui a pouco vai sair; que você está no Baile dos Artistas
ou no Gala Gay bem fechante e achando tudo óooooooootimo; que você se fantasiou
de Bucetinha Inacreditavelmente Virgem e de Cuzinho Ainda Apertadinho só para sair com a turma do Bloco Mole
Não Entra e, depois, dar uma esticadinha - dá mesmo, visse?! - no Nóis Sofre Mas Nóis Goza; que a sua maquiagem borrou toda, a sua sunga rasgou, o seu tapa-sexo
caiu e você nem se importou com isso; que você comprou uma fantasia de
coronavírus só para ver se dão uma seringada em você não no seu braço e sim na sua
bunda; que lhe avisaram que amanhã é Quarta-feira de Cinzas e você continua
solto na buraqueira, dizendo que começou a brincar na Quarta-feira de Fogo e
que o seu Carnaval só termina quando acaba.
Faz de conta que é Carnaval;
que a sua alegria é tudo que há; que você não está nem aí para o que os outros
vão pensar, porque, afinal, o que realmente você quer é que os outros pensem
mesmo; que o tempo de ser feliz e de curtir o que se quer é agora e não depois;
que você esqueceu a letra da canção mas continua cantando; e que você não
perdeu o bonde coisíssima nenhuma, porque o desejo, o prazer, a satisfação e a
fantasia da vida valem muito apesar, apesar, apesar, apesar, apesar e apesar de
tudo, inclusive, de quem não gosta de você e nem do Carnaval.
Roda, roda, roda e avisa que sem vacina a pandemia vai continuar.
Alô, alô Zezinho e Terezinha, ai que saudade daquela chupadinha.
Perfeito texto. Apenas lembranças do nosso carnaval.
ResponderExcluirO texto é perfeito e reflete bem o egoísmo de uma minoria . O carnaval, a festa mais popular do país, parece mais urgente na vida desta pessoa, que a frase deste período é no tô nem aí pra te que perdeu a pessoa amada. Esse faz de conta de que é carnaval, se confunde com a soberba e o descaramento de não se importar com outros... nesta faz de conta vamos levando e empurrando este jaz de vida.
ResponderExcluirBelo texto...